Em 2001, foi encerrado
o caso da Fazenda Primavera pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, pois
após ter a liminar reintegratória negada, os proprietários da fazenda, Plínio e
Valéria Formighieri, impuseram o agravo de instrumento no 70003434388 contra a decisão judicial
anterior, alegando que a terra que fora ocupada pelos integrantes do MST era
sim produtiva. No entanto, por maioria, os desembargadores negaram o provimento
do agravo, pautando a decisão final principalmente na questão da função social
da propriedade e embasando em normas da Constituição e do Código Civil vigente
na época.
Ao analisar essa
situação com o texto “O primado do Direito e as exclusões abissais: reconstruir
velhos conceitos, desafiar o cânone”, da socióloga Sara Araújo, nota-se que a
decisão favorável ao MST fora um tanto quanto inesperada, jurídica e socialmente.
Sara questiona a perspectiva do Direito monolítico, que iguala todos à mesma
perspectiva de categoria e escala social, econômica, temporal, etc. Ela procura
pensar o Direito para além desse cânone único, para que ele consiga contemplar
as exigências da realidade de fato, estimulando um outro ethos e forma de conduta e condução do Direito, podendo esse ser uma
ferramenta emancipatória. A socióloga se utiliza do conceito de Epistemologias
do Sul, do professor Boaventura de Sousa Santos, ao criticar o Direito moderno,
pois este perpetua o eurocentrismo e o colonialismo. E, por conseguinte, as “exclusões
abissais” são essas diferenças e delimitações entre o Norte, considerado avançado
e civilizado (antigas metrópoles), e o Sul (“antigas” colônias), e tal exclusão
e desqualificação de conhecimentos advindos do hemisfério sul pode ser
percebido no próprio Direito moderno; um verdadeiro epistemicídio.
Outro termo que Sara utiliza e questiona é o da “razão metonímica”, sendo esta uma racionalização do conhecer e do normatizar de uma parte do hemisfério norte como se fosse algo universal. Isso desafia o Direito, pois torna tudo semelhante ao norte, e acaba produzindo inexistência de especificidades jurídicas ao colocar tudo dentro de uma mesma forma de interpretação. Dessa forma, a razão metonímica promove a invisibilização de sujeitos e realidades ao Direito. Os integrantes do Movimento Sem-Terra, por mais que no agravo de instrumento aqui analisado tenham sido contemplados positivamente, demonstram como ainda se é reproduzido o colonialismo e o conflito de terras no Brasil. É notório que esses movimentos sociais, como os sem-terra, procuram com suas ações serem “vistos” e acolhidos pelo Direito, o qual muitas vezes privilegiou os dominantes, os donos da terra, o “Norte” capitalista e neoliberal. Os magistrados, ao considerarem a função social da terra como parâmetro favorável ao MST já demonstra um olhar, ainda que tímido, para uma realidade que sempre fora excluída e oprimida, justamente por não se enquadrar no padrão global e “civilizado” de produtividade. Sara diria que essa situação simboliza uma superação da razão metonímica, a qual é alimentada por algumas monoculturas, como a do saber, a do universal e a da naturalização das diferenças.
Outro termo que Sara utiliza e questiona é o da “razão metonímica”, sendo esta uma racionalização do conhecer e do normatizar de uma parte do hemisfério norte como se fosse algo universal. Isso desafia o Direito, pois torna tudo semelhante ao norte, e acaba produzindo inexistência de especificidades jurídicas ao colocar tudo dentro de uma mesma forma de interpretação. Dessa forma, a razão metonímica promove a invisibilização de sujeitos e realidades ao Direito. Os integrantes do Movimento Sem-Terra, por mais que no agravo de instrumento aqui analisado tenham sido contemplados positivamente, demonstram como ainda se é reproduzido o colonialismo e o conflito de terras no Brasil. É notório que esses movimentos sociais, como os sem-terra, procuram com suas ações serem “vistos” e acolhidos pelo Direito, o qual muitas vezes privilegiou os dominantes, os donos da terra, o “Norte” capitalista e neoliberal. Os magistrados, ao considerarem a função social da terra como parâmetro favorável ao MST já demonstra um olhar, ainda que tímido, para uma realidade que sempre fora excluída e oprimida, justamente por não se enquadrar no padrão global e “civilizado” de produtividade. Sara diria que essa situação simboliza uma superação da razão metonímica, a qual é alimentada por algumas monoculturas, como a do saber, a do universal e a da naturalização das diferenças.
Por fim, como
afirma Sara, o reconhecimento do pluralismo jurídico não implica
necessariamente na superação do modelo colonial capitalista. Este pluralismo,
por sua vez, se faz um conceito crucial para a operacionalização e aplicação do
Direito, ao reconhecer os direitos dos oprimidos, silenciados e invisíveis e promover,
como a autora diz, uma legalidade cosmopolita subalterna. Essa “provincialização”
do Direito, na qual se prevalece os direitos fundamentais e o viés social ao invés
de apenas considerar o econômico, já se torna uma esperança de superação do
passado colonialista.
Raquel Colózio Zanardi –
1o ano direito matutino
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