O agravo interposto há quase duas décadas atrás, após a
ocupação por parte do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra à uma fazenda
considerada por eles como improdutiva, trata de uma reintegração da propriedade
aos seus respectivos possessores. O recurso, então, foi dado como indeferido
por voto majoritário entre os desembargadores presentes.
O conflito entre latifundiários e movimentos sociais, como o
MTST, é uma briga, tão antiga quanto contemporânea, que, no entanto, não é
levada em consideração no ordenamento jurídico. O texto constitucional de 1988,
leva princípios fundamentais em seu conteúdo, porém, não foi acompanhado pelos
outros Códigos.
Tal fato nos mostra que, o Direito moderno não foi pautado
no contexto brasileiro, e sim no contexto dos países desenvolvidos, localizados
no Norte do globo. O fenômeno, denominado epistemologias do norte, representa a
monocultura de tais nações nas áreas do saber, da produção, do universal, da
naturalização das diferenças e do tempo linear, impondo sua cultura e
produções, como algo dominante para as outras nações. Dessa maneira, quando
dizemos que o Direito moderno não representa a realidade a qual pertence,
queremos dizer que todos os problemas e desigualdades sociais específicos de um
povo, são negligenciados.
O ponto central do agravo em questão, é a produtividade
alegada pelos proprietários da fazenda, a qual não é igualmente constatada nas
declarações dadas como provas aos Desembargadores. O revisor, Mário José Gomes
Pereira, declarou ser injusta e ilegítima a reintegração de uma posse que não
cumpre sua função social, apesar de que a sua aquisição não tenha sido
violenta, clandestina ou precária, de acordo com princípios presentes da Constituição
Cidadã.
A função social discutida, não impede que o proprietário
goze, usufrua ou disponha de sua posse, apenas impede que não se atinja toda a
potencialidade de uma terra que, poderia ser usufruída de uma melhor forma,
inclusive pelo MTST. O conflito se apresenta ao fato de que, a função social é
requisito da propriedade apenas na Constituição Federal, não se apresentando no
Código Civil de 1916 (anterior ao atual texto constitucional), sendo esta, a
única divergência entres ambos ordenamentos.
Desse modo, identificamos uma Constituição que, apesar de
conter os objetivos fundamentais de uma nação desenvolvida, ainda pertence a
uma nação subdesenvolvida e não detêm dos instrumentos necessários para
garantir e preservar os princípios contidos em seu texto.
Eduarda Queiroz, matutino.
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