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segunda-feira, 30 de outubro de 2017

O desequilíbrio do Supremo

Há tempos que a população brasileira assume abertamente sua crise de representatividade nos poderes legislativo e executivo, bem como seu descaso com os trâmites da política interna do país. Tal fator acarreta contemporaneamente em uma desproporcionalidade entre o equilíbrio dos poderes e um consequente “inchaço” das funções delegadas ao judiciário e seus executores. O dado fenômeno é nominado por Luís Roberto Barroso como judicicialização, em seu texto: “Judicialização, Ativismo Social e Legitimidade Democrática”.
O evento polariza as opiniões das múltiplas instituições políticas presentes na nação e acaba por tornar-se um fator a mais para a bipartição nacional: por um dos lados, é possível ver a judicialização como um desdobramento natural das ciências políticas de um Estado de Direito que estruturou todas as suas esperanças democráticas na criação de uma Magna Carta pós-ditatorial, como ocorreu em 1988. Entretanto, para outros, o extremo poder delegado aos juristas, atualmente, pode ser tido como uma crise institucionalizada, acarretadora de uma justiça extremamente embrenhada na política que, por consequência, não permitira a limitação do judiciário, ferindo a cláusula pétrea da Constituição Federal referente à separação dos três poderes e sua respectiva legitimidade.
Uma das principais discussões catalisadoras dos debates sobre a judicialização pode ser vista diante da decisão do Supremo Tribunal Federal de aprovar a aplicação de pena após ação condenatória em segunda instância. Tal embate jurisprudencial foi realizado com base no artigo 283 do Código de Processo Penal e no inciso LVII do artigo 5º da Constituição Federal. Ambos afirmam, de formas distintas, que é indubitavelmente necessário proteger o princípio da presunção de inocência até que a pena seja realmente aplicada ao réu.
A votação dos ministros foi extremamente acirrada, sendo de 6 a 5 em prol da execução pós segunda instância. A decisão logo gerou reações do Partido Ecológico Nacional (PEN) e da OAB, com seus respectivos pedidos de medida cautelar contra a realização das penas. Tais instituições acreditam, assim como os cinco ministros que votaram contra a medida, que as sanções de aplicação imediata após o tramite em segunda instância ferem os preceitos defendidos pelos artigos já citados e são inconsequentes ao não levarem em conta as diversas lacunas presentes no sistema punitivo brasileiro, que sofreria com as aprovações do STF.
Entretanto, o Supremo decidiu por uma visão encarada como mais progressista depositada em seus seis ministros de parecer favorável. Desse modo, a aprovação em questão procurou flexibilizar o cumprimento das penas e combater a morosidade judiciária, acarretadora de uma possível impunidade em decorrência da prescrição de  crimes, como ocorrido com o ex-jogador Edmundo que, acusado de cometer homicídio ao atropelar um jovem, possuiu o crime prescrito após sua ação passar pela lentidão característica da terceira instância. Além disso, a jurisprudência do STF também pode ser vista como fruto de uma descrença popular crescente com os constantes “crimes do colarinho branco”, como lavagem de dinheiro e corrupção ativa, que muitas vezes acabavam por não receber punições ao serem encaminhados à terceira instância.
             Portanto, é possível concluir que a judicialização ganha espaço em uma sociedade de dinamismos não acompanhados pela classe política do país. Desse modo, acaba por caber às instituições legais entender a sociedade atual e suas respectivas demandas, gerando sim, uma separação de poderes disfuncional, que deve ser encarada de forma cautelosa e ponderada, para que se possa reaver um equilíbrio politico legitimo e concretamente funcional.

Lucas Correa Faim - Noturno

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