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domingo, 7 de novembro de 2021

Judiciário: o reflexo do avanço neoliberal

     Após o período da Guerra Fria, com o fim da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, o sistema capitalista de produção predomina como modo econômico mundial, afetando não só a economia dos diversos países, mas também suas respectivas formas de organização política. A saber que o neoliberalismo, por exemplo, enfatiza a mínima intervenção estatal em assuntos de ordem econômica, favorecendo, portanto, o livre mercado. Dessa forma, os instrumentos jurídicos também são meios, os quais expressam ideologias em defesa da preservação dos lucros empresariais em detrimento, até mesmo, de direitos fundamentais garantidos pela constituição como a vida.

    Seguindo essa lógica, a liminar contra o fechamento de lotéricas em Franca em razão da pandemia demonstra de maneira bastante evidente a preocupação do sistema judiciário em garantir o pleno funcionamento das relações comerciais, mesmo que isso contribua para a propagação do coronavírus. Diante disso, Antoine Garapon em sua obra, O juiz e a democracia: o guardião das promessas, argumenta sobre a nova função da justiça em realizar a tutela sobre os interesses individuais, isto é, os magistrados seriam os responsáveis por defender os interesses dos cidadãos, solucionando seus eventuais conflitos. Sendo assim, essa atuação do Direito representaria a possível garantia de privilégios a um grupo minoritário, uma vez que o juiz deve privilegiar somente uma das partes envolvidas no processo.

    Pensando nisso, Ingeborg Maus em seu texto, Judiciário como o superego da sociedade: o papel da atividade jurisprudencial na "sociedade órfã", critica a percepção do sistema judiciário como o único meio correto a ser seguido, ou seja, a construção idealizada de que esta instituição jurídica representasse o "guardião dos valores morais" de uma determinada comunidade. Logo, a crítica abrange a noção de que não apenas a moral do juiz deve ser considerada como a correta, visto que isso resultaria na atuação do Direito de maneira arbitrária. A decisão do magistrado, portanto, expressa um dos modos para se resolver um conflito judicial, contudo esta não constitui uma verdade universal e nem mesmo a conduta correta a ser seguida pelos demais seres humanos.

    Em suma, a liminar contra o fechamento de lotéricas em Franca apresenta uma visão conservadora sobre o caso, pois esta decisão despreza a preservação da vida em prol da prestação de serviços insignificantes quando comparados a este bem insubstituível da humanidade. Ademais, essa medida pode representar o interesse de um grupo minoritário, o qual poderá ser prejudicado devido ao fechamento de seus imóveis que proporcionam o seu enriquecimento, ratificando o pensamento de Antoine Garapon sobre essa questão.


Bruno Solon Viana - Direito Matutino

    

     

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