No
julgado do caso de apologia ao estupro durante um trote da UNIFRAN, de 04/02/2019, um veterano
do curso de medicina da universidade foi processado ao que um vídeo, no qual
este reproduzia um discurso repulsivo, com referências a estupro e degradando a
figura feminina de suas calouras, fazendo com que estas repetissem-no durante
uma festa, sob pretexto dele ser o hino universitário, viralizou. Tal comportamento
expresso pelo requerido formaria aquilo que Pierre Bourdieu nomeia “habitus”,
em que um grupo de indivíduos com semelhante trajetória social possuem certa
predisposição a tomada de determinadas ações. Desta forma, como na própria contestação
do requerido, é exposto que: “Há herança cultural de trotes em nossas
universidades” e, apesar desta não justificar de maneira alguma atos como o do,
até então, universitário, facilita a compreensão dos caminhos que levaram à sentença
que será discutida adiante.
O
sociólogo francês previamente abordado, Bourdieu, também fixa um importante conceito
para a análise do julgado em questão, o de “capital”, destacando-se o “capital simbólico”,
que vai muito além de um conceito meramente material e econômico, variando desde
relações à títulos. Um claro exemplo do que seria este não deixa de estar contido
na defesa do processo em questão, que afirma o seguinte: “O requerido é médico
recém-formado ganhando como tal, ajuda sua família e começará a pagar o FIES”.
Portanto, a posição social de prestígio que o título de um médico e a evocação
de uma figura que provem à família já consolidada no imaginário nacional, como
o famoso “homem de bem”, serviriam para dar credibilidade, exercendo um “poder simbólico”
pelo uso do “capital simbólico”.
A
juíza responsável pelo caso utiliza-se de discursos e alegações antifeministas ao
realizar sua sentença, ressaltando, dentre vários outros, o trecho: “É bom
ressaltar que o movimento feminista apenas colaborou para a degradação moral
que vivemos, bem exemplificada pelo ‘discurso/juramento’ que ora se combate.”, invalidando
a luta de várias mulheres, também acrescentando que o comportamento do aluno
não agrediu as mulheres como uma unidade, mas apenas aquelas as quais estavam
presentes no trote em questão e que elas consentiram em participar da suposta “brincadeira”.
Assim, para Bourdieu, a magistrada, na impossibilidade de uma “racionalidade
pura” deveria usar de sua interpretação no campo jurídico para intervir,
produzindo assim a consequência da luta simbólica: o “veredicto”.
Esse, muitas vezes advém mais da ética e moral do jurista do que propriamente
da constituição. Porém, nem sempre esse é legitimo, pois, para possuir “eficácia
simbólica”, pressupõe-se um “formalismo racional”, portanto, que não se baseie
apenas no “habitus” do magistrado, mas na “vontade da razão”. Exposto tudo isso, compreende-se
que, segundo Bourdieu, a sentença da juíza do caso em analise não é um “veredicto”,
uma vez que não está fixa na razão e nas normas, atingindo um valor universal
ao expor seu ponto de vista, restringindo-se a uma compreensão pessoal da situação, ignorando todo o contexto do campo jurídico.
Isabela Batista Pinto- Turma XXXVIII- Direito Matutino.
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