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domingo, 17 de outubro de 2021

HABITUS OU RAZÃO

No julgado do caso de apologia ao estupro durante um trote da UNIFRAN, de 04/02/2019, um veterano do curso de medicina da universidade foi processado ao que um vídeo, no qual este reproduzia um discurso repulsivo, com referências a estupro e degradando a figura feminina de suas calouras, fazendo com que estas repetissem-no durante uma festa, sob pretexto dele ser o hino universitário, viralizou. Tal comportamento expresso pelo requerido formaria aquilo que Pierre Bourdieu nomeia “habitus”, em que um grupo de indivíduos com semelhante trajetória social possuem certa predisposição a tomada de determinadas ações. Desta forma, como na própria contestação do requerido, é exposto que: “Há herança cultural de trotes em nossas universidades” e, apesar desta não justificar de maneira alguma atos como o do, até então, universitário, facilita a compreensão dos caminhos que levaram à sentença que será discutida adiante.

O sociólogo francês previamente abordado, Bourdieu, também fixa um importante conceito para a análise do julgado em questão, o de “capital”, destacando-se o “capital simbólico”, que vai muito além de um conceito meramente material e econômico, variando desde relações à títulos. Um claro exemplo do que seria este não deixa de estar contido na defesa do processo em questão, que afirma o seguinte: “O requerido é médico recém-formado ganhando como tal, ajuda sua família e começará a pagar o FIES”. Portanto, a posição social de prestígio que o título de um médico e a evocação de uma figura que provem à família já consolidada no imaginário nacional, como o famoso “homem de bem”, serviriam para dar credibilidade, exercendo um “poder simbólico” pelo uso do “capital simbólico”.

A juíza responsável pelo caso utiliza-se de discursos e alegações antifeministas ao realizar sua sentença, ressaltando, dentre vários outros, o trecho: “É bom ressaltar que o movimento feminista apenas colaborou para a degradação moral que vivemos, bem exemplificada pelo ‘discurso/juramento’ que ora se combate.”, invalidando a luta de várias mulheres, também acrescentando que o comportamento do aluno não agrediu as mulheres como uma unidade, mas apenas aquelas as quais estavam presentes no trote em questão e que elas consentiram em participar da suposta “brincadeira”. Assim, para Bourdieu, a magistrada, na impossibilidade de uma “racionalidade pura” deveria usar de sua interpretação no campo jurídico para intervir, produzindo assim a consequência da luta simbólica: o “veredicto”.

Esse, muitas vezes advém mais da ética e moral do jurista do que propriamente da constituição. Porém, nem sempre esse é legitimo, pois, para possuir “eficácia simbólica”, pressupõe-se um “formalismo racional”, portanto, que não se baseie apenas no “habitus” do magistrado, mas na “vontade da razão”. Exposto tudo isso, compreende-se que, segundo Bourdieu, a sentença da juíza do caso em analise não é um “veredicto”, uma vez que não está fixa na razão e nas normas, atingindo um valor universal ao expor seu ponto de vista, restringindo-se a uma compreensão pessoal da situação, ignorando todo o contexto do campo jurídico. 

Isabela Batista Pinto- Turma XXXVIII- Direito Matutino. 

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