A pauta da criminalização
da homofobia chegou no Supremo Tribunal Federal (STF) por meio de duas ações
judiciais: um Mandado de Injunção (MI 4733) requerido em 2012 pela Associação
Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transgêneros e Intersexos
(ABGLT) e uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO),
solicitada pelo Partido Popular Socialista (PPS) em 2013. Nas ações, solicitam
uma maior especificidade na Constituição Federal a respeito de práticas homo e
transfóbicas, mormente em seu artigo 5°, visto que aborda a punição à
“discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”. Por 8 votos
a 3, a homofobia e a transfobia foram consideradas crimes, incluídas, para
tanto, no crime de racismo previsto no artigo 20 da Lei 7.716/1989 e por 10
votos a 1 a mora do Congresso Nacional em legislar sobre tais crimes também foi
reconhecida.
Assim, a discussão sobre
a legitimidade e a eficácia dessa decisão do STF tornou-se uma grande pauta e
de grande relevância nos diversos âmbitos do conhecimento, tendo em vista que
foram postas em jogo a legitimidade do Judiciário em “criar” uma lei – nesse caso,
ampliar um artigo de lei – e, como citado nos votos da imensa maioria do
colegiado, a desatenção do Congresso Nacional e a irrelevância por ele dada aos
temas de criminalização da LGBTfobia de modo geral.
Nesse sentido, mostram-se
pertinentes os argumentos de ambos os lados: de certo modo, o Judiciário agindo
como legislador quebra a divisão dos três poderes e, portanto, põe em xeque a
segurança de uma democracia bem estruturada. Ao mesmo tempo, a ineficácia de um
Legislativo que não cumpre sua função suficientemente leva à uma necessidade de
atuação de um outro poder, a fim de que se cubram as lacunas e se traga um bem
comum primordialmente objetivado.
McCann, por exemplo, afirma
que os tribunais agem como catalisadores para a consolidação de direitos de grupos
minoritários cujos interesses são ocultados e desconsiderados pelo governo, isto
é, tornam-se um eficaz meio de tutela de direitos não resguardados pelas instituições
que carregam essa função. Os tribunais, então, trazem visibilidade a esses
assuntos e uma colossal probabilidade de chamar a atenção dos outros dois
poderes, visto que uma pauta discutida pela Corte Suprema de um país traz bem
mais impacto – no tocante à visibilidade – na ordem sociopolítica que uma pauta
discutida em pequenos grupos de movimentos sociais. Em uma de suas afirmações,
cita que “os tribunais são reativos, mas exercem poder, e suas escolhas são
muito importantes para o funcionamento de um regime político. E seu poder é
complexo, mais do que mera fiscalização. Em particular, nós devemos olhar para
a relação produtiva que se estabelece entre os tribunais e a maior cultura
cívica dos litigantes”.
Logo, é evidente que,
embora isso ocasionalmente possa transformar-se em um abuso de poder e em uma materialização
da imbricação de poderes – já conceituada e abordada por Montesquieu – a atuação
do Poder Judiciário para a consolidação de direitos de grupos minoritários cuja
notoriedade é inexistente ou ineficazmente presente nos outros dois poderes, essencialmente
no Legislativo, é essencial e traz consequências, de um modo geral, agradáveis,
seja no âmbito do direito, seja no âmbito social.
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