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segunda-feira, 21 de agosto de 2017

O Fim da Inocência


Lá estava ele, o jovem Harry Jordan, parado em meio àquela multidão que impiedosamente produzia sons indistinguíveis entre si.  No alto de seus 5 anos de idade só era capaz de reconhecer o pai e o irmão, ambos ao seu lado, com vestimentas peculiares e aparentemente específicas para a situação vivenciada naquele momento. A mente de Harry era um grande poço de dúvidas sobre aonde estava, qual era o propósito de sua presença entre tantos “adultos” e, principalmente, o pedaço de pano que lhe fora entregue.
Aquele pano branco com linhas e letras desenhadas por seu irmão não diziam nada a seu analfabetismo infantil. Em vão, Jordan pega o pano em mãos e tenta compreender o que as linhas querem dizer, algumas delas podem ser vistas em outros indivíduos da multidão e o menino, pela primeira vez, sente-se mais familiarizado com os outros dessa grande caminhada. Afinal, eles aparentemente estão unidos ao garoto.
Subitamente, em meio a esta longa marcha barulhenta, a multidão para. Todos concomitantemente levantam seus braços direitos para cima de suas cabeças. O menino, inteiramente desnorteado, olha para seu pai em busca de respostas. O Sr. Jordan, por sua vez, realiza o sinal como todos os outros e, ao perceber que Harry o fitava, ordena que o filho levante o braço em congruência com os demais, levantando o pano que seu irmão havia lhe dado. A criança obedece ao pai.
Passado um breve momento, o Sr. Jordan grita uma frase com toda a força de seus pulmões repetitivamente, o irmão de Harry acompanha o pai e, em alguns segundos, toda a massa humana ao redor do garoto bradava a frase em uníssono. O menino percebe que o semblante geral é de raiva e indignação. Todos voltam a marchar e o ódio passa a aflorar gradativamente mais em seus familiares. A partir desse ponto, Harry entende instintivamente que estavam reunidos contra um mal maior, algo que precisava ser combatido veemente por todas as forças ali presentes. O garoto sente o ódio a sua volta, sente  o som da frase raivosa em uníssono passar em sua pele, sente a raiva aflorando em sua alma. O menino precisa mostrar todo o poder de seu ódio, assim como seu irmão e pai, para tanto, junta-se aos dois bradando:  "Vocês não vão tomar o nosso lugar".
Harry finalmente odiava esses “vocês”, nada mais, naquele momento, poderia detê-lo em odiá-los e em marchar contra eles. O menino agora era parte de seu meio.
Na calçada da rua em que marchavam, uma placa indicava: “Bem-vindo a Charlottesville”.



Lucas Correa Faim - Direito Noturno

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