“Não consigo me convencer de que um Deus onipotente e
benévolo tenha deliberadamente criado os Ichneumonidae com a intenção expressa
de que estes se alimentassem dos corpos vivos das lagartas”.
Charles Darwin, carta a Asa Gray (1860)¹
Ao fazer uma crítica aos sociólogos de sua época, Durkheim questionou a
compreensão de que a função de determinado fenômeno social seria o suficiente
para compreendê-lo. O autor sustentou que há a necessidade de compreender como o
fato se originou, considerando que a simples necessidade de tal fato não seria
o suficiente para criá-los. Ao elucidar a dualidade entre a funcionalidade dos
fatos sociais e a sua causa eficiente, o autor nos lembra de fatos sociais que existem
apesar de não apresentarem função social ou desta função ter sido alterada no
decorrer do tempo, como, por exemplo, “os dogmas religiosos do cristianismo”,
que não se modificam há séculos e, contudo, não possuem mais o mesmo papel que possuíam
na Idade Média. Ou seja, as causas das funções sociais são independentes dos
fins a que servem.
Neste ponto, o autor faz uma comparação entre os fenômenos sociais e biológicos, uma vez que um
mesmo órgão pode apresentar diferentes funções nos mais diversos grupos de
animais. Como exemplo podemos citar os membros superiores de vertebrados
apresentando funções diferentes em aves (asas), baleias (nadadeiras) e humanos
(braços). Tal semelhança pode nos levar a relacionar o desenvolvimento de fatos
sociais com a evolução biológica. De fato, é bem comum escutarmos que a “sociedade
evoluiu” no contexto de expansão de direitos a determinados grupos que outrora
eram destes desprovidos.
Aqui torna-se necessário adentrar na discussão da intencionalidade.
Afinal de contas, é fácil para nós imaginarmos que os fatos sociais apresentam
alguma intenção, uma vez que são fatos humanamente criados. O mesmo não podemos
dizer dos fenômenos biológicos. Caso houvesse alguma intenção por parte da
natureza, diríamos que ela é cruel ao nos lembrarmos das lagartas que são
devoradas vivas por larvas de Ichneumonidade. Mas, como nos lembra Richard Dawkins: “A natureza
não é bondosa nem cruel - é indiferente”¹.
Se considerarmos que a intenção corresponde à “função” dos fatos sociais,
podemos concluir que a preocupação com a causa eficiente destes fatos não deve
tomar lugar da discussão sobre a sua função, pois ambas as discussões se
complementam. Ademais, é necessária a distinção entre a intencionalidade por
parte das ações humanas e a falta de intencionalidade por parte da natureza,
uma vez que esta confusão por nos levar a neutralizar as intenções humanas. Conforme
Dawkins¹, a nossa espécie tem a capacidade, que somente ela possui, de discernir
e planejar o contrário da destruição.
Bibliografia citada:
DAWKINS, R. O capelão do Diabo. In: DAWKINS, R. O Capelão do Diabo: ensaios escolhidos. Organização Latha Menon. Tradução
Rejane Rubino. São Paulo: Companhia das Letras. 2005.
Aluno: Luiz Henrique de Moraes Mineli (Noturno)
Aluno: Luiz Henrique de Moraes Mineli (Noturno)
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