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segunda-feira, 18 de junho de 2012


A criança como força de trabalho:

de operários a adolescentes




A criança do mundo industrial, vista sob viés marxista, nada mais é do que uma ferramenta acessória à produção capitalista de larga escala, para o trabalho mecânico do operário descartável. A força de trabalho infantil expande-se, consideravelmente, com a desvalorização do trabalho manual da massa trabalhadora durante a Revolução Industrial. Ao sistematizar a produção e desvincular o trabalhador do conhecimento global de todo o processo de produção, o homem industrial torna o homem comum em algo facilmente substituível; seu salário é reduzido, assim como a renda da família. Logo, novas peças passam a fazer parte do processo produtivo: a criança seria uma delas. A força infantil, então, transforma-se em um dos alicerces do sistema produtivo fordista. No entanto, no decorrer do século XX, tal quadro altera-se pelo próprio interesse da alta burguesia. Assim, de força bruta produtiva, as crianças passam a força bruta consumidora. Para consumir e existir como grupo consciente de si mesmo, o mundo infantil precisaria de conflitos, sonhos, vivências inerentes à inocência juvenil, porém, com certo discernimento adulto. A infância, portanto, é estendida; a maturidade deixa de emergir, automaticamente, com a maioridade; é criada a adolescência

A adolescência, período gerado no seio da sociedade americana do pós-guerra, surge como fenômeno necessário à expansão exigida pela força do capitalismo americano e do modelo exportador do American way of life. Envoltos em tempos de consumismo excessivo, de produção abundante, as multinacionais americanas necessitavam de novos consumidores. Os adultos, criados sob o ardor austero da Grande Depressão e da Segunda Guerra Mundial, pouco almejavam materialmente a não ser uma máquina de lavar, um Ford e uma casa com grama verde. Logo, a juventude americana é investida como nova força consumidora. Sem renda, moradia e gastos estritamente individuais, os jovens deveriam almejar aquilo que a geração anterior nunca teve: excessos, rebeldia, extravagância; tudo à base de marcas, essencialmente, americanas.

Se a força do trabalho industrial infantil deixa de existir em terras americanas com a transferência da produção industrial para países subdesenvolvidos graças à transformação de uma economia industrial para uma de serviços, sua nova força de trabalho, a força consumidora, explode em vigor capitalista. Esse novo grupo, permanece na escola até os 18 anos. Instruí-se, educa-se, reconhece-se com identidade singular. Com a ampliação do acesso à educação veio a busca por cultura: por música, por literatura, pelas artes, por carros e Harley-Davidsons.Tais aspirações, contudo, foram cuidadosamente acopladas ao surgimento de marcas globais, das grandes corporações americanas do século XX.Nos anos 50, auge da descoberta da chamada adolescência, todo jovem deveria comer no MacDonald´s; usar jaqueta de couro americano; ter um Ford conversível ; fumar como Paul Newman;dançar como Elvis Presley;assistir filmes hollywoodianos nos drive-ins; para ser aceito socialmente.

Nesse sentido, surgem marcos da cultura americana que associam ao poderio capitalista de sua sociedade de origem. O modelo americano é exportado, a adolescência espalha-se por todos os continentes.O livro The Catcher in the Rye aparece como sucesso mundial de vendas ao dissecar o então, novo mundo adolescente. James Dean, ícone do cinema da época, desperta como sex symbol ao sintetizar gosto por moda, carros e exageros. Percebe-se, assim, que os grandes ícone da cultura americana do pós-guerra,sobretudo jovem, brotam como obra acabada, obra premeditada das forças produtivas dos EUA.

Portanto, em menos de 100 anos a força de trabalho infantil altera-se profundalmente. Deixa de ser industrial, mecânica e explícita para uma apresentar um caráter consumidor, dinâmico, implícito. Se antes era base da renda familiar, com o tempo assume o controle do consumo familiar. Se deixou as fábricas para os pátios das escolas secundárias, a força infantil invadiu lojas de departamento, automotivas, lanchonetes, cinemas e bares com imensidão napoleônica. A criança, portanto, deixa de ser força industrial, deixa de ser precocemente emancipada, passa a ser força consumidora, passa a ser adolescente.

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