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segunda-feira, 14 de abril de 2025

 A crise de coesão francesa

    Em janeiro de 2024, milhares de pessoas protestaram na França contra a aprovação de uma nova lei de imigração que impunha restrições ao acesso de estrangeiros a benefícios e à regularização. Esses protestos, protagonizados por grupos ligados à causa dos imigrantes, mostram mais do que uma insatisfação política: revelam uma crise da sociedade francesa. A partir de Durkheim, é possível interpretar esse fenômeno como uma tensão que pretende evitar a anomia social e um enfraquecimento dos mecanismos de coesão que sustentam a ordem social.

    Durkheim compreendia a sociedade como um organismo complexo no qual cada parte exerce uma função específica em prol da estabilidade coletiva. Nesse sentido, o conjunto de normas e valores compartilhados tem papel central. Todo fato social deve ser explicado a partir de sua função social, sendo a função da norma manter a coesão do grupo.

    Contudo, essa coesão depende da existência de uma consciência coletiva, isto é, um conjunto de crenças e sentimentos comuns aos membros da sociedade que exerce sobre eles uma força moral. Quando essa consciência coletiva se torna fragmentada, ocorre a anomia, uma situação em que os indivíduos não encontram nas instituições sociais (família, escola, religião, Estado) uma orientação clara de conduta, proporcionando uma desregulação social.

    Os conflitos culturais entre franceses nativos e imigrantes, especialmente nas periferias urbanas, expõem justamente essa tensão. Jovens descendentes de imigrantes, muitas vezes nascidos na França, não se sentem plenamente integrados à sociedade nacional e suas instituições os valores da sociedade francesa contemporânea não são automaticamente introjetados naqueles que se estabelecem no território francês , tampouco mantêm os vínculos tradicionais com as culturas de origem. Essa dupla ruptura fragiliza os laços sociais e dificulta a internalização das normas dominantes, contribuindo para a mútua incompreensão e acirramento dos conflitos internos da sociedade.

    A resposta do Estado por meio de uma legislação mais restritiva pode ser compreendida como uma tentativa de reafirmar o centro normativo da sociedade, reforçando os limites e expectativas coletivas e afastando o elemento de estranheza do interior do grupo. Trata-se de uma tentativa de reconstituir a solidariedade por meio da delimitação mais nítida do pertencimento social, de delimitar o que é um francês.

    Assim, os protestos na França não revelam apenas um conflito de interesses, mas um dilema mais amplo sobre os fundamentos da coesão social desta sociedade. Durkheim, ao reconhecer a importância da consciência coletiva comum como alicerce da vida em sociedade, oferece uma chave interpretativa para os desafios da integração cultural e da manutenção da solidariedade em sociedades cada vez mais diversificadas.

 Artur Azevedo Rodrigues 1º ano  Direito  noturno

 

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