Pedro Duarte Silva Sinicio Abib - Direito Noturno
Durkheim disserta em sua obra sobre o objeto de estudo da sociologia, o Fato Social. Este, que independe do indivíduo e tem em seu cerne a maneira de agir do ser humano no mundo a partir de determinadas regras sociais. Importante destacar a análise durkheimiana enquanto empírica, fugindo do ele considera como análise ideológica, tratando seus objetos “das coisas para as ideias”, adquirindo certo distanciamento em seu estudo, visto que não quer realizar uma análise pautada em dogmas pessoais e parciais.
A partir dos paradigmas descritos, Durkheim desenvolve sua abordagem social conhecida como Funcionalismo. Durkheim trata a maneira como o indivíduo reage a funções pré-estabelecidas impostas pela sociedade. Para o autor, existe uma ordem social pré-estabelecida que atua sobre todos os indivíduos por meio de regras, garantindo equilíbrio no tecido social e impedindo o estado de anomia. Essa ordem seria legitimada no Direito, e atuaria no sentido de dar coesão social ao tecido, por meio de reações punitivas contra a resistência desses princípios, e impedindo a deterioração do coletivo, se transformando conforme o tempo para incluir as diferentes personalidades de um todo dentro de uma determinada sociedade. Assim, comportamentos seriam moldados em prol da criação de um padrão social a partir de sanções a diferenças e da Solidariedade Social e Consciência Coletiva, que atua na criação de hábitos, crenças e sentimentos comuns, responsáveis por gerar a força de união do agrupamento social, em que cada um tem seu papel e seus sacrifícios em prol do coletivo.
Em governos ditatoriais, sejam os mais antigos como a Itália de Mussolini e a Alemanha Nazista, ou nos pensamentos autoritários que começam a florescer, é possível observar algumas subverções dos conceitos Durkheimianos, e é sobre isso que vamos nos debruçar. As correntes autoritárias têm sempre um inimigo declarado: em 1939 eram os judeus, nos EUA de Trump, é a agenda “woke” e a população LGBT+, e na Europa os imigrantes e refugiados. Acontece, que diferentemente do que diz Durkheim, que entende uma adaptação contínua da coesão social para incluir diferentes padrões dentro de um todo a partir de sacrifícios da individualidade, o que observamos é uma sanção sistemática ao diferente, na tentativa de criar uma dicotomia “Nós x Eles”, restringindo a coesão social a um grupo seleto, o “cidadão real” e apontando os de fora do círculo (Imigrantes, LGBTs) como anomalias, e portanto dispensáveis na jornada da construção de um coletivo. Essa construção social excludente fica evidente por exemplo, na educação e propaganda nazista, comum a regimes desse tipo, que forjava desde a infância novos seres sociais, pregando em suas mentes novas regras que seriam interiorizadas e naturalizadas, garantindo assim a propagação e fortalecimento de suas ideias, neste caso o amor a Hitler e o ódio aos judeus.
É essencial também, entender a maneira como esses grupos tratam a criminalidade e instrumentalizam as ações punitivas, de maneira completamente contrária à ressocialização e reinserção durkheimiana, a exemplo da própria extrema direita brasileira. Em nosso país, esta direita autoritária, personificada na figura do ex-presidente Jair Bolsonaro, defende um Direito altamente punitivo, de pena de morte e prisão perpétua, punições que atuariam com efeito de imposição da coerção social excludente que tratamos. Explicando com mais detalhes, é de interesse dessas correntes penas mais punitivas, pois tem como alvo, não quem as sofre, mas seus espectadores, visto que além de tirar a necessidade deste governo de ressocializar aqueles que não se adequam à nova ordem por eles proposta, também atua sobre as mentes livres que assistem a punição, mostrando a eles a nova moral exigida e imposta por esse grupo dominante, e que qualquer subversão a ela não será tolerada.
Deste modo, governos autoritários exigem semelhança, e usam e ampliam a visão de crime para moldar sua própria sociedade de valores. Ao comandar a moral, o que é legal e o que é passível de punição, os governos moldam a consciência coletiva ao seu favor e a partir de uma coerção seletiva, decidem quem está dentro do círculo de coesão social e quem deve ser atacado, por estar em estado de anomia.
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