Direito
e Raça, sob a perspectiva de Achille Mbembe
O
professor Dr. Jonas Rafael dos Santos, por meio do seminário “Lapidando Ideias”
do Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Análise de Políticas Públicas,
discute e enriquece o debate a respeito das questões que envolvem o racismo na
sociedade moderna. A partir disso, o professor ressalta que, apesar do contexto
de reconhecimento da sociedade que o racismo é algo que perpassa todas as
relações sociais, poucas pessoas são capazes de compreender e identificar as
suas dinâmicas. Nessa perspectiva, nas palavras de Milton Santos:
A mobilização da sociedade em relação ao
racismo é realizada a partir de uma perspectiva emocional que se torna
passageira. [...] é necessário um processo de conscientização da população em
relação ao racismo, uma vez que o assunto diz respeito a todos.
Em
visto disso, o professor Dr. Jonas Rafael lança mão da análise de Achille Mbembe,
que por sua vez se dedicou ao estudo da questão do racismo numa perspectiva
global. Desse modo, o autor nos possibilita compreender as questões que envolvem
a raça, bem como realizar o seguinte questionamento: para o direito, a questão
da raça importa?
Em
primeira análise, Achille enfatiza que o racismo corresponde a uma construção histórica
com base nas relações de poder, que por sua vez teve como objetivo a subjugação
de grupos racializados em vista da necessidade de legitimar a suposta
superioridade de alguns em relação a outros. Tal formulação é ancorada pela contribuição
de diversos intelectuais e pensadores europeus, africanos e americanos. Nesse
sentido, pode-se destacar Michel Foucault, uma vez que Mbembe se apropria dos
conceitos de Biopolítica e Biopoder para entender que o racismo corresponde a
uma tecnologia de dominação fundamental para organizar a sociedade capitalista.
Em
vista disso, na esfera jurídica, pode-se afirmar que o racismo se faz presente,
uma vez que, segundo o G1, 83% dos presos injustamente por reconhecimento
fotográfico no Brasil são negros. Nesse sentido, depreende-se os negros são a
maioria das vítimas desse tipo de erro. Além disso, de acordo com Anuário
Brasileiro de Segurança Pública de 2021, os negros correspondem a 66,3% da
população carcerária do país. Dessa forma depreende-se que, apesar do art.5° da
CF/88 dispor a respeito da igualdade entre os indivíduos independentemente de
raça ou cor, no Brasil, não produz efeitos de forma eficiente, assim,
contribuindo para a manutenção de um sistema jurídico que favorece a classe
dominante em detrimento dos que estão em condição de subjugados.
Em
segunda análise, Mbembe divide o período da modernidade em três momentos: a
acumulação primitiva de capital (entre os século XV e XIX) que orquestrou uma
rede de tráfico transatlântica responsável pela transformação de homens e
mulheres em mercadorias; já o segundo momento (compreendido entre os séculos
XIX e XX) configurou um cenário de protagonismo das comunidades subjugadas,
nesse sentido destaca-se a Revolução do Haiti, a abolição do tráfico de escravos,
bem como a descolonização africana; por último, o início do século XXI com a
globalização dos mercados, o desenvolvimento da ideia do dever-negro.
A
exemplo disso, pode-se destacar a importância do movimento Vidas Negras
Importam, que por sua vez lutam pelo fim da violência praticada contra os
negros em escala mundial. Tal movimento ganhou destaque após o assassinato de
George Floyd, vítima de racismo policial nos Estados Unidos. Segundo Mbembe, define-se
o racista como sendo o indivíduo que se afirma pelo ódio, construindo o outro
não como o seu semelhante, mas como um objeto ameaçador do qual seria necessário
se proteger ou destruí-lo em virtude de não conseguir dominá-lo inteiramente.
Nessa
perspectiva, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a letalidade
policial é recorde no país, sendo que 78% dos mortos são negros. Dessa forma,
depreende-se que no Brasil, o órgão de segurança pública pode ser compreendido
como instrumento que reverbera o racismo.
Além
disso, Mbembe ressalta que a nova era racial (proposta pelo neoliberalismo) não
é estritamente biológica, mas multidimensional. Também, a palavra “negro” não
se refere mais exclusivamente a pessoas de origem africana, mas a todos que
estão numa condição de precarização devido a nova fase do capitalismo. Nessa perspectiva,
pode-se tomar como exemplo a marginalização do indivíduo perante a desigualdade
social e econômica.
Em
resumo, no Brasil, o processo de urbanização acelerado, a ineficiência de
políticas públicas que visassem a igualdade de oportunidades, além do processo de
gentrificação associada à especulação imobiliária, contribuíram para a
precarização do indivíduo, sobretudo do negro, que por sua vez é vítima constante
de agressões policiais, discriminações, bem como dispõe de menos oportunidades
de trabalho e educação de nível superior.
Dessa
forma, depreende-se que para o direito, a questão da raça importa, uma vez que
a justiça é usada como instrumento para subjugar o negro e refletir o racismo,
apesar de haver pequenos avanços quanto à conquista de direitos, tais como a
decisão do STF de tornar a injúria racial um crime imprescritível, deve-se salientar
que muito precisa ser feito, sobretudo referente às questões sociais que
envolvem a marginalização do negro.
(Italo
de Abreu Correia – 1°ano – Direito Noturno)
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