Outro dia, ouvi dizer que brasileiro está em todo lugar. Nunca saí do país (mal saí do meu estado) mas me disseram que quando estamos no exterior, seja na Europa ou na Ásia, e um outro brasileiro passa por nós na rua, um simples olhar é tudo o que precisamos para nos reconhecermos como irmãos de pátria. Isso porque todos nós carregamos dentro de nossos corpos o tão famoso "jeitinho brasileiro" e não importa a quantos quilômetros estamos do Brasil, o jeitinho nunca vai embora — pelo menos foi o que me disseram.
Vou tomar aqui a liberdade de dizer algo que muitos de nós sabemos: morar no Brasil é uma desgraça que só está ficando mais desgraçada a cada dia. É triste olhar para a segurança, olhar para o folheto do supermercado, olhar para dentro de uma escola pública ou para dentro dos escritórios de nossos políticos. Por isso, imagino eu, que muita gente aqui criou um outro Brasil para olhar: morar no Brasil é uma desgraça, mas ser brasileiro é uma benção.
Ser brasileiro, na visão de muitos, é tão único que a gente se reconhece entre os outros com facilidade (como já citei). Não há nenhum outro país no mundo com nossos churrascos, com nosso senso de humor, com nossos bares de esquina onde a cerveja gelada preenche os copos americanos, com nossos cachorros caramelos, com nosso amor por futebol ou com um bom caldo de cana pra comer com pastel na feira. A gente gosta de imaginar que não há "terra mais garrida" do que a nossa, porque isso acaba por unir a pluralidade do povo brasileiro em uma coisa só — até porque se a gente se vê como um povo totalmente diferente dos outros povos, a gente deixa de focar nas diferenças entre o nosso próprio povo.
É muito lindo dizer que o Brasil é o país do samba e do futebol, tão lindo que é assim que somos conhecidos mundialmente, mas o Brasil também é o país do MPB, do funk, do sertanejo, do forró, do axé e do pagode. É muito conveniente dizer que o brasileiro é muito simpático e trabalhador quando na verdade essa simpatia não existe quando o assunto é para beneficiar o trabalhador. A cultura brasileira é linda, realmente, mas também carrega consigo preconceitos com elementos de si mesma — como aspectos da cultura indígena e africana. Não há como dizer que "o brasileiro é único" sem antes afirmar que não existe só um tipo de brasileiro. O Brasil é feito por um povo que se divide em outros povos, outros costumes, outras realidades.
Além desse aspecto, também vale analisar quando o "jeitinho brasileiro" se torna pejorativo — e aqui surge um paradoxo. Ao mesmo tempo que não há diversão como a diversão brasileira, para muitos não há nenhum país no mundo com um tráfico como o nosso, com tanta corrupção e mentiras na política, com tanta "gambiarra" nas instituições ou com tanto vagabundo no poder. Sinceramente, gostaria de entender melhor que síndrome é essa de achar que a política de todos os países no mundo (especialmente a dos Estados Unidos) é tão mais correta e melhor do que a nossa. Claro, existe muita desonestidade na política brasileira, mas não só aqui. Dizer que isso ocorre porque é uma característica do brasileiro é fechar os olhos para todo o cenário internacional.
É quase incompreensível e até cômico o jeito que o brasileiro se enxerga. Nos vemos com tanta singularidade e a usamos de maneiras opostas, às vezes para justificar a beleza de ser brasileiro e às vezes para justificar a feiura que está tomando conta do Brasil. O jeitinho brasileiro é superior em um dia, mas nos outros é inferior ao jeitinho gringo e se torna motivo de vergonha — até porque quem vai querer carregar the brazilian way mundo afora quando quase todo o mundo nos olha do mesmo jeito que nos enxergamos, como meros vira latas?
Camilly Vitória da Silva, 1° semestre — Direito noturno, Turma XXXVIII
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