Max Weber fora contemporâneo à República de Weimar, um período difícil da
história da Alemanha, que compreende o período entre o fim do poder do Kaiser na
Primeira Guerra Mundial em 1918 e a ascensão do nazismo em 1934. O pensador chega
inclusive a ser um parlamentar presente na comissão redatora da Constituição da República
de Weimar. A Alemanha fora muito punida pelos países vencedores da Grande Guerra, o
que fez com ela mergulhasse num verdadeiro caos generalizado, e foi neste contexto que
Weber faz suas análises sociológicas.
Weber sequer apresenta uma definição de sociedade, se limitando a refletir sobre
suas particularidades, entendendo que é inexistente uma oposição entre a sociedade e o
indivíduo. Ele via a sociedade como emergida a partir da subjetividade das ações sociais.
Uma ação é social quando se leva em consideração outras pessoas na sociedade, ou seja,
não é necessário que toda ação em sociedade seja social, mas às vezes simples fenômenos
naturais. Uma ação social, por exemplo, é quando um aluno que não joga lixo no chão da
sala de aula, levando em consideração o fato de que outra pessoa posteriormente teria que
limpá-lo.
E é nesse escopo que gostaria perscrutar a relação da caridade e das crises, como a
de Weimar. Ora, sabemos que as ações sociais procedem das motivações, tendo, portanto,
sempre elas um sentido e significado específico. E, como explicava Max Weber em
Economia e Sociedade, cabe à sociologia interpretar e compreender esses sentidos da ação
social, para assim, explicar causalmente seus efeitos sociais. Sabemos que os indivíduos
agem socialmente motivados pela tradição, por um interesse racional ou por algum motivo
emocional, onde os nexos da ação social podem ser de ordem política, econômica ou
religiosa.
Sobre nexos de ordem religiosa, vale ressaltar a Igreja Católica, que sempre
administrou obras de assistência e caridade às pessoas em situação de pobreza ou qualquer
tipo de necessidade. Lembremos dos mosteiros e dos conventos, que funcionaram como os
primeiros hospitais, leprosários e orfanatos, algo que é pertinente até os dias de hoje. Não
somente, a Igreja lança um documento, a Encíclica Rerum Novarum, que embasa suas
práticas caritativas e reforça valores morais como referência para o enfrentamento da pobreza.
Mas não somente nesse sentido, a caridade não se resume unicamente ao ato de ceder um
umas moedas em benefício de alguém que delas precisa. Creio ser algo bem mais profundo
que isso. Quando você cede um lugar no ônibus lotado para uma senhora, você está fazendo
caridade para com ela, mesmo não tendo você cedido nenhum bem concreto propriamente
dito. Assim, creio que a caridade é toda a ação social motivada pelo amor ao próximo, que
faz-te sacrificar algo que te é bom, em bom detrimento de terceiros. E é inegável a
importância da religião para o aperfeiçoamento das virtudes humanas, aperfeiçoamento este
que é voluntário e espontâneo (isso é importante).
Assim sendo, como podemos interpretar a ação social da caridade senão pelo nexo
voluntário da religião e consequente motivação tradicional e emocional? Não que eu esteja
dizendo que o arreligioso é necessariamente sujo, mas é uma realidade que à medida que as
crises surgem e a sociedade se mergulha num estado de anomia social, o capital humano se
degrada e as pessoas passam a se perverter virtuosamente – ainda mais sem total ou parcial
epíteto da religião na equação – voltando sua preocupação não para com o próximo, mas
para si mesmo em meio ao caos social – o que destruiria as redes de subsidiariedade que
compõem o caleidoscópio das comunidades, gerando desarmonia social. Seria difícil de
compreendermos os tipos de ações sociais desse tipo de sociedade. Ou seja, todas as boas
ações sociais calcadas no carĭtas para com o próximo passam a ficar menos frequentes, o
que agravariam as instabilidades socias, porque tornaria as pessoas mais arrogantes,
ignorantes, gananciosas, de poucas virtudes, e é em meio este contexto, que o governo
entra.
Concluindo, meu ponto é que senão pela religião, nosso aperfeiçoamento moral não
se daria de maneira espontânea e voluntária, como devem ser ações morais, mas sim via
violência governamental. Ora, é inevitável que valores que promovam interdependência
harmônica entre indivíduos promovam independência para com o Estado, e uma vez eles
lesados, acabaremos dependendo cada vez mais do governo, o que é terrível para nossa
liberdade! Creio que nossa sina enquanto humanidade é ter nossa cabeça pisada contra o
chão pela bota estatal.
*Fernando Carvalho da Silva. Direito – Noturno.
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