UNIVERSIDADE
ESTADUAL PAULISTA – UNESP
FACULDADE DE CIENCIAS
HUMANAS E SOCIAIS - FCHS
CURSO DE
DIREITO – CAMPUS DE FRANCA - SP
Disciplina: INTROCUÇÃO
À SOCIOLOGIA
Aluno: Rubens Chioratto
Junior – R.A. 211.222.526 1º período Noturno
OS
MATERIALISTAS CIENTÍFICOS - KARL MARX E FRIEDRICH ENGELS
·
A práxis marxista e Patch Adams
(médico retratado no filme de mesmo nome);
·
Uma interpretação materialista de uma
realidade etérea.
A práxis
e Patch Adams:
Começando não pelo
começo, mas fazendo um novo começo, inauguro o trabalho falando do aspecto que
mais me chama atenção da teoria marxista ao lado do conceito de
alienação: A práxis. Trata-se de uma intersecção
entre a teoria e a prática, onde uma aperfeiçoa a outra. Através da
práxis é possível realizar a mudança de uma dada realidade. No filme
Patch Adams que retrata a história real de um homem de meia idade
que resolve ir à universidade estudar medicina. Lá decide que a forma
de ensinar medicina não e adequada e com a ajuda de outros
colegas confronta o ensino da faculdade criando um serviço de
atendimento baseado na “empatia” com o paciente, junto a isso
aprimora seus conhecimentos exercendo na
prática, a teoria que aprende de forma síncrona.
Quando se lê sobre a práxis marxista, parece
adequada a lembrança do filme e o trabalho do estudante de
medicina Patch Adams! Se pensarmos é muito mais eficiente aprender a
teoria com a prática concomitantes, por exemplo, imaginem aprender
jogar voleibol ou futebol, primeiro na teoria e, depois, quando você
souber a teoria vai ter contato direto com o jogo,
o Campo/quadra e os parceiros de time? As pessoas iriam vão
dizer, que ridículo, não faz nenhum sentido! Pois é, não faz mesmo, nenhum
sentido. Ou pelo menos não é a melhor forma de aprender a jogar voleibol
ou futebol, sendo que jogando é que aprendemos mesmo a
jogar. No conceito de práxis, a teoria se fundamenta na prática.
Introdução
Karl Marx
Karl Marx nasceu na Alemanha (Prússia), em maio
de 1818 na cidade de Tréviris, 19 anos após a revolução
francesa. Descendente de uma família judia, estudou direito na
Universidade de Bonn e, posteriormente, na Universidade de Berlin.
Marx sendo um dos fundadores do socialismo científico, juntamente com
Friedrich Engels, juntos fundaram o jornal “Gazeta Renana”. Por
criticar excessivamente a sociedade alemã, foi expulso e se
exilou em Londres, onde faleceu, deprimido em função do falecimento de sua
esposa, em março de 1883, de bronquite e pleurisia.
O sociólogo iniciou sua carreira, já
num contexto de desfecho da Revolução Francesa e início da Revolução
Industrial, sem descartar a importância da revolução francesa, o
seu objeto de estudo foi a revolução industrial e o
capitalismo. Marx se propôs a fazer um estudo sobre as desigualdades da
Europa pós Revolução Industrial. Lá não havia legislação trabalhista, o que
possibilitava a exploração demasiada do homem pelo capital.
Quem quer ser capitalista, deveria estudar
Marx, pois ele deve ser a pessoa que mais estudou o capitalismo
no planeta, e mostra isso no 1º e 2º capítulo do livro “O Capital”. É
comum que nem os que se autoproclamam marxistas leram Marx,
normalmente leram algo ou algum autor que fala sobre a obra/teoria dele.
Principais Obras:
- Manifesto do Partido Comunista;
- O Capital;
- 18 de Brumário.
Friedrich Engels
Engels nasceu na cidade alemã de Barmen em 28
de novembro de 1820, vivendo na Alemanha até os 22 anos, filho de
industrial muda para a Inglaterra e começa a trabalhar na fábrica de tecidos de
seu pai.
Esse período
da vida, foi essencial para Engels desenvolver sua teoria sobre a classes
trabalhadoras, ao observar a miséria e as condições dos operários que viviam
dentro do regime capitalista. Em 1845, escreveu “A Situação da Classe
Trabalhadora na Inglaterra”.
Por
um tempo fez parte do grupo de esquerda dos “Jovens Hegelianos”, os quais
estudavam a filosofia de Hegel.
Em
1844, ele conhece Karl
Marx em Paris, França e, com ele começa a desenvolver diversas
teorias e escrever obras.
A
mais destacada foi o “Manifesto Comunista” escrita em colaboração de
Marx e publicada em 1848. Nessa obra, eles reúnem os princípios do comunismo
e, após a morte de Marx em 1883, Engels terminou e publicou o restante dos
volumes da obra, “O Capital”.
Engels
faleceu em Londres, Inglaterra, dia 5 de agosto de 1895, vítima de câncer na
garganta.
Engels não produz nada diferente de Marx. Na
verdade ele ajuda Marx a escrever, sendo a teoria socialista produzida por
ambos, juntos.
Principais Obras:
- Manifesto
Comunista (com Marx);
- O Capital (colaborador de Marx, produz o final após sua morte);
- A Situação da Classe trabalhadora na Inglaterra;
- A Origem
da Filosofia;
- Família, Propriedade Privada e
Estado;
- Do Socialismo Utópico ao
Científico.
Materialismo
Histórico e Dialético:
Esse é o método de análise da sociedade na
visão marxista, que compreende que as mudanças e evoluções sociais ocorrem de
forma dialética (influência hegeliana), portando, as transformações vêm através
de conflitos de forças opostas, representada pela fórmula: Tese + Antítese =
Síntese. Essa relação formaria um ciclo, no qual a síntese se transformaria na
nova tese, sofrendo por uma nova antítese que culminaria na formulação de uma
nova síntese, assim por diante. Marx e Engels, olham isso no contexto
materialista.
Do lado materialista, o autor acreditava que as
condições materiais organizariam o âmbito social, portanto, em uma relação de
causa e consequência, a produção material moldaria diretamente a forma de
relação social. Na visão marxista, as bases materiais e de produção
refletem a estrutura social, assim vemos na relação de infraestrutura e
superestrutura.
Infraestrutura e Superestrutura:
Na teoria marxista, podemos ver uma divisão em
níveis da sociedade, na qual denomina-se de Infraestrutura e
Superestrutura. Sendo que a Infraestrutura determina a superestrutura.
Infraestrutura: é
composta pelas bases materiais e econômicas, como o relacionamento entre o
trabalhador e o meio de produção ou a classe dominante e a classe dominada,
portanto, as bases econômicas determinam as bases filosóficas, políticas e
sociais. É compreendendo a organização econômica que
entenderemos a organização subjetiva da sociedade. Para Marx, na sociedade
quando você transforma a base material, você transforma a sociedade como um
todo.
Exemplo: capitalismo,
feudalismo, mercantilismo.
Superestrutura: é
formada pelas bases filosóficas, políticas e sociais, que funcionam como
justificativas para a sustentação das bases materiais de produção
(infraestrutura).
Exemplo: literatura,
Estado, filosofia, ciência, arte e cultura, educação, religião,
aparato militar e de segurança, meios de comunicação de massa,
judiciário, ...
Divisão
e Luta de Classes:
Para o autor, a história humana é a história da
luta de classes. A sociedade, na concepção
marxista, é baseada na relação entre o dominado e dominador; explorado e
explorador; classe dominante e classe dominada, na qual o dominador possui os
meios de produção (propriedade privada) e o dominado a mão-de-obra. Por
classes, Marx compreende um grupo de pessoas que se relacionam de
forma comum com os meios de produção, que se originam da divisão do
trabalho.
O detentor dos meios de produção representa a
classe dominante, que visa manter o status quo - a relação de
classe como está -, ao mesmo tempo em que a classe explorada vive em plena
alienação, tendo retirada de si os meios de produção e necessitando vender sua
mão-de-obra para sobreviver, até que venha a abolição da luta de classe e dessa
relação exploratória. Para Marx a história humana é a luta de classes.
Marx divide a sociedade em 5 tempos históricos,
nos quais, podemos ver esse tipo de relação:
Comunismo primitivo: Sem
divisão de classes.
Mundo antigo: Dividida
entre Elite social e Escravos
Feudalismo: Aristocracia
e Camponeses.
Sociedade Industrial: Burguês
e Proletário.
Comunismo: Sem
lutas de classes.
Mais-Valia:
Para Marx, a mais-valia significa a diferença
entre o valor pago ao trabalhador e o produzido, sendo esse, a mola propulsora
do capitalismo. Seria o lucro que o empregador tem sobre o trabalho do
proletário, que, segundo Marx, é desigual e injusto, pois o trabalho total
realizado pelo proletário não é revertido em pagamento monetário
equivalente. Neste conceito se enquadram desde o trabalhador que recebe
salário mínimo, até o assalariado mais bem pago.
Práxis:
Significa a atividade prática em função da teoria.
Para Marx, realizar uma práxis é a realização da transformação material da
realidade. Marx desenvolve esse termo
como uma crítica ao idealismo e ao materialismo. Para o sociólogo, a teoria
está incluída na prática. Portanto, a transformação da realidade não se funda
somente na teoria nem só na prática. É o ponto em que a teoria, ou reflexão,
encontra a ação.
Estado:
Para Marx, o Estado serve como instrumento da
classe dominante, pois não é capaz de excluir as desigualdades e contradições
sociais. O aparato estatal, segundo o autor,
perpetua os interesses e a influência da classe dominante, intensificando a
luta de classe e a exploração. Ao procurar acabar com a luta de classes, o
proletariado deveria extinguir o Estado burguês e instituir um Estado governado
pela união proletária, acabando com a propriedade privada e os privilégios da
burguesia.
Socialismo científico:
Para Marx, como já exposto, a sociedade moderna
se baseia na exploração do proletariado pela burguesia, e para uma solução, o
proletariado deveria se juntar politicamente na luta contra a classe dominante,
retirando-a do poder e, consequentemente, abolindo a propriedade privada e a
luta de classes, instaurando a socialização dos meios de produção e o controle
do Estado pelos proletários.
Para Marx, o capitalismo possui crises cíclicas
que, um dia, gerariam sua última crise, sendo ela o estopim para o comunismo.
Mais adiante, dever-se-ia extinguir o Estado e colocar em prática o comunismo,
que seria o fim de todas as desigualdades sociais, econômicas e de classes.
Diferença entre socialismo Utópico e
Científico:
O socialismo utópico acreditava que o fim da
luta de classe viria através de uma mudança de mente na sociedade, não
acreditando que a revolução seria o caminho correto para o fim da exploração do
proletariado. Já o socialismo científico acreditava que a mudança viria através
da ação política revolucionária do proletariado, colocando fim nas
desigualdades e lutas de classes.
Alienação:
A teoria marxista crê que o sistema de produção
capitalista industrial provoque a alienação ao trabalhador, a partir do
momento em que se retira os meios de produção do proletariado, concentrando nas
mãos da burguesia. Agora, o trabalhador não tem mais uma força criativa,
seu trabalho se resume em força produtiva, na qual está alheio do processo
final, não mais se identificando com o objeto terminado. O trabalhador passa a
não ter mais noção do processo produtivo, devido a intensa especialização do
trabalho, perdendo autonomia e identificação com o produto final. Além
disso, o trabalhador perde a riqueza produzida pelo seu trabalho vendo o
burguês se enriquecer, mesmo estando fora da força produtiva (mais valia).
Fetichismo da Mercadoria:
Fetiche pode ser definido como um objeto inanimado,
portanto, feito por mãos humanas, passa a ter habilidades sobrenaturais e a ser
objeto de adoração. Esse termo, fetiche da mercadoria, está diretamente ligado
ao da alienação. O trabalhador passa a ser deixado de fora de todo o processo
de produção, sendo ele somente um meio para a mercadoria final, perdendo toda a
sua relação com o produto. Com isso, Marx cunha esse termo como sendo o
fetichismo da mercadoria, na qual o produto passa a ter vida independente da
ação do proletário, não dependendo mais da ação direta do trabalhador para
existir (o trabalhador é só o meio, não mais o produtor).
Diante disso, o produto, que deveria receber
seu real valor devido ao trabalho dedicado a ele, passa a ter um valor irreal,
como se não fosse fundamentada no trabalho empregado na mercadoria. Sendo
assim, a mercadoria fica dissociada à produção e ao produtor, recebendo vida
própria e sendo, agora, objeto de adoração. Exemplo: Não sabemos quem
são as pessoas produzem o I-Phone ou outro celular, mas os queremos,
é como se o produto possuísse vida própria.
Ideologia:
A ideologia pode ser definida como um conjunto
de ideias que nos orientam o viver em sociedade. Para
Marx, é um conjunto de ideias que visam sustentar interesses da classe
dominante, buscando construir uma hegemonia de uma determinada classe, não
podendo ser questionada. A ideologia é utilizada pela classe dominadora como
legitimação da exploração para com a classe dominada, se utilizando da
superestrutura para reafirmar a ideologia dominante. Então, a ideologia
dominante, usa a “superestrutura” para “iludir” o proletariado.
Para combater a ideologia, é necessário o
acesso universal ao conhecimento científico (saber verdadeiro), pois, se cada
um possuísse o pleno conhecimento, haveria uma consciência de classe, na qual o
cidadão seria capaz de reconhecer a realidade de fato, a exploração e a
alienação e, através do pensamento crítico e não alienado, passaria a tomar
decisões pessoais, que não seriam influenciadas pela ideologia dominante.
Legado de Marx:
Como legado, Marx deixou uma herança: o
Marxismo e sua importância para as ciências sociais e econômicas. As
teorias de Marx influenciaram teóricos como: Lênin, Stalin, Trotsky, Rosa
Luxemburgo, Che Guevara; Antônio Gramsci, Luís Carlos Prestes. Além
de influenciar vários movimentos sociais e partidos políticos em prol
da igualdade social e da abolição do sistema capitalista, tendo como o mais
expressivo movimento: a Revolução Russa, de 1917.
Richard
Sennett e a realidade etérea
Introdução
Richard
Sennet, um ex-músico (violoncelista) e hoje filósofo, sociólogo e romancista,
considerado um dos maiores pensadores atuais vivos (2021). Foi inclusive, aluno
de Hannah Arendt e une em seus trabalhos, aspectos dapsicologia, história, sociologia
e economia.
É casado
com a, também, socióloga Saskia Sassen. Filho de imigrantes russos, vive em Chicago, professor de sociologia na
London School of Economics e de Humanidades na New York University, é um estudioso
e analista do funcionamento do capitalismo atual.
Para
Sennett o capitalismo hoje, se torna um sistema de dominação e deixa de ser um
sistema de concorrência e acredita ele, que as novas tecnologias desenvolveram
um novo tipo de escravidão e que “escravizam” de forma muito maior que em
outras épocas.
Ele acredita
que o “neo capitalismo” ou capitalismo
flexível, advindo de um novo
contexto econômico criou a necessidade de flexibilidade nas relações de
trabalho e isso prejudica as relações entre as pessoas nos aspectos de
compromisso, confiança e lealdade, sendo isso deletério das virtudes do caráter
pessoal. Isso advém, principalmente, do medo dos trabalhadores de perderem o
emprego ante às mudanças ocorridas. Esse capitalismo flexível é caracterizado
por um trabalhador mais polivalente, por contratos de trabalho mais curtos e
alguns terceirizados (marca maior desta flexibilização). Outro aspecto deste
capitalismo flexível é o uso da tecnologia para aumentar a produtividade e o
controle sobre os trabalhadores.
Esse
novo capitalismo agrega a informação tecnológica. É o capitalismo da informação
e no sentido que, a informação é um dos capitais
que se agregam ao sistema e que regem o mundo de hoje. Um exemplo disso são as mídias sociais e, os Fake News.
Consigo
identificar que a relação entre a teoria de Sennett com Marx/Engels tem haver
com os conceitos de superestrutura e ideologia (exemplos como os discursos da
meritocracia, da “meta dada, meta cumprida”, do trabalhador motivado);
alienação e dominação (o trabalhador cada vez mais alheio dos meios de produção
e controlado pela tela do computador, o “trabalho em equipe” que na verdade é uma forma de aumentar a
produtividade onde cada um controla o outro, mesmo sem chefe);o fetiche da
mercadoria (relações flexíveis).
O Trabalho de sociologia solicitado iria até aqui, entretanto, a teoria de Richard Sennett é algo
novo para mim, e, após pesquisar, resolvi deixar registrado no trabalho alguns
textos da pesquisa. Reforço, -apesar de expostas as fontes, - que os textos não são meus, foram
obtidos na pesquisa sobre a teoria de Sennet em entrevistas do mesmo e sites
confiáveis da internet (citados abaixo) e, estão anexados para referenciar o trabalho
e a teoria caso eu precise disso em algum outro momento, saberei onde encontrar.
Sennett é considerado um dos
maiores intelectuais em sociologia urbana na atualidade. PHD. em História da
Civilização Americana pela Universidade de Harvard, seu trabalho une
sociologia, história, antropologia e psicologia social. Aluno da filósofa alemã
Hannah Arendt e com influências do filósofo francês Michel Foucault, seus
estudos analisam a vida dos trabalhadores no meio urbano e questões ligadas à
arquitetura das cidades.
Publicou vários livros sobre a
organização urbana e as consequências sociais e emocionais do capitalismo
contemporâneo. Sua obra mais conhecida é O declínio do homem público, na
qual aborda a relação entre a vida pública e o culto ao indivíduo e ao
individualismo. Em 2009, lançou o primeiro volume da trilogia Projeto Homo
Faber, para resgatar as habilidades necessárias à vida cotidiana. O
artífice defende a ideia de que fazer é pensar e demonstra como o trabalho
com as mãos pode animar o trabalho da mente. Juntos, segundo volume da
trilogia, traz uma reflexão sobre a arte da cooperação e de como ela requer a
capacidade de entender e mostrar-se receptivo ao outro. O último volume, ainda
a ser lançado, tratará de como criar espaços para viver nas cidades.
Richard Sennett reflete sobre
como os sujeitos podem se tornar intérpretes competentes da própria existência,
mesmo diante dos obstáculos que a sociedade oferece. Em reconhecimento aos seus
estudos, recebeu os prêmios Hegel e Spinoza, e o doutorado honorário pela
Universidade de Cambridge, entre outros.
https://www.fronteiras.com/portoalegre/conferencia/richard-sennett
A realidade Etérea, o Teletrabalho, Ação
Sindical e Proteção Social: O nó do gargalo
“Na revolta
contra a rotina, a aparência de nova liberdade é enganosa. O tempo nas
instituições e para os indivíduos não foi libertado jaula de ferro do passado,
mas sujeito a novos controles do alto para baixo. O tempo da flexibilidade é o
tempo de um novo poder”. (SENNETT da, 1999: 68). A natureza etérea, flexível,
descentralizada e virtual do teletrabalho ou trabalho remoto pode facilitar
situações de omissão, sonegação e expropriação de proteção social/trabalhista
aos teletrabalhadores.
“Lamentavelmente,
pode-se dizer que aqueles que se dedicam a estudar os fenômenos sociais
adjacentes às relações de trabalho, e conhecem com relativa profundidade a
realidade prática do teletrabalho, o associam a uma ideia de precarização
(UCHO, 2009). O teletrabalho aparece como resposta à pressão por flexibilização
das relações trabalhistas, que decorre de um processo global de fragmentação e
descentralização da produção, de revolução informacional e as novas configurações
das cadeias globais de valor (relações de subordinação produtiva e de
dependência).
As
dificuldades de ação do Direito do Trabalho se multiplicam quando os “labores
virtuais” são exercidos em países distintos do local de onde foram encomendados
(offshoring produtivo), pois aí é praxe notar-se, conforme adverte Wilfredo
Sanguineti Raymond (2011) “uma seleção ‘à lá carte’ do regime de prestação de
serviços laborais e uma ‘importação virtual’ do trabalho ao preço do Estado
menos protetor”. Este fenômeno talvez seja o maior desafio da ação sindical no
universo do teletrabalho ou trabalho remoto.
Há que se
atentar para alguns pontos de preocupação da ação sindical no contexto do
teletrabalho, como o controle da jornada de trabalho, o pagamento de hora
extra, o direito de descanso, lazer, que pode ser comprometido pela não
desvinculação completa ao trabalho, as condições de trabalho, o pagamento de
horas de sobreaviso (tempo de disponibilidade do trabalhador aos chamados da
empresa, que é difícil de ser mensurado quando a esfera privada se mistura à
esfera profissional), as normas de saúde e segurança no trabalho, e o dito
‘perigo da autonomia’, que pode comprometer a lógica da responsabilidade
objetiva do empregador diante de riscos de doenças e acidentes de trabalho.
Com a
cooperação remota, feita à distância, a categoria “local de trabalho” é
flexibilizada e relativizada, passando o controle do trabalho a ser exercido
majoritariamente com balanços de metas e resultados, ou pela utilização de
tecnologias de comunicação (telessubordinação) e de tecnologias biométricas.
Alan Supiot (2007: 164/165) ressalta o quanto o Direito do Trabalho está hoje
abalado pelas novas tecnologias da informação e da comunicação, e exposto às
fantasias da ubiquidade. Cada vez mais, espera-se um ser humano disponível em
todo o lugar e em toda a hora para trabalhar ou consumir.
A reflexão
sobre essas novas formas de controle do trabalho e “descontrole do tempo”
envolve a proteção da intimidade e a inviolabilidade do domicílio, que poderiam
ser relativizados e postos em perigo, além disso, “o teletrabalho cria as
condições para o abuso do horário de trabalho, pois os meios de
telecomunicações designadamente o telefone, o fax, ou o correio eletrônico
serão partilhados entre a utilização para fins profissionais e fins familiares
pelo que aumenta o risco de o indivíduo estar sempre contatável, estar sempre
sob pressão profissional de realizar determinada tarefa ou trabalho, o que o
conduz a continuar/prolongar o tempo de trabalho diário.
O trabalho em
excesso como qualquer outro vício comportamental, poderá originar doenças
relacionadas com stress ou conflitos familiares” (Feliciano,
Freitas, Lencastre e Silva, 2000, p. 3) A questão da subordinação ao
trabalho é analisada pelo grau de intervenção e alcance do empregador no
trabalho do empregado. Um conceito intermediário seria o
de parassubordinação. Manuel Castells nos fornece também uma divisão do
teletrabalho em três categorias: a) os substituidores, que são aqueles que
substituem o serviço efetuado em um ambiente de trabalho tradicional pelo
serviço feito em casa; b) os autônomos, trabalhando online de suas casas; c) e
os complementadores, que trazem para casa trabalho complementar do escritório
convencional (Castells, 1999). Em cada caso, o grau de telessubordinaçao e as
possibilidades de controle do trabalho variam.
O Teletrabalho
é muito utilizado dentro das cadeias globais de produção, pois esta modalidade
de trabalho atende bem ao modelo de descentralização produtiva global. Muitos
especialistas o relacionam ao fenômeno do dumping social, termo utilizado para
designar a prática de as empresas utilizarem trabalho mais barato, seja pelo
uso de trabalho de migrantes, seja pelo deslocamento total ou parcial da
produção para países com maiores desigualdades sociais, mercados de trabalho
desregulados e com uma rede de proteção social frágil, quando não inexistente.
Há um caráter
duplo da virtualidade intrínseca ao teletrabalho para a ação sindical, pois ao
mesmo tempo em que a virtualidade pode funcionar como uma barreira ou fator
limitante ao alcance Sindical, ela pode também ser utilizada como um mecanismo
de mobilização e força informacional e discursiva. A falta de regulação legal
específica sobre definição, contratos e condições de teletrabalho podem levar
Sindicatos a reforçar a ideia do “negociado sobre o legislado” como uma forma
de garantir ao teletrabalhador o direito de requerer direitos e denunciar
situações de dano ou abuso, além de evitar riscos de regulamentação uniforme de
condições de trabalho para situações que tem grande potencial de variação, onde
prevalecem contratos individuais e os Sindicatos perdem poder de influência
global.
O exercício do
direito Sindical na empresa com o uso de novas tecnologias, já que os métodos
tradicionais são incompatíveis com a condição de trabalho remoto, figura entre
as possibilidades plausíveis de coordenação da ação Sindical com as novas
realidades. Deve ser lembrada também a importância do diálogo social tripartite
em um processo que contemple a modernização das relações de trabalho,
redefinindo-as de forma a dar conta dos novos fenômenos e contratos entre
capital/trabalho, mas preservando os direitos laborais e a proteção social dos
trabalhadores.
Lorena Ferraz C.
Gonçalves – mestre em Ciências Sociais UNB
A
Corrosão do Caráter
Nesse livro, Richard Sennett
oferece-nos um instigante ensaio sobre as influências do "capitalismo
flexível" no mundo do trabalho e suas repercussões no caráter humano,
convidando-nos a realizar uma profunda reflexão sobre as consequências sociais
dos novos caminhos trilhados pelos indivíduos na sociedade da informação.
É de conhecimento geral o que
a maioria dos consultores de recursos humanos recomenda para os profissionais
nos dias de hoje: invista tudo o que puder em sua carreira para garantir sua
polivalência no mercado de trabalho, não permaneça em uma mesma empresa ou
função por muito tempo e esteja preparado para relações de trabalho
temporárias.
Na opinião de Sennett, essas
exigências de flexibilidade na atuação profissional e a inexorável
fugacidade das relações trabalhistas estariam contribuindo para enfraquecer
valores como o compromisso, a confiança e a lealdade, que são fundamentais
para a consolidação do caráter humano. Para o autor, a decadência desses
valores seria um reflexo do desaparecimento das relações de longo prazo no
trabalho e estaria se reproduzindo na vida social, dificultando o
estabelecimento de relações mais permanentes com os amigos e a comunidade,
além de interferir na formação do caráter das crianças, que não veem mais na
rotina diária dos pais as virtudes que eles procuram pregar.
Essas mudanças de
comportamento na vida profissional resultam das novas forças que estão
impactando o mundo do trabalho na empresa
flexível: a reinvenção descontínua das instituições, a especialização
flexível de produção e a concentração de poder sem centralização. Reinventar a
empresa e flexibilizar a produção tornaram-se uma regra em um mercado em que o
que interessa é o retorno em curto prazo para os acionistas e a pronta resposta
à demanda do consumidor. Por outro lado, para saciar essa vertiginosa ânsia
pelo resultado imediato, tornou-se indispensável acelerar os processos, de
forma que foi necessário permitir que funcionários tivessem mais controle
sobre suas atividades, controle esse que está sendo concedido sob uma
estrita vigilância operada via novas tecnologias de informação, inaugurando
formas mais sofisticadas de dominação do que as utilizadas nas empresas no
passado.
O paradoxal é que esse novo
sistema de dominação está sendo construído sob a insígnia da liberdade. Um dos
melhores exemplos disso é a nova forma de organizar o tempo no local de
trabalho, que Sennett denomina "flexi-tempo". Este é caracterizado
pelo planejamento flexível das jornadas e pelo trabalho virtual, no qual o
funcionário deixa de ser monitorado pelo relógio de ponto para ser controlado
por meio da tela do computador. Assim, na visão do autor, a proclamada
"desburocratização" das empresas é enganadora, pois, apesar do
abandono da rigidez e do formalismo típicos da organização burocrática, a sua
característica fundamental, que é a dominação e a alienação do trabalhador,
está sendo recriada.
Em atividades operacionais,
por exemplo, a automação está reinventando a superespecialização taylorista do
trabalhador. E o caso da padaria automatizada descrita por Sennett em seu
ensaio: para fazer o pão basta saber "clicar" os ícones corretos, o
que não requer conhecimento do ofício, mas apenas conhecimentos básicos de
Windows. Associada ao "flexi-tempo", essa superespecialização
estaria desmantelando as identidades e causando uma profunda indiferença em
relação ao trabalho.
Já no ambiente empresarial, os
executivos estão sendo expostos, pela necessidade de provar todos os dias a sua
competência, a um estado contínuo de vulnerabilidade. Em um mercado em que há
poucos ganhadores e no qual o "vencedor leva tudo", as pessoas estão
sendo continuamente pressionadas a se superar, apesar do alto risco de
fracasso. Nesse "jogo", os funcionários de meia-idade são os que mais
sofrem, pois a concentração nas capacidades imediatas leva a uma negação de sua
experiência passada, agravada pelos rótulos de aversão ao risco e de
inflexibilidade.
Por outro lado, a ética
individual do trabalho, personificada pelo "homem motivado", que
busca incessantemente provar seu valor moral pelo trabalho, está sendo
substituída pela ética do trabalho em equipe. Para Sennett, isso seria uma
vitória para a civilização se o trabalho em equipe não estivesse se
transformando em um "teatro" em que as aparências e comportamentos
são manipulados e o conflito é sistematicamente adiado. Na realidade, o
trabalho em equipe veio substituir a vigilância do administrador pela pressão
dos colegas, tornando-se uma excelente estratégia para aumentar a
produtividade. Assim, as responsabilidades são partilhadas e não há uma figura
que simbolize a autoridade, mas a dominação continua permeando as relações
entre os indivíduos no trabalho.
Sennett, então, cita Rorthy
para demonstrar que o "homem motivado" está sendo substituído pelo
"homem irônico": "Richard Rorthy escreve, sobre a ironia, que é
um estado de espírito em que as pessoas jamais são 'exatamente capazes de se
levar a sério, porque sabem que os termos em que se descrevem estão sujeitos a
mudança, sempre sabem da contingência e fragilidade de seus vocabulários
finais, e portanto dos seus eus'. Uma visão irônica de si mesmo é a consequência
lógica de viver no tempo flexível, sem padrões de autoridade e
responsabilidade" (p. 138). E nos provoca: "A clássica ética do
trabalho de adiar a satisfação e provar-se pelo trabalho árduo dificilmente pode
exigir nossa afeição. Mas tampouco o pode o trabalho em equipe, com suas
ficções e fingimentos de comunidade" (p. 139).
Para Sennett, o comunitarismo
resulta de fortes laços entre pessoas que tiveram tempo suficiente para
enfrentar suas diferenças: a suposição de que todos os membros de uma equipe de
trabalho partilham das mesmas motivações não garante uma comunicação efetiva,
tornando o trabalho em equipe uma forma frágil de comunidade. Na sua visão,
é o enfrentamento do conflito que oferece a base real para unir pessoas de
poder desigual e interesses diferentes. Além disso, para que a confiança se
estabeleça entre as pessoas, é fundamental que elas sejam necessárias umas às
outras.
Ironicamente, ser necessário a
alguém é justamente o valor que está sendo depreciado no novo mundo do
trabalho, no qual se descartam as pessoas, suas identidades e suas chances de
sucesso. Nas palavras de Sennett:
"Esse é o problema do caráter no capitalismo moderno. Há história, mas não
a narrativa partilhada de dificuldade, e portanto tampouco destino partilhado.
Nessas condições, o caráter se corrói; a pergunta 'Quem precisa de mim?' não
tem resposta imediata" (p. 175-176).
Assim, para Richard Sennett, o
novo capitalismo flexível, em sua ânsia pelos resultados, está gerando uma
sociedade impaciente e concentrada apenas no momento imediato, cujos valores
amorais contribuem para corroer o caráter humano. E o
que é mais inquietante: a substituição
da rotina burocrática pela flexibilidade no trabalho não foi acompanhada pela
liberdade e pela emancipação do indivíduo, mas pela elaboração de novas formas
de dominação.
Apesar de suas constatações
pessimistas, Sennett reconhece que não há como negar as novas realidades
históricas nem os avanços que ocorreram no mundo do trabalho. Assim, para
compreender sua mensagem, o leitor precisa estar atento para o fato de que sua
intenção não é fazer um resgate do passado, mas questionar como vamos moldar o
nosso futuro em uma sociedade na qual os indivíduos não estão mais seguros de
serem necessários aos seus semelhantes. Esse convite para tão indispensável
reflexão é suficiente para tornar a leitura desse ensaio estimulante para todos
aqueles que procuram compreender as consequências sociais dessa progressiva
corrosão do caráter humano.
https://www.fgv.br/rae/artigos/revista-rae-vol-40-num-3-ano-2000-nid-46280/
Entrevista
para o El País (seleção
parcial de trechos)
O que aconteceu para que o que nós
entendíamos como direitos hoje sejam vistos como privilégios? O capitalismo moderno funciona colonizando a
imaginação do que nós consideramos possível. Marx já havia percebido que o
capitalismo tinha mais a ver com a apropriação do entendimento do que com a apropriação do trabalho. O Facebook é
a penúltima apropriação da imaginação: o que víamos como útil agora se revela
como uma forma de entrar na consciência das pessoas antes de que possamos agir.
As instituições que se apresentavam como libertadoras se transformam em
controladoras. Em nome da liberdade, o Google e o Facebook nos levaram pelo
caminho em direção ao controle absoluto.
Como detectar o perigo nas novas
tecnologias sem se transformar em um paranoico que suspeita de tudo? Devemos nos perguntar sobre o que se apresenta como real. Isso é o
que fazem os escritores e os artistas. Eu não suspeito. Suspeitar significa que
existe algo oculto e eu não acho que o Facebook tenha algo oculto. Simplesmente
não queremos ver. Não queremos enfrentar que o gratuito significa sempre uma
forma de dominação.
Em tempos de redes sociais, como
preservar a intimidade? O que aconteceu com a Cambridge Analytica é um crime: alguém roubou e
vendeu informação privada. Não existe mistério. É um negócio ilegal que
camuflaram com conversas sobre proteção de dados. Quem recebeu a informação
pagou por ela. Mas o truque é levar uma discussão que não deveria existir à
imprensa. Os crimes devem ser punidos.
De que maneiras podem agir hoje os
políticos para defender os direitos das pessoas contra as pressões dos poderes
econômicos? A história
explica. Há 100 anos Theodore Roosevelt decidiu que o Estado deveria romper os
monopólios. Era conservador. Mas era o presidente de todos os americanos. O
capitalismo tem a tendência a passar com grande facilidade do mercado ao
monopólio. E aí, com a repressão da concorrência, começam os grandes problemas,
a grande desproteção. Com monopólios, o capitalismo passa de ser o sistema da
concorrência a ser o da dominação. Aumentar a diferença salarial entre os ricos
e os pobres de tal maneira como ocorre agora é o caminho a todos os populismos.
Isso foi Trump. No Reino Unido tivemos o equivalente a Obama em Tony Blair. Pior do que Obama. Obama é um homem de total
integridade pessoal. E Blair é somente um político.
Por que o Estado de bem-estar só
parece sustentável nos países nórdicos? Eu resisto a
essa ideia. Não é preciso ser rico para que esse sistema prospere e se
mantenha. Na Colômbia existe com
recursos muito menores. Em Botsuana há um modelo justo, ainda que a equidade
quando se tem pouco signifique pouco. Bismarck construiu o Estado de bem-estar
na Alemanha com más intenções: queria evitar que os trabalhadores se
rebelassem. Com o Estado de bem-estar as pessoas se tornam conservadoras. A
destruição dessas políticas que ocorre hoje na Espanha é uma tragédia. Sabe que
meus pais lutaram na Guerra Civil Espanhola?
Em A Corrosão do Caráter o senhor
descreve a falácia de que a flexibilidade trabalhista melhora a vida. Que tipo
de caráter produzirão o Uber e o Deliveroo? Vidas
sem coluna vertebral. Um caráter cujas experiências não constroem um todo
coerente. Algo muito circunscrito a nosso tempo e preocupante porque os humanos
precisam de uma história própria, uma coluna vertebral.
Referências
Bibliograficas:
Lorena Ferraz C. Gonçalves - http://jus.com.br/artigos/12530/o-teletrabalho#ixzz3FMuQGSgzhttp://www.trt4.jus.br/portal/portal/trt4/comunicacao/noticia/info/NoticiaWindow?action=2&destaque=false&cod=724303
Alemão, I. e Barroso,
Márcia Regina C. O TELETRABALHO NO DOMICÍLIO: O REPENSAR DAS CATEGORIAS TEMPO E
ESPAÇO NA ESFERA PRODUTIVA. XV Congresso Brasileiro de Sociologia, 2011.
Rodrigues, Ana Cristina Barcelos. ‘O teletrabalho e o Direito coletivo’. In
TELETRABALHO: A TECNOLOGIA TRANSFORMANDO AS RELAÇÕES DE TRABALHO. Dissertação
de mestrado: USP, 2011
file:///C:/Users/Convidado/Downloads/TELETRABALHO_A_tecnologia_transformando_as_relacoes_de_trabalho_Integral.pdf
A história de
Friederich Engels, site: toda matéria.
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