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segunda-feira, 23 de agosto de 2021

 

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP

FACULDADE DE CIENCIAS HUMANAS E SOCIAIS - FCHS

CURSO DE DIREITO – CAMPUS DE FRANCA - SP

Disciplina: INTROCUÇÃO À SOCIOLOGIA

 

Aluno: Rubens Chioratto Junior – R.A. 211.222.526 1º período Noturno

 

OS MATERIALISTAS CIENTÍFICOS - KARL MARX E FRIEDRICH ENGELS 

·        A práxis marxista e Patch Adams (médico retratado no filme de mesmo nome); 

·        Uma interpretação materialista de uma realidade etérea. 

 

A práxis e Patch Adams: 

Começando não pelo começo, mas fazendo um novo começo, inauguro o trabalho falando do aspecto que mais me chama atenção da teoria marxista ao lado do conceito de alienação: A práxis. Trata-se de uma intersecção entre a teoria e a prática, onde uma aperfeiçoa a outra. Através da práxis é possível realizar a mudança de uma dada realidade.  No filme Patch Adams que retrata a história real de um homem de meia idade que resolve ir à universidade estudar medicina. Lá decide que a forma de ensinar medicina não e adequada e com a ajuda de outros colegas confronta o ensino da faculdade criando um serviço de atendimento baseado na “empatia” com o paciente, junto a isso aprimora seus conhecimentos exercendo na prática, a teoria que aprende de forma síncrona. Quando se lê sobre a práxis marxista, parece adequada a lembrança do filme e o trabalho do estudante de medicina Patch Adams! Se pensarmos é muito mais eficiente aprender a teoria com a prática concomitantes, por exemplo, imaginem aprender jogar voleibol ou futebol, primeiro na teoria e, depois, quando você souber a teoria vai ter contato direto com o jogo, o Campo/quadra e os parceiros de time? As pessoas iriam vão dizer, que ridículo, não faz nenhum sentido! Pois é, não faz mesmo, nenhum sentido. Ou pelo menos não é a melhor forma de aprender a jogar voleibol ou futebol, sendo que jogando é que aprendemos mesmo a jogar. No conceito de práxis, a teoria se fundamenta na prática. 

  Introdução 

Karl Marx  

Karl Marx nasceu na Alemanha (Prússia), em maio de 1818 na cidade de Tréviris, 19 anos após a revolução francesa. Descendente de uma família judia, estudou direito na Universidade de Bonn e, posteriormente, na Universidade de Berlin. Marx sendo um dos fundadores do socialismo científico, juntamente com Friedrich Engels, juntos fundaram o jornal “Gazeta Renana”. Por criticar excessivamente a sociedade alemã, foi expulso e se exilou em Londres, onde faleceu, deprimido em função do falecimento de sua esposa, em março de 1883, de bronquite e pleurisia.

O sociólogo iniciou sua carreira, já num contexto de desfecho da Revolução Francesa e início da Revolução Industrial, sem descartar a importância da revolução francesa, o seu objeto de estudo foi a revolução industrial e o capitalismo. Marx se propôs a fazer um estudo sobre as desigualdades da Europa pós Revolução Industrial. Lá não havia legislação trabalhista, o que possibilitava a exploração demasiada do homem pelo capital.  

Quem quer ser capitalista, deveria estudar Marx, pois ele deve ser a pessoa que mais estudou o capitalismo no planeta, e mostra isso no 1º e 2º capítulo do livro “O Capital”. É comum que nem os que se autoproclamam marxistas leram Marx, normalmente leram algo ou algum autor que fala sobre a obra/teoria dele. 

Principais Obras: 

- Manifesto do Partido Comunista; 

- O Capital; 

- 18 de Brumário. 

Friedrich Engels 

Engels nasceu na cidade alemã de Barmen em 28 de novembro de 1820, vivendo na Alemanha até os 22 anos, filho de industrial muda para a Inglaterra e começa a trabalhar na fábrica de tecidos de seu pai. 

Esse período da vida, foi essencial para Engels desenvolver sua teoria sobre a classes trabalhadoras, ao observar a miséria e as condições dos operários que viviam dentro do regime capitalista. Em 1845, escreveu “A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra”. 

Por um tempo fez parte do grupo de esquerda dos “Jovens Hegelianos”, os quais estudavam a filosofia de Hegel. 

Em 1844, ele conhece Karl Marx em Paris, França e, com ele começa a desenvolver diversas teorias e escrever obras. 

A mais destacada foi o “Manifesto Comunista” escrita em colaboração de Marx e publicada em 1848. Nessa obra, eles reúnem os princípios do comunismo e, após a morte de Marx em 1883, Engels terminou e publicou o restante dos volumes da obra, “O Capital”. 

Engels faleceu em Londres, Inglaterra, dia 5 de agosto de 1895, vítima de câncer na garganta.  

Engels não produz nada diferente de Marx. Na verdade ele ajuda Marx a escrever, sendo a teoria socialista produzida por ambos, juntos. 

Principais Obras: 

  - Manifesto Comunista (com Marx); 

  - O Capital (colaborador de Marx, produz o final após sua morte); 

  - A Situação da Classe trabalhadora na Inglaterra; 

             - A Origem da Filosofia; 

             - Família, Propriedade Privada e Estado; 

  - Do Socialismo Utópico ao Científico. 

 
  Materialismo Histórico e Dialético: 

Esse é o método de análise da sociedade na visão marxista, que compreende que as mudanças e evoluções sociais ocorrem de forma dialética (influência hegeliana), portando, as transformações vêm através de conflitos de forças opostas, representada pela fórmula: Tese + Antítese = Síntese. Essa relação formaria um ciclo, no qual a síntese se transformaria na nova tese, sofrendo por uma nova antítese que culminaria na formulação de uma nova síntese, assim por diante. Marx e Engels, olham isso no contexto materialista. 

Do lado materialista, o autor acreditava que as condições materiais organizariam o âmbito social, portanto, em uma relação de causa e consequência, a produção material moldaria diretamente a forma de relação social. Na visão marxista, as bases materiais e de produção refletem a estrutura social, assim vemos na relação de infraestrutura e superestrutura. 

Infraestrutura e Superestrutura: 

Na teoria marxista, podemos ver uma divisão em níveis da sociedade, na qual denomina-se de Infraestrutura e Superestrutura. Sendo que a Infraestrutura determina a superestrutura. 

Infraestrutura: é composta pelas bases materiais e econômicas, como o relacionamento entre o trabalhador e o meio de produção ou a classe dominante e a classe dominada, portanto, as bases econômicas determinam as bases filosóficas, políticas e sociais.  É compreendendo a organização econômica que entenderemos a organização subjetiva da sociedade. Para Marx, na sociedade quando você transforma a base material, você transforma a sociedade como um todo. 

Exemplo: capitalismo, feudalismo, mercantilismo.  

Superestrutura: é formada pelas bases filosóficas, políticas e sociais, que funcionam como justificativas para a sustentação das bases materiais de produção (infraestrutura).   

Exemplo: literatura, Estado, filosofia, ciência, arte e cultura, educação, religião, aparato militar e de segurança, meios de comunicação de massa, judiciário, ... 

Divisão e Luta de Classes: 

Para o autor, a história humana é a história da luta de classes. A sociedade, na concepção marxista, é baseada na relação entre o dominado e dominador; explorado e explorador; classe dominante e classe dominada, na qual o dominador possui os meios de produção (propriedade privada) e o dominado a mão-de-obra. Por classes, Marx compreende um grupo de pessoas que se relacionam de forma comum com os meios de produção, que se originam da divisão do trabalho.  

O detentor dos meios de produção representa a classe dominante, que visa manter o status quo - a relação de classe como está -, ao mesmo tempo em que a classe explorada vive em plena alienação, tendo retirada de si os meios de produção e necessitando vender sua mão-de-obra para sobreviver, até que venha a abolição da luta de classe e dessa relação exploratória. Para Marx a história humana é a luta de classes. 

Marx divide a sociedade em 5 tempos históricos, nos quais, podemos ver esse tipo de relação: 

Comunismo primitivo: Sem divisão de classes.  

Mundo antigo: Dividida entre Elite social e Escravos 

Feudalismo: Aristocracia e Camponeses. 

Sociedade Industrial: Burguês e Proletário. 

Comunismo: Sem lutas de classes. 

Mais-Valia: 

Para Marx, a mais-valia significa a diferença entre o valor pago ao trabalhador e o produzido, sendo esse, a mola propulsora do capitalismo. Seria o lucro que o empregador tem sobre o trabalho do proletário, que, segundo Marx, é desigual e injusto, pois o trabalho total realizado pelo proletário não é revertido em pagamento monetário equivalente. Neste conceito se enquadram desde o trabalhador que recebe salário mínimo, até o assalariado mais bem pago. 

Práxis:  

Significa a atividade prática em função da teoria. Para Marx, realizar uma práxis é a realização da transformação material da realidade. Marx desenvolve esse termo como uma crítica ao idealismo e ao materialismo. Para o sociólogo, a teoria está incluída na prática. Portanto, a transformação da realidade não se funda somente na teoria nem só na prática. É o ponto em que a teoria, ou reflexão, encontra a ação.  

Estado: 

Para Marx, o Estado serve como instrumento da classe dominante, pois não é capaz de excluir as desigualdades e contradições sociais. O aparato estatal, segundo o autor, perpetua os interesses e a influência da classe dominante, intensificando a luta de classe e a exploração. Ao procurar acabar com a luta de classes, o proletariado deveria extinguir o Estado burguês e instituir um Estado governado pela união proletária, acabando com a propriedade privada e os privilégios da burguesia.  

Socialismo científico: 

Para Marx, como já exposto, a sociedade moderna se baseia na exploração do proletariado pela burguesia, e para uma solução, o proletariado deveria se juntar politicamente na luta contra a classe dominante, retirando-a do poder e, consequentemente, abolindo a propriedade privada e a luta de classes, instaurando a socialização dos meios de produção e o controle do Estado pelos proletários.  

Para Marx, o capitalismo possui crises cíclicas que, um dia, gerariam sua última crise, sendo ela o estopim para o comunismo. Mais adiante, dever-se-ia extinguir o Estado e colocar em prática o comunismo, que seria o fim de todas as desigualdades sociais, econômicas e de classes. 

Diferença entre socialismo Utópico e Científico: 

O socialismo utópico acreditava que o fim da luta de classe viria através de uma mudança de mente na sociedade, não acreditando que a revolução seria o caminho correto para o fim da exploração do proletariado. Já o socialismo científico acreditava que a mudança viria através da ação política revolucionária do proletariado, colocando fim nas desigualdades e lutas de classes.   

Alienação: 

A teoria marxista crê que o sistema de produção capitalista industrial provoque a alienação ao trabalhador, a partir do momento em que se retira os meios de produção do proletariado, concentrando nas mãos da burguesia. Agora, o trabalhador não tem mais uma força criativa, seu trabalho se resume em força produtiva, na qual está alheio do processo final, não mais se identificando com o objeto terminado. O trabalhador passa a não ter mais noção do processo produtivo, devido a intensa especialização do trabalho, perdendo autonomia e identificação com o produto final. Além disso, o trabalhador perde a riqueza produzida pelo seu trabalho vendo o burguês se enriquecer, mesmo estando fora da força produtiva (mais valia). 

Fetichismo da Mercadoria:   

Fetiche pode ser definido como um objeto inanimado, portanto, feito por mãos humanas, passa a ter habilidades sobrenaturais e a ser objeto de adoração. Esse termo, fetiche da mercadoria, está diretamente ligado ao da alienação. O trabalhador passa a ser deixado de fora de todo o processo de produção, sendo ele somente um meio para a mercadoria final, perdendo toda a sua relação com o produto. Com isso, Marx cunha esse termo como sendo o fetichismo da mercadoria, na qual o produto passa a ter vida independente da ação do proletário, não dependendo mais da ação direta do trabalhador para existir (o trabalhador é só o meio, não mais o produtor).  

Diante disso, o produto, que deveria receber seu real valor devido ao trabalho dedicado a ele, passa a ter um valor irreal, como se não fosse fundamentada no trabalho empregado na mercadoria. Sendo assim, a mercadoria fica dissociada à produção e ao produtor, recebendo vida própria e sendo, agora, objeto de adoração. Exemplo: Não sabemos quem são as pessoas produzem o I-Phone ou outro celular, mas os queremos, é como se o produto possuísse vida própria. 

Ideologia: 

A ideologia pode ser definida como um conjunto de ideias que nos orientam o viver em sociedade. Para Marx, é um conjunto de ideias que visam sustentar interesses da classe dominante, buscando construir uma hegemonia de uma determinada classe, não podendo ser questionada. A ideologia é utilizada pela classe dominadora como legitimação da exploração para com a classe dominada, se utilizando da superestrutura para reafirmar a ideologia dominante. Então, a ideologia dominante, usa a “superestrutura” para “iludir” o proletariado. 

Para combater a ideologia, é necessário o acesso universal ao conhecimento científico (saber verdadeiro), pois, se cada um possuísse o pleno conhecimento, haveria uma consciência de classe, na qual o cidadão seria capaz de reconhecer a realidade de fato, a exploração e a alienação e, através do pensamento crítico e não alienado, passaria a tomar decisões pessoais, que não seriam influenciadas pela ideologia dominante.  

Legado de Marx: 

Como legado, Marx deixou uma herança: o Marxismo e sua importância para as ciências sociais e econômicas. As teorias de Marx influenciaram teóricos como: Lênin, Stalin, Trotsky, Rosa Luxemburgo, Che Guevara; Antônio Gramsci, Luís Carlos Prestes. Além de influenciar vários movimentos sociais e partidos políticos em prol da igualdade social e da abolição do sistema capitalista, tendo como o mais expressivo movimento: a Revolução Russa, de 1917.

 

Richard Sennett e a realidade etérea

Introdução

Richard Sennet, um ex-músico (violoncelista) e hoje filósofo, sociólogo e romancista, considerado um dos maiores pensadores atuais vivos (2021). Foi inclusive, aluno de Hannah Arendt e une em seus trabalhos, aspectos dapsicologia, história, sociologia e economia.  

É casado com a, também, socióloga Saskia Sassen. Filho de imigrantes russos,  vive em Chicago, professor de sociologia na London School of Economics e de Humanidades na New York University, é um estudioso e analista do funcionamento do capitalismo atual.

Para Sennett o capitalismo hoje, se torna um sistema de dominação e deixa de ser um sistema de concorrência e acredita ele, que as novas tecnologias desenvolveram um novo tipo de escravidão e que “escravizam” de forma muito maior que em outras épocas.

Ele acredita que o “neo capitalismo” ou capitalismo flexível, advindo de um novo contexto econômico criou a necessidade de flexibilidade nas relações de trabalho e isso prejudica as relações entre as pessoas nos aspectos de compromisso, confiança e lealdade, sendo isso deletério das virtudes do caráter pessoal. Isso advém, principalmente, do medo dos trabalhadores de perderem o emprego ante às mudanças ocorridas. Esse capitalismo flexível é caracterizado por um trabalhador mais polivalente, por contratos de trabalho mais curtos e alguns terceirizados (marca maior desta flexibilização). Outro aspecto deste capitalismo flexível é o uso da tecnologia para aumentar a produtividade e o controle sobre os trabalhadores.

Esse novo capitalismo agrega a informação tecnológica. É o capitalismo da informação e no sentido que, a informação é um dos capitais que se agregam ao sistema e que regem o mundo de hoje. Um exemplo disso são as mídias sociais e, os Fake News.

Consigo identificar que a relação entre a teoria de Sennett com Marx/Engels tem haver com os conceitos de superestrutura e ideologia (exemplos como os discursos da meritocracia, da “meta dada, meta cumprida”, do trabalhador motivado); alienação e dominação (o trabalhador cada vez mais alheio dos meios de produção e controlado pela tela do computador, o “trabalho em equipe”  que na verdade é uma forma de aumentar a produtividade onde cada um controla o outro, mesmo sem chefe);o fetiche da mercadoria (relações flexíveis).

 

O Trabalho de sociologia solicitado iria até aqui, entretanto, a teoria de Richard Sennett é algo novo para mim, e, após pesquisar, resolvi deixar registrado no trabalho alguns textos da pesquisa. Reforço, -apesar de expostas as fontes, - que os textos não são meus, foram obtidos na pesquisa sobre a teoria de Sennet em entrevistas do mesmo e sites confiáveis da internet (citados abaixo) e, estão anexados para referenciar o trabalho e a teoria caso eu precise disso em algum outro momento, saberei onde encontrar.

Sennett é considerado um dos maiores intelectuais em sociologia urbana na atualidade. PHD. em História da Civilização Americana pela Universidade de Harvard, seu trabalho une sociologia, história, antropologia e psicologia social. Aluno da filósofa alemã Hannah Arendt e com influências do filósofo francês Michel Foucault, seus estudos analisam a vida dos trabalhadores no meio urbano e questões ligadas à arquitetura das cidades.

Publicou vários livros sobre a organização urbana e as consequências sociais e emocionais do capitalismo contemporâneo. Sua obra mais conhecida é O declínio do homem público, na qual aborda a relação entre a vida pública e o culto ao indivíduo e ao individualismo. Em 2009, lançou o primeiro volume da trilogia Projeto Homo Faber, para resgatar as habilidades necessárias à vida cotidiana. O artífice defende a ideia de que fazer é pensar e demonstra como o trabalho com as mãos pode animar o trabalho da mente. Juntos, segundo volume da trilogia, traz uma reflexão sobre a arte da cooperação e de como ela requer a capacidade de entender e mostrar-se receptivo ao outro. O último volume, ainda a ser lançado, tratará de como criar espaços para viver nas cidades.

Richard Sennett reflete sobre como os sujeitos podem se tornar intérpretes competentes da própria existência, mesmo diante dos obstáculos que a sociedade oferece. Em reconhecimento aos seus estudos, recebeu os prêmios Hegel e Spinoza, e o doutorado honorário pela Universidade de Cambridge, entre outros.

https://www.fronteiras.com/portoalegre/conferencia/richard-sennett

  

 
 A realidade Etérea, o Teletrabalho, Ação Sindical e Proteção Social: O nó do gargalo

“Na revolta contra a rotina, a aparência de nova liberdade é enganosa. O tempo nas instituições e para os indivíduos não foi libertado jaula de ferro do passado, mas sujeito a novos controles do alto para baixo. O tempo da flexibilidade é o tempo de um novo poder”. (SENNETT da, 1999: 68). A natureza etérea, flexível, descentralizada e virtual do teletrabalho ou trabalho remoto pode facilitar situações de omissão, sonegação e expropriação de proteção social/trabalhista aos teletrabalhadores.

“Lamentavelmente, pode-se dizer que aqueles que se dedicam a estudar os fenômenos sociais adjacentes às relações de trabalho, e conhecem com relativa profundidade a realidade prática do teletrabalho, o associam a uma ideia de precarização (UCHO, 2009). O teletrabalho aparece como resposta à pressão por flexibilização das relações trabalhistas, que decorre de um processo global de fragmentação e descentralização da produção, de revolução informacional e as novas configurações das cadeias globais de valor (relações de subordinação produtiva e de dependência).

As dificuldades de ação do Direito do Trabalho se multiplicam quando os “labores virtuais” são exercidos em países distintos do local de onde foram encomendados (offshoring produtivo), pois aí é praxe notar-se, conforme adverte Wilfredo Sanguineti Raymond (2011) “uma seleção ‘à lá carte’ do regime de prestação de serviços laborais e uma ‘importação virtual’ do trabalho ao preço do Estado menos protetor”. Este fenômeno talvez seja o maior desafio da ação sindical no universo do teletrabalho ou trabalho remoto.

Há que se atentar para alguns pontos de preocupação da ação sindical no contexto do teletrabalho, como o controle da jornada de trabalho, o pagamento de hora extra, o direito de descanso, lazer, que pode ser comprometido pela não desvinculação completa ao trabalho, as condições de trabalho, o pagamento de horas de sobreaviso (tempo de disponibilidade do trabalhador aos chamados da empresa, que é difícil de ser mensurado quando a esfera privada se mistura à esfera profissional), as normas de saúde e segurança no trabalho, e o dito ‘perigo da autonomia’, que pode comprometer a lógica da responsabilidade objetiva do empregador diante de riscos de doenças e acidentes de trabalho.

Com a cooperação remota, feita à distância, a categoria “local de trabalho” é flexibilizada e relativizada, passando o controle do trabalho a ser exercido majoritariamente com balanços de metas e resultados, ou pela utilização de tecnologias de comunicação (telessubordinação) e de tecnologias biométricas. Alan Supiot (2007: 164/165) ressalta o quanto o Direito do Trabalho está hoje abalado pelas novas tecnologias da informação e da comunicação, e exposto às fantasias da ubiquidade. Cada vez mais, espera-se um ser humano disponível em todo o lugar e em toda a hora para trabalhar ou consumir.

A reflexão sobre essas novas formas de controle do trabalho e “descontrole do tempo” envolve a proteção da intimidade e a inviolabilidade do domicílio, que poderiam ser relativizados e postos em perigo, além disso, “o teletrabalho cria as condições para o abuso do horário de trabalho, pois os meios de telecomunicações designadamente o telefone, o fax, ou o correio eletrônico serão partilhados entre a utilização para fins profissionais e fins familiares pelo que aumenta o risco de o indivíduo estar sempre contatável, estar sempre sob pressão profissional de realizar determinada tarefa ou trabalho, o que o conduz a continuar/prolongar o tempo de trabalho diário.

O trabalho em excesso como qualquer outro vício comportamental, poderá originar doenças relacionadas com stress ou conflitos familiares” (Feliciano, Freitas, Lencastre e Silva, 2000, p. 3) A questão da subordinação ao trabalho é analisada pelo grau de intervenção e alcance do empregador no trabalho do empregado. Um conceito intermediário seria o de parassubordinação. Manuel Castells nos fornece também uma divisão do teletrabalho em três categorias: a) os substituidores, que são aqueles que substituem o serviço efetuado em um ambiente de trabalho tradicional pelo serviço feito em casa; b) os autônomos, trabalhando online de suas casas; c) e os complementadores, que trazem para casa trabalho complementar do escritório convencional (Castells, 1999). Em cada caso, o grau de telessubordinaçao e as possibilidades de controle do trabalho variam.

O Teletrabalho é muito utilizado dentro das cadeias globais de produção, pois esta modalidade de trabalho atende bem ao modelo de descentralização produtiva global. Muitos especialistas o relacionam ao fenômeno do dumping social, termo utilizado para designar a prática de as empresas utilizarem trabalho mais barato, seja pelo uso de trabalho de migrantes, seja pelo deslocamento total ou parcial da produção para países com maiores desigualdades sociais, mercados de trabalho desregulados e com uma rede de proteção social frágil, quando não inexistente.

Há um caráter duplo da virtualidade intrínseca ao teletrabalho para a ação sindical, pois ao mesmo tempo em que a virtualidade pode funcionar como uma barreira ou fator limitante ao alcance Sindical, ela pode também ser utilizada como um mecanismo de mobilização e força informacional e discursiva. A falta de regulação legal específica sobre definição, contratos e condições de teletrabalho podem levar Sindicatos a reforçar a ideia do “negociado sobre o legislado” como uma forma de garantir ao teletrabalhador o direito de requerer direitos e denunciar situações de dano ou abuso, além de evitar riscos de regulamentação uniforme de condições de trabalho para situações que tem grande potencial de variação, onde prevalecem contratos individuais e os Sindicatos perdem poder de influência global.

O exercício do direito Sindical na empresa com o uso de novas tecnologias, já que os métodos tradicionais são incompatíveis com a condição de trabalho remoto, figura entre as possibilidades plausíveis de coordenação da ação Sindical com as novas realidades. Deve ser lembrada também a importância do diálogo social tripartite em um processo que contemple a modernização das relações de trabalho, redefinindo-as de forma a dar conta dos novos fenômenos e contratos entre capital/trabalho, mas preservando os direitos laborais e a proteção social dos trabalhadores.

Lorena Ferraz C. Gonçalves – mestre em Ciências Sociais UNB

 

A Corrosão do Caráter

Nesse livro, Richard Sennett oferece-nos um instigante ensaio sobre as influências do "capitalismo flexível" no mundo do trabalho e suas repercussões no caráter humano, convidando-nos a realizar uma profunda reflexão sobre as consequências sociais dos novos caminhos trilhados pelos indivíduos na sociedade da informação.

É de conhecimento geral o que a maioria dos consultores de recursos humanos recomenda para os profissionais nos dias de hoje: invista tudo o que puder em sua carreira para garantir sua polivalência no mercado de trabalho, não permaneça em uma mesma empresa ou função por muito tempo e esteja preparado para relações de trabalho temporárias.

Na opinião de Sennett, essas exigências de flexibilidade na atuação profissional e a inexorável fugacidade das relações trabalhistas estariam contribuindo para enfraquecer valores como o compromisso, a confiança e a lealdade, que são fundamentais para a consolidação do caráter humano. Para o autor, a decadência desses valores seria um reflexo do desaparecimento das relações de longo prazo no trabalho e estaria se reproduzindo na vida social, dificultando o estabelecimento de relações mais permanentes com os amigos e a comunidade, além de interferir na formação do caráter das crianças, que não veem mais na rotina diária dos pais as virtudes que eles procuram pregar.

Essas mudanças de comportamento na vida profissional resultam das novas forças que estão impactando o mundo do trabalho na empresa flexível: a reinvenção descontínua das instituições, a especialização flexível de produção e a concentração de poder sem centralização. Reinventar a empresa e flexibilizar a produção tornaram-se uma regra em um mercado em que o que interessa é o retorno em curto prazo para os acionistas e a pronta resposta à demanda do consumidor. Por outro lado, para saciar essa vertiginosa ânsia pelo resultado imediato, tornou-se indispensável acelerar os processos, de forma que foi necessário permitir que funcionários tivessem mais controle sobre suas atividades, controle esse que está sendo concedido sob uma estrita vigilância operada via novas tecnologias de informação, inaugurando formas mais sofisticadas de dominação do que as utilizadas nas empresas no passado.

O paradoxal é que esse novo sistema de dominação está sendo construído sob a insígnia da liberdade. Um dos melhores exemplos disso é a nova forma de organizar o tempo no local de trabalho, que Sennett denomina "flexi-tempo". Este é caracterizado pelo planejamento flexível das jornadas e pelo trabalho virtual, no qual o funcionário deixa de ser monitorado pelo relógio de ponto para ser controlado por meio da tela do computador. Assim, na visão do autor, a proclamada "desburocratização" das empresas é enganadora, pois, apesar do abandono da rigidez e do formalismo típicos da organização burocrática, a sua característica fundamental, que é a dominação e a alienação do trabalhador, está sendo recriada.

Em atividades operacionais, por exemplo, a automação está reinventando a superespecialização taylorista do trabalhador. E o caso da padaria automatizada descrita por Sennett em seu ensaio: para fazer o pão basta saber "clicar" os ícones corretos, o que não requer conhecimento do ofício, mas apenas conhecimentos básicos de Windows. Associada ao "flexi-tempo", essa superespecialização estaria desmantelando as identidades e causando uma profunda indiferença em relação ao trabalho.

Já no ambiente empresarial, os executivos estão sendo expostos, pela necessidade de provar todos os dias a sua competência, a um estado contínuo de vulnerabilidade. Em um mercado em que há poucos ganhadores e no qual o "vencedor leva tudo", as pessoas estão sendo continuamente pressionadas a se superar, apesar do alto risco de fracasso. Nesse "jogo", os funcionários de meia-idade são os que mais sofrem, pois a concentração nas capacidades imediatas leva a uma negação de sua experiência passada, agravada pelos rótulos de aversão ao risco e de inflexibilidade.

Por outro lado, a ética individual do trabalho, personificada pelo "homem motivado", que busca incessantemente provar seu valor moral pelo trabalho, está sendo substituída pela ética do trabalho em equipe. Para Sennett, isso seria uma vitória para a civilização se o trabalho em equipe não estivesse se transformando em um "teatro" em que as aparências e comportamentos são manipulados e o conflito é sistematicamente adiado. Na realidade, o trabalho em equipe veio substituir a vigilância do administrador pela pressão dos colegas, tornando-se uma excelente estratégia para aumentar a produtividade. Assim, as responsabilidades são partilhadas e não há uma figura que simbolize a autoridade, mas a dominação continua permeando as relações entre os indivíduos no trabalho.

Sennett, então, cita Rorthy para demonstrar que o "homem motivado" está sendo substituído pelo "homem irônico": "Richard Rorthy escreve, sobre a ironia, que é um estado de espírito em que as pessoas jamais são 'exatamente capazes de se levar a sério, porque sabem que os termos em que se descrevem estão sujeitos a mudança, sempre sabem da contingência e fragilidade de seus vocabulários finais, e portanto dos seus eus'. Uma visão irônica de si mesmo é a consequência lógica de viver no tempo flexível, sem padrões de autoridade e responsabilidade" (p. 138). E nos provoca: "A clássica ética do trabalho de adiar a satisfação e provar-se pelo trabalho árduo dificilmente pode exigir nossa afeição. Mas tampouco o pode o trabalho em equipe, com suas ficções e fingimentos de comunidade" (p. 139).

Para Sennett, o comunitarismo resulta de fortes laços entre pessoas que tiveram tempo suficiente para enfrentar suas diferenças: a suposição de que todos os membros de uma equipe de trabalho partilham das mesmas motivações não garante uma comunicação efetiva, tornando o trabalho em equipe uma forma frágil de comunidade. Na sua visão, é o enfrentamento do conflito que oferece a base real para unir pessoas de poder desigual e interesses diferentes. Além disso, para que a confiança se estabeleça entre as pessoas, é fundamental que elas sejam necessárias umas às outras.

Ironicamente, ser necessário a alguém é justamente o valor que está sendo depreciado no novo mundo do trabalho, no qual se descartam as pessoas, suas identidades e suas chances de sucesso. Nas palavras de Sennett: "Esse é o problema do caráter no capitalismo moderno. Há história, mas não a narrativa partilhada de dificuldade, e portanto tampouco destino partilhado. Nessas condições, o caráter se corrói; a pergunta 'Quem precisa de mim?' não tem resposta imediata" (p. 175-176).

Assim, para Richard Sennett, o novo capitalismo flexível, em sua ânsia pelos resultados, está gerando uma sociedade impaciente e concentrada apenas no momento imediato, cujos valores amorais contribuem para corroer o caráter humano. E o que é mais inquietante: a substituição da rotina burocrática pela flexibilidade no trabalho não foi acompanhada pela liberdade e pela emancipação do indivíduo, mas pela elaboração de novas formas de dominação.

Apesar de suas constatações pessimistas, Sennett reconhece que não há como negar as novas realidades históricas nem os avanços que ocorreram no mundo do trabalho. Assim, para compreender sua mensagem, o leitor precisa estar atento para o fato de que sua intenção não é fazer um resgate do passado, mas questionar como vamos moldar o nosso futuro em uma sociedade na qual os indivíduos não estão mais seguros de serem necessários aos seus semelhantes. Esse convite para tão indispensável reflexão é suficiente para tornar a leitura desse ensaio estimulante para todos aqueles que procuram compreender as consequências sociais dessa progressiva corrosão do caráter humano.

https://www.fgv.br/rae/artigos/revista-rae-vol-40-num-3-ano-2000-nid-46280/

 

Entrevista para o El País (seleção parcial de trechos)

 

O que aconteceu para que o que nós entendíamos como direitos hoje sejam vistos como privilégios? O capitalismo moderno funciona colonizando a imaginação do que nós consideramos possível. Marx já havia percebido que o capitalismo tinha mais a ver com a apropriação do entendimento do que com a apropriação do trabalho.Facebook é a penúltima apropriação da imaginação: o que víamos como útil agora se revela como uma forma de entrar na consciência das pessoas antes de que possamos agir. As instituições que se apresentavam como libertadoras se transformam em controladoras. Em nome da liberdade, o Google e o Facebook nos levaram pelo caminho em direção ao controle absoluto.

Como detectar o perigo nas novas tecnologias sem se transformar em um paranoico que suspeita de tudo? Devemos nos perguntar sobre o que se apresenta como real. Isso é o que fazem os escritores e os artistas. Eu não suspeito. Suspeitar significa que existe algo oculto e eu não acho que o Facebook tenha algo oculto. Simplesmente não queremos ver. Não queremos enfrentar que o gratuito significa sempre uma forma de dominação.

Em tempos de redes sociais, como preservar a intimidade? O que aconteceu com a Cambridge Analytica é um crime: alguém roubou e vendeu informação privada. Não existe mistério. É um negócio ilegal que camuflaram com conversas sobre proteção de dados. Quem recebeu a informação pagou por ela. Mas o truque é levar uma discussão que não deveria existir à imprensa. Os crimes devem ser punidos.

De que maneiras podem agir hoje os políticos para defender os direitos das pessoas contra as pressões dos poderes econômicos? A história explica. Há 100 anos Theodore Roosevelt decidiu que o Estado deveria romper os monopólios. Era conservador. Mas era o presidente de todos os americanos. O capitalismo tem a tendência a passar com grande facilidade do mercado ao monopólio. E aí, com a repressão da concorrência, começam os grandes problemas, a grande desproteção. Com monopólios, o capitalismo passa de ser o sistema da concorrência a ser o da dominação. Aumentar a diferença salarial entre os ricos e os pobres de tal maneira como ocorre agora é o caminho a todos os populismos. Isso foi Trump. No Reino Unido tivemos o equivalente a Obama em Tony Blair. Pior do que Obama. Obama é um homem de total integridade pessoal. E Blair é somente um político.

Por que o Estado de bem-estar só parece sustentável nos países nórdicos? Eu resisto a essa ideia. Não é preciso ser rico para que esse sistema prospere e se mantenha. Na Colômbia existe com recursos muito menores. Em Botsuana há um modelo justo, ainda que a equidade quando se tem pouco signifique pouco. Bismarck construiu o Estado de bem-estar na Alemanha com más intenções: queria evitar que os trabalhadores se rebelassem. Com o Estado de bem-estar as pessoas se tornam conservadoras. A destruição dessas políticas que ocorre hoje na Espanha é uma tragédia. Sabe que meus pais lutaram na Guerra Civil Espanhola?

Em A Corrosão do Caráter o senhor descreve a falácia de que a flexibilidade trabalhista melhora a vida. Que tipo de caráter produzirão o Uber e o Deliveroo? Vidas sem coluna vertebral. Um caráter cujas experiências não constroem um todo coerente. Algo muito circunscrito a nosso tempo e preocupante porque os humanos precisam de uma história própria, uma coluna vertebral.

 

 

Referências Bibliograficas:
Lorena Ferraz C. Gonçalves - http://jus.com.br/artigos/12530/o-teletrabalho#ixzz3FMuQGSgzhttp://www.trt4.jus.br/portal/portal/trt4/comunicacao/noticia/info/NoticiaWindow?action=2&destaque=false&cod=724303

Alemão, I. e Barroso, Márcia Regina C. O TELETRABALHO NO DOMICÍLIO: O REPENSAR DAS CATEGORIAS TEMPO E ESPAÇO NA ESFERA PRODUTIVA. XV Congresso Brasileiro de Sociologia, 2011.
Rodrigues, Ana Cristina Barcelos. ‘O teletrabalho e o Direito coletivo’. In TELETRABALHO: A TECNOLOGIA TRANSFORMANDO AS RELAÇÕES DE TRABALHO. Dissertação de mestrado: USP, 2011
file:///C:/Users/Convidado/Downloads/TELETRABALHO_A_tecnologia_transformando_as_relacoes_de_trabalho_Integral.pdf

A história de Friederich Engels, site: toda matéria.

 

 

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