Cercados por um contexto de intensas mudanças sociais, econômicas e políticas, os filósofos Karl Marx e Friedrich Engels foram responsáveis por desenvolver em conjunto obras que mudariam o entendimento das relações humanas para sempre. O socialismo, que era uma doutrina política anterior aos pensadores, determinava a urgência de lutar por uma sociedade mais igualitária, haja vista que as mudanças provocadas pela Revolução Industrial estavam levando a classe trabalhadora a uma miséria cada vez mais profunda. Engels e Marx, então, apenas realizaram uma investigação organizada e sistemática do pensamento socialista para elaborar uma teoria econômica que fosse efetiva. O reconhecimento da exploração da classe proletária, provocada pela burguesia – detentora dos meios de produção - foi o principal ponto de partida dessa análise revolucionária da conjuntura.
“O movimento é o modo de existência da matéria”. A
célebre frase dita por Engels sintetiza a ferramenta que deve ser utilizada
para compreender a realidade historicamente construída: a dialética. Nesse
sentido, a história é observada como algo em movimento, tornando-se transitória
e passível de transformações pela ação humana; é justamente por meio dessa
relação dialética entre o ambiente, os seres e os fenômenos naturais que a
cultura e a sociedade constituem o mundo e, ao mesmo tempo, são modeladas por
ele. Em oposição ao idealismo hegeliano, o materialismo histórico e dialético
de Marx e Engels é essencialmente defensor da mudança social. O conceito de
“materialismo” é utilizado para evidenciar a característica da sociedade de
definir-se por sua produção material, enquanto a “dialética” é consequência do
entendimento de que a história da humanidade é a história da luta de classes
opostas, constituindo uma relação dual. Dessa forma, para os teóricos, o
idealismo está em um plano de imobilidade metafísica das classes e, por isso, é
incapaz de concretizar modificações relevantes, o que deve ser superado por uma
teoria que promova exatamente o oposto: uma revolução social que subvertesse a
ordem vigente de poder da classe dominante sobre a classe dominada, permitindo
que o proletariado estabelecesse um governo de uniformidade social.
Avançando historicamente,
novas maneiras de apreender a realidade e examinar o que está por trás das
relações humanas foram surgindo, como as teorias do sociólogo e historiador
norte-americano Richard Sennett. Em sua obra “A corrosão do caráter:
consequências do trabalho no novo capitalismo” o pensador, assim como Marx e
Engels, trilha uma profunda reflexão sobre as influências do capitalismo no
funcionamento do corpo social, referindo-se não ao capitalismo industrial, mas
sim a um sistema informacional e flexível. Sob a suposta necessidade de
polivalência no mercado de trabalho, o comportamento profissional dos
indivíduos está sendo influenciado por forças que atuam através da reinvenção descontínua das instituições, da
especialização flexível de produção e da concentração de poder sem
centralização. Em um mercado em que reinventar a empresa e flexibilizar a
produção são uma regra, o objetivo principal é o retorno a curto prazo e a
pronta resposta à demanda do consumidor.
Logo, para saciar esse crescente desejo pelo
resultado imediato, é necessário acelerar os processos mediante a permissão de
que os funcionários tenham mais controle sobre suas atividades. Esse novo
sistema é construído sob a falsa ideia de aumento da liberdade individual ao
mesmo tempo em que é concedido às empresas uma vigilância ainda mais
problemática, operada via novas tecnologias de informação e precursora de
formas mais sofisticadas de dominação. Essas exigências de flexibilidade na
atuação profissional e a inexorável fugacidade das relações trabalhistas
estariam, de acordo com Sennett, colaborando para o enfraquecimento dos valores
como o compromisso, a confiança e a lealdade, indispensáveis para a consolidação
do caráter humano. Para o autor, a banalização desses princípios é resultado da
superação das relações trabalhistas de longo prazo e estaria disseminando na
vida social a adoção de relações mais voláteis em detrimento das mais
permanentes, definhando a comunidade e interferindo até na formação do caráter
das crianças, que não vêem mais na rotina dos pais a virtude que eles pregam.
Confrontando essas duas abordagens, é possível
perceber que, através de novas perspectivas, a dominação de uma classe sobre
outra ainda se faz presente. Tendo em vista que o capitalismo e suas produções
materiais tem a capacidade de impactar a vida de todos os indivíduos no globo,
é simples notar que os princípios dominantes são propagados como o interesse
comum de todos os membros da sociedade e, por conseguinte, são universalmente
aceitos. Em uma atmosfera de amplo crescimento da globalização e da cooperação
superficial, aplicar a metodologia do materialismo histórico e dialético exige
que seja feito uma análise prévia das condições de vida para determinar se a
comoção revolucionária será suficientemente forte para derrubar as bases
pré-estabelecidas. Entretanto, como afirma Sennett, o tempo presente é
caracterizado pela mudança individual permanente e pela consequente destruição
criativa, que demanda pessoas confortáveis em relação a não saber o que virá ou
a não saber calcular as consequências da mudança. Desse modo, pôr em prática a
superação do modo de produção existente em um meio no qual as forças produtivas
se confundem constantemente, devido à superficialidade, é quase que inviável,
uma vez que a produção material é instável e a despreocupação com os resultados
são um empecilho para o desenvolvimento prático da subversão, que poderia acabar
em demonstrações de dominação ainda mais complexas.
Giovanna Cardozo Silva -
Turma XXXVIII - matutino
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