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segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Em Meio a Teses Antitéticas, Um Ônibus Atrasado e o Cerne do Mal

    O não mais tão jovem Tese acordou de bom humor. O sol entrava pela janela emitindo um feixe de luz que tocava graciosamente a escrivaninha, enquanto pássaros cantavam uma doce melodia. O mindinho passou longe do pé da cama e o café estava perfeito. Comodamente terminou de se aprontar e saiu do apartamento.  O mundo ali fora parecia estar diferente. Não lhe agradava. Não gostava de mudanças...
    Parado no ponto de ônibus, observava, sem ver, o mundo a seu redor, absorto pela melodia que radiava pelos fones no ouvido. Corpos padronizados passavam em sua frente e juntavam-se à espera, folhas de árvores passavam voando guiadas pelo vento em uma dança estonteante, um cachorro passava guerreando com um gato sagaz cuja astúcia e agilidade conferiam-lhe sempre a vitória. Tudo passava. Tudo, exceto o ônibus.
    E com o passar do tempo também esse pareceu parar de passar. Ergueu os olhos entediados e definitivamente sentiu o tempo parar. Aquele único momento em que as folhas pararam no ar gentilmente beijando o vento, e cão e gato se encaravam com algo que não parecia ódio nos olhos. Um único segundo que durara uma eternidade. E quando o segundo passou e foi por fim capaz de ouvir os ruídos emanando dos fones novamente, sentiu o chão deixar seus pés sem alicerce e a sensação de que cairia em meio àqueles olhos. Ela era estonteantemente linda.
    “Prazer. Antítese”- Ela disse, enquanto Tese tentava se recompor e forçava-se a parar de olhá-la como se fosse algum tipo de psicopata, ou talvez (e melhor descrevia) um “demente”. Retribuiu o cumprimento, buscando com dificuldade as palavras para se apresentar, mas conforme a conversa caminhava, mais facilmente as palavras lhe saltavam da boca. Não precisou muito tempo para perceberem que eram completos opostos. A conversa fluía e tudo estava bem, mas era visivelmente evidente o quanto eram diferentes.
    Passado mais um segundo, o ônibus apontava virando a esquina. O silêncio pairava em meio aos dois, que se encaravam, tal qual cão e gato, com algo que não era ódio nos olhos. Mais uma vez o segundo parou e ela o beijou. Durante aquele materialismo dialético, ambos perceberam a ironia da vida. Nem sempre ideias contrarias são danosas e prejudiciais. Muitas vezes o são, e dilaceram umas às outras sempre tentando se impor. Fazer valer a sua própria verdade, eliminando a concorrência. Mas o fato é que duas ideias convergentes nunca levaram a humanidade a lugar algum. O motor que move o mundo é conflituoso e independente de se o gato odeia o cão, o que importa é a presença do conflito. Ideias diferentes, lábios diferentes, se tocando gentil ou selvagemente, sintetizando um novo mundo.
    A tese do Capital parece odiar a antítese Socialista. Talvez seja hora daquele segundo duradouro paralisar o tempo, enquanto Capitalismo e Socialismo se encaram com algo nos olhos. Um toque gracioso de lábios e um entrelaçar de almas, sintetizando a eficiência capitalista com a filosofia ideal do bem social socialista. Mas talvez o homem seja ganancioso demais e prefira vencer uma guerra aniquilando um adversário a estabelecer um acordo com um aliado. Talvez seja otimismo demais pensar que ambas as teses sejam assim tão completamente diferentes. No final, tudo acaba se resumindo à natureza do homem. E um lobo faminto precisa comer.
    Um certo Marx acreditava que somente através da revolução armada seríamos capazes de evoluir (sob a perspectiva darwinista) enquanto sociedade. Mas feita a revolução proletária, realizado o aspecto braçal do serviço, quais mentes seriam responsáveis pela manutenção da sociedade instaurada? De uma forma ou de outra, acaba-se sempre dependente da boa-fé de um grupo seleto de indivíduos. Indivíduos por natureza corruptíveis e corruptos. O sistema capitalista se adaptou tão bem na sociedade hodierna porque reflete o espírito do ser humano: poder e violência. Não é o sistema capitalista, o monstro apocalíptico que precisa ser decapitado. O cerne de todo o mal que assola a humanidade, ontem, hoje e amanhã, sempre foi, é e será a própria humanidade.

Abner Santana de Oliveira. 1º Ano, Direito-Noturno

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