Tiquetaqueando
Para muitos aquele seria
apenas um velho relógio medieval, mas para a mente perceptiva de uma cientista,
de um poeta e de um fracassado candidato à presidência dos Estados Unidos ali estava
um modelo cartesiano do cosmos, um símbolo da ruptura do homem com a natureza,
uma perfeita metáfora da mente mecanizada dos homens contemporâneos.
Sob o constante tic-tac mecânico as engrenagens
da velha máquina se conectavam com perfeição, cada peça exercendo
exaustivamente a sua função e formando um todo que resultava em seu objetivo
primeiro de contabilizar o tempo. Para Descartes essa seria a metáfora perfeita
para o homem e para a natureza, seríamos apenas uma pequena engrenagem de uma imensa
e primordial máquina. Dessa forma, caberia à ciência cartesiana desvendar a
função de cada peça e entender com profundidade cada conexão. Seria, portanto,
contraproducente tentar entender o todo, o sentido das infinitas conexões e suas
reais implicações.
Apesar
dos mais de trezentos anos de existência o cartesianismo ainda mostra-se
preponderante no pensamento científico contemporâneo. Empreende-se diariamente
uma busca fervorosa pelo entendimento da mais minúscula engrenagem da máquina
universal e a criação tornou-se um fenômeno puramente comercial, pois
produzimos com a única finalidade de vender e gerar um capital contínuo e
incessante. Entretanto, o sentido dessas inovações perdeu-se na minuciosidade da
mente humana. Produz-se com o único objetivo de produzir, pesquisa-se para entender
particularidades, inova-se para
fomentar o mercado; e dessa forma seguimos em um círculo vicioso que
percorremos incessantemente, sem, contudo, entender o sentido dessa caminhada.
Esse homem “relógio”, mecanicista e
produtivista é incapaz de entender as reais mazelas da contemporaneidade. Caminha-se,
portanto, deslocando os problemas aleatoriamente, intervindo quando alguma peça
apresenta um problema que possa prejudicar o funcionamento da máquina e criando,
incessantemente, com a única função de criar. Enquanto continuarmos cultivando
esse pensamento robotizado, seremos sempre essas máquinas humanas “tiquetaqueando”
como um velho relógio medieval.
José Roberto Bernardo Bettarello - 1º ano noturno.
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