As disposições formais contidas na nossa Constituição
vigente foram um grande avanço para o Estado brasileiro. Por meio da elaboração
de normas gerais e unívocas que regulamentem racionalmente a maior quantidade
de casos possíveis de uma matéria do direito, é possível criar ordenamentos
jurídicos sistematizados com base na “interpretação lógica do sentido tanto das
disposições jurídicas quanto do comportamento juridicamente relevante” (WEBER,
Max. Economia e sociedade). No entanto, a generalidade das regras carregam
consigo uma dificuldade: surgimento de lacunas na lei. Além da morosidade no
que se refere a positivação de novos ordenamentos jurídicos.
Por exemplo: o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e
o Superior Tribunal de Justiça, por meio da jurisprudência, julgaram os pedidos
de: cirurgia de transgenitalização, alteração do registro civil – para adequar
a nova realidade - e modificação do sexo masculino para o sexo feminino, por
parte de um cidadão transexual da cidade de Jales.
Pois bem, o código civil, em seu artigo 13, prevê: “Salvo
por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando
importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons
costumes.”. Entretanto, como defendido pelo juiz da comarca de Jales, a
IV Jornada de Direito Civil interpreta o artigo 13 da seguinte forma: “O art.
13 do Código Civil, ao permitir a disposição do próprio corpo por exigência
médica, autoriza as cirurgias de transgenitalização, em conformidade com os
procedimentos estabelecidos pelo Conselho Federal de Medicina, e a consequente
alteração do prenome e do sexo no Registro Civil”.
Mesmo com a generalidade do artigo, não foi possível captar
todas as possíveis situações que envolvem o direito a personalidade. Dessa
forma, a dificuldade em promover um julgamento dinâmico e menos burocrático,
encontra-se no enquadramento do caso de mudança de sexo na lacuna do artigo (restringindo-me
ao universo jurídico).
As
brechas nos artigos explicitam-se devido ao fato do Direito ser um organismo
vivo: todo o Direito não se acha apenas na lei, reside na dinâmica da
sociedade, pulsa no cotidiano, vibra nas reivindicações do povo. Weber já enxergava
essa dinâmica no direito, quando veio afirmar que existe a dialética das
condições formais e materiais. Novas condições materiais brotam com a legitimação
de direitos naturais não vistos até então, com força para promover uma ruptura
na condição formal.
A positividade da lógica formal é imprescindível para
assegurar direitos já adquiridos, além de disponibilizar o acesso a todos.
Todavia, restringir todo o fenômeno jurídico a leis redigidas em páginas, e
assassinar a função imanente do direito: justiça. Como o sociólogo jurídico
Eugen Ehrlich afirma:” Querer encerrar todo o direito de um tempo ou de um povo
nos parágrafos de um código é tão razoável quanto querer prender uma correnteza
numa lagoa”
Giovani Rosa - 1º Noturno
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