Primeiramente, antes de entrar no
tema propriamente dito, e tentar chegar a uma conclusão que possa servir de
resposta para o problema levantado, necessitamos fazer algumas considerações.
Tais considerações estão diretamente ligadas ao fato de que entraremos em
questões que estão para além da linguagem científica do direito e pertencem ao
campo da jurisfilosofia e que, portanto, estão longe de serem encerradas. Feita
essa ressalva, passemos então a tratar do problema:
Segundo,
as ideias de Durkheim as sociedades ditas selvagens seriam produtoras de um
direito vingativo, que significaria o início do que entendemos hoje por direito
penal. Já as sociedades “modernas”, fruto da divisão do trabalho, são o berço
do direito restitutivo. Direito esse
caracterizado mais pela técnica do que pela passionalidade, e que, portanto,
busca “curar” e inserir o indivíduo patológico de volta na sociedade ao invés
de executá-lo.
Tal
comportamento é bastante sensato quando o analisamos por meio de uma
perspectiva racional, pois inserir o cidadão é muito mais satisfatório do que
perder uma mão de obra tão especializada, e também parece ser bastante justo
caso olhemos sobre uma perspectiva iluminista que povoa as ideias éticas que
são o sustentáculo do que temos hoje de direitos humanos.
Porém
o lado científico não é aquele que está na maioria da população quando ela
procura um advogado, o mistério público ou ainda a defensoria. Muitas vezes são pessoas que pouco ou nada
conhecem das leis formais de seu país. Dizer com precisão o que tais indivíduos
querem, se não for impossível, necessitaria de um estudo, extremamente
abrangente, dos comportamentos biológicos, psicológicos e sociológicos de toda
a população, o que é impossível para o autor do presente texto. Todavia, parece
ser bastante legítimo tratar essa ideia que povoa o imaginário das populações
como a ideia de “justiça”. Pois é assim, que os grandes autores a respeito da
ética e da moral e, também, os que falam em nossa sociedade por elas (ética e
moral), denominam ou tentam denominar tal sentimento, desde os renomados
clássicos Platão e Aristóteles, até os muito peculiares e, com certeza, nem um
pouco clássicos Edir Macedo e José Luis Datena.
Nessa
situação o que o estudioso das leis (advogados, defensores públicos,
promotores, juízes e desembargadores) deve fazer? Caso ele olhe pela
perspectiva científica encontrará, com mais facilidade, dois caminhos: o
primeiro é agir como um técnico e utilizar o direito como uma ciência da exata
maneira que o jurista austríaco Kelsen a propõe em sua Teoría General Del
Estado, pois para ele o fato fundamental das normas jurídicas é elas serem
válidas e não justas; o segundo será o de utilizar o direito como uma
ferramenta de ativismo e transformação para a sociedade, notando-se que, caso
se prossiga dessa maneira, os administradores do direito, assim como as
ciências bilógicas trabalham para desenvolver novas curas para as novas
doenças, irão buscar em toda a sua hermenêutica a fundamentação de novas leis e
jurisprudências para o combate a um novo tipo de infração.
Embora,
o segundo caminho pareça ser o mais democrático e também o que, provavelmente,
Durkheim iria privilegiar, carrega em si problemas que podem transformá-lo em
uma faca de dois gumes.
O
primeiro desses problemas é: alguns cursos de direito promovem poucos estudos
científicos para o direito. As motivações são pequenas para os alunos, e isso os
leva, assim como a grande maioria dos professores, a não inventarem novos
saberes e sim apenas aplicar o que já fora criado. Felizmente, para tal
problema podemos encontrar uma resposta satisfatória, caso uma reforma no
ensino do direito dentro de algumas das faculdades seja realizada.
O
segundo, e mais perigoso é: nem sempre é tarefa do sistema jurídico inventar
normas, e sim utilizá-las. Olhando sobre essa perspectiva, o jurídico acaba
avançando sobre as matérias do legislativo, causando uma quebra na harmonia da
tão renomada teoria dos pesos e contrapesos. A democracia, em consequência,
estaria em perigo, pois um dos três poderes estaria ascendendo sobre os outros,
e, uma vez que a história está lotada de exemplos perturbadores de grupos que
ascenderam ao poder, é natural e também necessário destacar de maneira bem
clara essa questão. Há aqui também, uma maneira de responder a esse problema.
Ela consiste na seguinte ideia: o sistema legislativo esta tão a mercê do
capital e de suas influências (da manipulação de instancias externas, as quais
sustentam parte considerável das cadeiras do legislativo em todas as suas
instâncias), que o legislativo estaria, ao invés de cumprir sua função,
travando as engrenagens do sistema normativo, e que, nesse sentido, o
judiciário, por meio, de seu ativismo estaria dando uma resposta para fazer o
sistema voltar a andar.
O
terceiro e último problema, facilmente, visível é: por mais que o ativista do
direito consiga separar seu lado racional de seu lado passional, ele muitas
vezes será influenciado por essa passionalidade. E tal ação poderá resultar em
sentenças “tendenciosas”, muito questionáveis dentro da democracia que prima
para tutelar à liberdade e à igualdade; e também para os próprios filósofos
clássicos que exaltavam o caráter exterior das leis, indiferentes as paixões
humanas (como fica claro com Platão, dentro de seu texto A República, quando
diz que é melhor ser governado por leis do que por governantes). Para esta
última problemática, também, é possível esboçar uma solução: na medida que, os
indivíduos são diferentes dentro de suas próprias características e possuem
legitimidade para serem assim, porque, afinal são livres dentro das
democracias, é tarefa do judiciário igualar, também por meio de seu ativismo, todos
os indivíduos.
Essas
são as saídas científicas (ao menos, as mais facilmente identificáveis) que o
profissional do direito pode utilizar quando for questionado pela parte que lhe
pede ajuda. Entretanto, ele também pode optar por se utilizar de respostas
pertencentes ao campo da metafísica, recorrendo a clássicas ideias da
metafísica[1]
como o dualismo do “bem” e do “mal”. Infelizmente, é inviável para o autor do
presente texto chegar a uma conclusão sobre tal atitude, pois como Wittgenstein
aponta, tal conclusão está para além dos limites da linguagem.
Por
fim por mais que procuremos encontrar uma resposta para a pergunta proposta no
título desse texto, mais nos afundaremos no campo da metafísica e menos claros
e inteligíveis seremos. O fato é que o homem ainda esta longe de encontrar essa
melhor saída para a ideia de justiça. O que podemos dizer é que algumas portas
já foram mostradas, outras estão escondidas fora da linguagem, e ainda existem
outras para serem descobertas, mas dizer qual abrirá o caminho mais ameno,
continuará um dos mistérios mais presentes no direito.
[1] Quando, neste texto, falamos de metafísica estamos
nos referindo à metafísica clássica (iniciada, principalmente, com Platão e
Aristóteles) e continuada até o início da filosofia contemporânea. Nossa
posição geral, como , talvez, já tenha ficado claro, é de adotar uma crítica de
tal metafísica (como aquela feita pela filosofia analítica), e tentar, como
parece ser o caso de Durkheim, construir uma reflexão sociológica (e
filosófica) que se embase, o máximo possível, de análises de fatos empíricos.
BIBLIOGRAFIA:
BIBLIOGRAFIA:
ARISTÓTELES. Ética a
Nicômaco in ARISTÓTELES. Aristóteles:
obras escolhidas. São Paulo: Abril Cultural, 1973.
_____. Política. trad. António Campelo Amaral e
Carlos de Carvalho Gomes. edição bilíngüe. Lisboa: Vega, 1998.
DURKEHEIM, E. As regras do método sociológico. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
_____. Da divisão social do trabalho. São Paulo: Martins fontes, 2010.
KELSIN, H. Teoría General del Estado. Madri: Comares, 2002.
PLATÃO. A República. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011
WITTGENSTEIN, L. Tractatus Logico-Philosophicus. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2010.
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