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domingo, 16 de setembro de 2012

Alguma Justiça é melhor que nenhuma (?): A Matemática do Direito Restitutivo.



             Primeiramente, antes de entrar no tema propriamente dito, e tentar chegar a uma conclusão que possa servir de resposta para o problema levantado, necessitamos fazer algumas considerações. Tais considerações estão diretamente ligadas ao fato de que entraremos em questões que estão para além da linguagem científica do direito e pertencem ao campo da jurisfilosofia e que, portanto, estão longe de serem encerradas. Feita essa ressalva, passemos então a tratar do problema:
            Segundo, as ideias de Durkheim as sociedades ditas selvagens seriam produtoras de um direito vingativo, que significaria o início do que entendemos hoje por direito penal. Já as sociedades “modernas”, fruto da divisão do trabalho, são o berço do direito restitutivo.  Direito esse caracterizado mais pela técnica do que pela passionalidade, e que, portanto, busca “curar” e inserir o indivíduo patológico de volta na sociedade ao invés de executá-lo.
            Tal comportamento é bastante sensato quando o analisamos por meio de uma perspectiva racional, pois inserir o cidadão é muito mais satisfatório do que perder uma mão de obra tão especializada, e também parece ser bastante justo caso olhemos sobre uma perspectiva iluminista que povoa as ideias éticas que são o sustentáculo do que temos hoje de direitos humanos.
            Porém o lado científico não é aquele que está na maioria da população quando ela procura um advogado, o mistério público ou ainda a defensoria.  Muitas vezes são pessoas que pouco ou nada conhecem das leis formais de seu país. Dizer com precisão o que tais indivíduos querem, se não for impossível, necessitaria de um estudo, extremamente abrangente, dos comportamentos biológicos, psicológicos e sociológicos de toda a população, o que é impossível para o autor do presente texto. Todavia, parece ser bastante legítimo tratar essa ideia que povoa o imaginário das populações como a ideia de “justiça”. Pois é assim, que os grandes autores a respeito da ética e da moral e, também, os que falam em nossa sociedade por elas (ética e moral), denominam ou tentam denominar tal sentimento, desde os renomados clássicos Platão e Aristóteles, até os muito peculiares e, com certeza, nem um pouco clássicos Edir Macedo e José Luis Datena.
            Nessa situação o que o estudioso das leis (advogados, defensores públicos, promotores, juízes e desembargadores) deve fazer? Caso ele olhe pela perspectiva científica encontrará, com mais facilidade, dois caminhos: o primeiro é agir como um técnico e utilizar o direito como uma ciência da exata maneira que o jurista austríaco Kelsen a propõe em sua Teoría General Del Estado, pois para ele o fato fundamental das normas jurídicas é elas serem válidas e não justas; o segundo será o de utilizar o direito como uma ferramenta de ativismo e transformação para a sociedade, notando-se que, caso se prossiga dessa maneira, os administradores do direito, assim como as ciências bilógicas trabalham para desenvolver novas curas para as novas doenças, irão buscar em toda a sua hermenêutica a fundamentação de novas leis e jurisprudências para o combate a um novo tipo de infração.
            Embora, o segundo caminho pareça ser o mais democrático e também o que, provavelmente, Durkheim iria privilegiar, carrega em si problemas que podem transformá-lo em uma faca de dois gumes.
            O primeiro desses problemas é: alguns cursos de direito promovem poucos estudos científicos para o direito. As motivações são pequenas para os alunos, e isso os leva, assim como a grande maioria dos professores, a não inventarem novos saberes e sim apenas aplicar o que já fora criado. Felizmente, para tal problema podemos encontrar uma resposta satisfatória, caso uma reforma no ensino do direito dentro de algumas das faculdades seja realizada.
            O segundo, e mais perigoso é: nem sempre é tarefa do sistema jurídico inventar normas, e sim utilizá-las. Olhando sobre essa perspectiva, o jurídico acaba avançando sobre as matérias do legislativo, causando uma quebra na harmonia da tão renomada teoria dos pesos e contrapesos. A democracia, em consequência, estaria em perigo, pois um dos três poderes estaria ascendendo sobre os outros, e, uma vez que a história está lotada de exemplos perturbadores de grupos que ascenderam ao poder, é natural e também necessário destacar de maneira bem clara essa questão. Há aqui também, uma maneira de responder a esse problema. Ela consiste na seguinte ideia: o sistema legislativo esta tão a mercê do capital e de suas influências (da manipulação de instancias externas, as quais sustentam parte considerável das cadeiras do legislativo em todas as suas instâncias), que o legislativo estaria, ao invés de cumprir sua função, travando as engrenagens do sistema normativo, e que, nesse sentido, o judiciário, por meio, de seu ativismo estaria dando uma resposta para fazer o sistema voltar a andar.
            O terceiro e último problema, facilmente, visível é: por mais que o ativista do direito consiga separar seu lado racional de seu lado passional, ele muitas vezes será influenciado por essa passionalidade. E tal ação poderá resultar em sentenças “tendenciosas”, muito questionáveis dentro da democracia que prima para tutelar à liberdade e à igualdade; e também para os próprios filósofos clássicos que exaltavam o caráter exterior das leis, indiferentes as paixões humanas (como fica claro com Platão, dentro de seu texto A República, quando diz que é melhor ser governado por leis do que por governantes). Para esta última problemática, também, é possível esboçar uma solução: na medida que, os indivíduos são diferentes dentro de suas próprias características e possuem legitimidade para serem assim, porque, afinal são livres dentro das democracias, é tarefa do judiciário igualar, também por meio de seu ativismo, todos os indivíduos.
            Essas são as saídas científicas (ao menos, as mais facilmente identificáveis) que o profissional do direito pode utilizar quando for questionado pela parte que lhe pede ajuda. Entretanto, ele também pode optar por se utilizar de respostas pertencentes ao campo da metafísica, recorrendo a clássicas ideias da metafísica[1] como o dualismo do “bem” e do “mal”. Infelizmente, é inviável para o autor do presente texto chegar a uma conclusão sobre tal atitude, pois como Wittgenstein aponta, tal conclusão está para além dos limites da linguagem.
            Por fim por mais que procuremos encontrar uma resposta para a pergunta proposta no título desse texto, mais nos afundaremos no campo da metafísica e menos claros e inteligíveis seremos. O fato é que o homem ainda esta longe de encontrar essa melhor saída para a ideia de justiça. O que podemos dizer é que algumas portas já foram mostradas, outras estão escondidas fora da linguagem, e ainda existem outras para serem descobertas, mas dizer qual abrirá o caminho mais ameno, continuará um dos mistérios mais presentes no direito.
             




[1] Quando, neste texto, falamos de metafísica estamos nos referindo à metafísica clássica (iniciada, principalmente, com Platão e Aristóteles) e continuada até o início da filosofia contemporânea. Nossa posição geral, como , talvez, já tenha ficado claro, é de adotar uma crítica de tal metafísica (como aquela feita pela filosofia analítica), e tentar, como parece ser o caso de Durkheim, construir uma reflexão sociológica (e filosófica) que se embase, o máximo possível, de análises de fatos empíricos.

BIBLIOGRAFIA:

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco in  ARISTÓTELES. Aristóteles: obras escolhidas. São Paulo: Abril Cultural, 1973.
_____. Política. trad. António Campelo Amaral e Carlos de Carvalho Gomes. edição bilíngüe. Lisboa: Vega, 1998.

DURKEHEIM, E. As regras do método sociológico. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
_____. Da divisão social do trabalho. São Paulo: Martins fontes, 2010.
KELSIN, H. Teoría General del Estado. Madri: Comares, 2002.
PLATÃO. A República. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011
WITTGENSTEIN, L. Tractatus Logico-Philosophicus. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2010.

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