O capítulo "Feuerbach: Oposição entre a concepção materialista e a idealista", da obra A Ideologia Alemã, marca um momento decisivo na formulação do pensamento de Karl Marx e Friedrich Engels. Nesse trecho, a filosofia dos autores surge como uma crítica radical às tradições idealistas da filosofia alemã, se distanciando e rompendo tanto com o idealismo hegeliano predominante como com o materialismo considerado por eles ainda abstrato e contemplativo de Feuerbach, propondo, assim, uma nova forma de compreender o sujeito, a história e a realidade social, centrada na prática social e nas condições materiais da existência como o verdadeiro fundamento da consciência humana: o materialismo histórico.
Para os autores, mesmo reconhecendo em Feuerbach um avanço em relação a Hegel, ao colocar a natureza no lugar do espírito absoluto. Contudo, identificam limites fundamentais em sua filosofia: apesar de se proclamar materialista, Feuerbach permanece preso a uma visão abstrata do ser humano, concebido fora do contexto histórico e das relações sociais concretas, sendo considerado "contemplativo", por compreender o mundo apenas como objeto de interpretação e não como resultado da ação prática transformadora dos sujeitos e sua história. Segundo Marx e Engels, a realidade social não pode ser explicada apenas pela consciência ou por ideias e especulações, como querem os idealistas, defendendo, desse modo, que é a vida material dos homens, a realidade concreta, suas condições econômicas e suas práticas produtivas que determinam a consciência do indivíduo e a sua compreensão do mundo.
Isso pode ser facilmente observado no cotidiano: uma pessoa desempregada ou vivendo em condições de pobreza tende a apresentar uma percepção do mundo, de si mesma e de seu futuro profundamente afetada por essa realidade concreta. Da mesma forma, o acesso à educação, saúde e moradia, ou seja, a realidade vivenciada impacta diretamente na formação da identidade e dos ideias dos indivíduos, visto que, vivem sob condições materiais limitadas. Assim, essa inversão metodológica coloca a prática social dos homens como ponto de partida da análise, inseridos em determinadas condições materiais de existência, sendo o núcleo da oposição entre a concepção materialista histórica e a concepção idealista pregada por Hegel.
Ademais, a crítica à ideologia realizada pode ser aplicada, por exemplo, à crença amplamente difundida na meritocracia, uma vez que, ideias como “quem quer consegue” ou “basta esforço e dedicação para vencer” ignoram completamente as condições materiais de origem das pessoas como desigualdades raciais, de classe e de gênero. Com isso, essa visão idealista desconsidera o fato que milhões de cidadãos vivem sem acesso a oportunidades básicas, e ainda assim são responsabilizados individualmente por sua condição social. Segundo Marx e Engels, essa é justamente a função da ideologia: mascarar as verdadeiras causas materiais e reais dos fenômenos sociais, afim de manter a ordem existente propagada pela burguesia e pela elite.
Portanto, torna-se notório a importância dos ideais de Marx e Engels, uma vez que, ao rejeitarem o materialismo contemplativo e o idealismo hegeliano, propondo um materialismo histórico e dialético, os autores oferecem uma nova chave de leitura da realidade social, centrada na prática, a história e as condições materiais como elementos centrais, e que permanece atual e relevante, permitindo compreender os mecanismos que estruturam a sociedade, revelando contradições e injustiças muitas vezes encobertas por discursos ideológicos. No cotidiano, isso se traduz na percepção crítica da desigualdade social e das formas de dominação simbólica. Desse modo, o pensamento marxista se mantém como uma ferramenta potente para a análise e compreensão mundo contemporâneo, seguindo um viés histórico e concreto.
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