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segunda-feira, 10 de abril de 2023

 


Crime e castigo: a consciência coletiva, a punição e a valorização do saber eurocêntrico nas sociedades modernas


O sociólogo francês Émile Durkheim, é considerado por muitos pai da sociologia por formular as regras do método sociológico e emancipar a Sociologia como uma ciência autônoma. Ele é um sociólogo funcionalista por compreender que os sentimentos, ações e pensamentos são exteriores ao indivíduo, ou seja, o ser é moldado por uma consciência coletiva e seus atos não podem ser isolados do corpo social. Além disso, o autor discorre sobre o conceito de “fato social”, no qual, segundo ele, seria todos os elementos exteriores ao homem, mas que coordena suas ações e pensamentos e, de acordo com o sociólogo, tais condutas são dotadas de uma força coercitiva. 


A priori, é importante ressaltar a coerção social como maneira de manutenção dos “fatos sociais”. O livro  “A letra escarlate”, escrito por  Nathaniel Hawthorne, retrata uma comunidade puritana de Boston do século XVII, na qual vive uma jovem chamada Hester Prynne que acaba gerando uma criança fruto de um relacionamento fora do casamento. Por se recusar a dizer o nome do pai da criança, a jovem Hester é julgada pela comunidade como adúltera e obrigada a andar com a letra “A” bordada em sua roupa, como forma de punição por sua atitude “imoral”. Apesar de ser uma narrativa ficcional, o livro se relaciona de forma análoga à sociedade atual, haja vista que todo ato fora da mentalidade coletiva é julgado e o indivíduo que o cometeu, muitas vezes é excluído do corpo social e os outros acabam encarando a situação como o que não devem fazer. Deste modo, o “fato social” acaba sendo “indestrutível”, pois ao mesmo tempo que ele diz o que deve ser feito, ele também cria na mentalidade da sociedade a necessidade de punição caso ele não seja seguido.


Ademais, é interessante analisar a ligação entre o pensamento de Durkheim com o de Foucault. Apesar de ser um filósofo do século XX, Michel Foucault relaciona-se com o pensamento do sociólogo francês, tendo em vista o seu livro “Vigiar e Punir”, no qual ele discorre sobre o conceito de “Microfísica” e “Macrofísica do Poder”, um poder exercido pelo o que ele chamou de “sociedade disciplinar”, ou seja, um poder realizado em pequenos núcleos ou por instituições sociais com o objetivo de transformar o indivíduo em um “corpo dócil”. As escolas, igrejas, fábricas, cadeias, os quartéis e hospitais seriam instituições disciplinares que aplicam a disciplinarização dos corpos. Além disso, nesse mesmo livro, Foucault discorre sobre a ideia da arquitetura de uma sociedade ser projetada de forma a vigiar todos os cidadãos e, dessa forma, punir qualquer desvio de conduta.  Nesse sentido, o autor dialoga com as ideias de Durkheim, já que segundo o sociólogo francês, os seres sociais têm suas ações guiadas por uma consciência coletiva e que o desvio desses “fatos sociais” é observado e punido pela sociedade. Além disso, Durkheim afirma que  o papel da educação é forjar o ser social, lhe incutindo visões e comportamentos aos quais não se chegaria espontaneamente, o que para Foucault seria função das instituições sociais. Assim, apesar de serem pensadores de séculos diferentes, é possível encontrar o posicionamento de Durkheim no pensamento de Foucault. 


Por fim, é necessário frisar o caráter dominador do “fato social”, ou seja, como os comportamentos de uma sociedade são guiados pelo pensamento das classes dominantes. Segundo a escritora Grada Kilomba em seu livro "Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano”, o pensamento válido nas universidades são aqueles formulados por uma lógica eurocêntrica, ou seja, quem dita o que é verdadeiro e valida o conhecimento são pessoas brancas. Nesse sentido, qualquer forma de saber que não se enquadre nessa ordem eurocêntrica acaba sendo rejeitado e, dessa forma, exclui pessoas negras das universidades, por não considerarem ciência a forma de enxergarem a realidade. Deste modo, é possível concluir que os “fatos sociais” e a maneira que a maioria das pessoas enxergam o mundo são derivados de uma percepção das classes dominantes e acaba tendo por fim a marginalização das minorias. 


Em suma, é possível perceber que a consciência coletiva é fator fundamental nas ações, pensamentos e sentimentos de cada indivíduo. Além disso, essa consciência atinge de forma mais severa as minorias sociais e acaba sendo uma ferramenta de dominação. Deste modo, apesar de Durkheim ser um sociólogo do século XIX, seu pensamento se encaixa na atualidade, haja vista o racismo estrutural, o patriarcalismo e outras estruturas dominantes que permeiam a sociedade atual e faz com que sejam reproduzidas de forma “natural” vários tipos de preconceitos.


Nome: Gabriela Cristina de Freitas Abreu

Primeiro no de Direito Noturno

RA: 231220278






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