O julgamento da ADI 4.277 pelo STF fez 10 anos em 2021 e ainda gera polêmicas em vista do ativismo judicial e pela natureza da decisão. A Ação Direta de Inconstitucionalidade foi julgada procedente por unanimidade e prevê o reconhecimento de direitos na união homoafetiva, já que, conforme o entendimento do STF, a união homoafetiva se qualifica também como entidade familiar e assim decorrem direitos e deveres de igual maneira às uniões estáveis entre homem e mulher.
Ainda que unânime, a decisão suscita um conflito que já é bastante recorrente no debate judiciário, sendo este entre a literalidade da lei e a ratio legis da norma. Utilizando-se de uma interpretação clássica que analisa elementos textuais ou a análise literal, identifica-se um conflito claro no julgamento, já que a legislação prevê literalmente a união estável entre homem e mulher. Porém, caso se utilize a interpretação que preze pela análise da finalidade da norma, mais facilmente se chega à conclusão do STF, dado os princípios da lei.
Após essa contextualização e partindo para a visão sociológica pode-se verificar que para Pierre Bourdieu, que caracteriza o espaço dos possíveis, a decisão do Supremo Tribunal Federal pode ser caracterizada na concepção de um espaço possível para os casais homoafetivos, que antes era marcado pelo preconceito e pela discriminação, e sendo agora garantido um espaço possível para essa minoria de maior proteção legal e menor marginalização, embora diversos avanços devem ainda ser feitos para garantir plenitude jurídica e social a esses grupos.
Ademais, facilmente se vê nesse caso a perspectiva de Antoine Garapon, que caracteriza a judicialização como fenômeno político social, já que é fruto das lutas e demandas sociais da comunidade LGBTQIA+, as quais levaram a essa dita judicialização. Ainda segundo Garapon, essas evoluções na positivação são necessárias e papel do juiz, cabendo ao magistrado não somente julgar posteriormente, mas também fazer um direito para o futuro, ou seja, uma antecipação.
Assim sendo, o julgado revela de fato um “ativismo judicial” que, entretanto, segundo a visão do Ministro Luís Roberto Barroso não é necessariamente ruim, visto que garante direitos que já deveriam estar previstos na Constituição e traz avanços sociais.
Por fim, pode-se concluir que: o direito tutelado em questão é o da união homoafetiva e, dada a natureza da decisão, seria dificilmente adquirido por vias legislativas e políticas, dado que existem diversos movimentos políticos e sociais de setores mais conservadores que barram essas pautas. Logo, percebe-se que existe uma antecipação na decisão expressa do julgado, já que, garante dignidade humana, a qual deve ser balizada pela Constituição e efetivada pelo judiciário por meio do STF. Além disso, também representa um aprofundamento da democracia, já que retira dos indivíduos a força do “julgamento” e a passa para o Estado, o qual se preocupa, ou deveria se preocupar, com a democracia.
Dito isso, trago uma citação de Ingeborg Maus que esclarece esse posicionamento: “passa a escapar de qualquer mecanismo de controle social - controle ao qual normalmente se deve subordinar toda instituição do Estado em uma forma de organização política democrática”.
João Pedro Menon
1º Direito Matutino
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