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segunda-feira, 20 de abril de 2020

Direito de indagação ao cientificismo e suas complicações


Observa-se, hodiernamente, um cenário desafiador em âmbito global: com o infeliz agravamento da situação envolvendo o vírus SARS-CoV-2, fez emergir duas problemáticas, sendo, tanto reflexões acerca da extensão do direito de confrontar a ciência em tempos tão delicados, bem como, as consequências da adoção desta postura para a solução da questão. Perante essa conjuntura, proponho a realizar minhas observações com base em um artigo publicado pelo filosofo Edward Feser, nomeadamente, “Blinded by Scientism”, defendo, portanto, o direito de questionamento do cientificismo, termo que define a corrupção que tem sofrido a ciência. Posteriormente faço ressalvas em relação a esse posicionamento, de modo a tentar contornar seus possíveis riscos para com a situação envolvendo a pandemia.
O frade Guilherme de Ockham foi a raiz do empirismo, corrente filosófica que mais tarde seria epicentro das revoluções cientificas dos séculos XVII e XVIII, e que hoje em dia resulta no cientificismo. O cientificismo é uma concepção filosófica de ordem positivista que afirma a superioridade da ciência sobre todas as outras formas de compreensão da realidade, e que todo conhecimento verdadeiro só pode ser expresso pelo conhecimento cientifico. Esse pressuposto, tira o monopólio do conhecimento das mãos dos antigos clérigos e passa para os cientistas acadêmicos, toda via, um princípio continua, a impossibilidade de questionamento. Isso acontece, pois, os conhecimentos científicos “imediatos” – por exemplo, os gerados durante a pandemia, que necessitam de urgência – são concebidos a partir da aceitação pela maioria da comunidade cientifica, mesmo que existam hipóteses e teses de outros cientistas que conflitam com aquelas aceitas em sentido prévio pela maioria, fato que pode gerar situações preocupantes. Concomitantemente, as pertinentes críticas de Edward Feser em relação a supremacia do cientificismo se tornam essenciais.
”Apesar da pose de racionalidade de seus adeptos, o cientificismo tem um problema sério: ele é auto-refutante ou trivial. Tome o primeiro aspecto desse dilema. A afirmação de que o cientificismo é verdadeiro não é em si uma afirmação científica, não é algo que possa ser estabelecido utilizando métodos científicos. De fato, até mesmo que a ciência seja uma forma racional de investigação (e ainda menos a única forma racional de investigação) não é algo que possa ser estabelecido cientificamente. Pois a própria investigação científica se apoia em várias suposições filosóficas: que existe um mundo objetivo externo às mentes dos cientistas; que este mundo é governado por regularidades causais; que o intelecto humano pode descobrir e descrever com precisão essas regularidades; e assim por diante. Como a ciência pressupõe essas coisas, ela não pode tentar justificá-las sem andar em círculos. E se ela não pode sequer estabelecer que é uma forma confiável de investigação, ela dificilmente pode estabelecer que é a única forma confiável”
Fica evidente, nesse ínterim, a inconsistência do cientificismo, tal questão fica ainda mais clara ao se constatar as recentes transformações até mesmo nas bases metafisicas dessa corrente. As regularidades causais e o determinismo do mundo são questionados e substituídos pela aleatoriedade e acaso físico, conforme visto em argumentações pelo filosofo Edgar Morin e no filme “Ponto de mutação” de Capra, argumentações, estas, com alto teor de suposições filosóficas que podem novamente sofrer transformações. Nessa perspectiva, não há justificativa que conduza a uma revogação do direito de questionamento em relação a ciência durante a pandemia envolvendo o Covid-19, uma vez que ela apresenta falhas em sua própria essência. Embora capaz de construir conhecimentos verdadeiros, o direito de contestar é assegurado – afirmadas pelo próprio Descartes em “O discurso do método”.
No entanto, tal direito de confrontar a ciência não deve transgredir preceitos morais e éticos, é necessário que se siga o ordenamento dos direitos e que não viole com os já previstos, nomeadamente, a vida e outros defendidos pelo jusnaturalismo. As recentes manifestações realizadas no contexto do Covid-19 colocam em cheque esses direitos fundamentais, arriscando a vida de terceiros, por esse motivo são consideradas imprudentes e esse processo de questionamento cientifico é tolo, tendo maneiras mais humanista de fazê-lo. Simultaneamente, da mesma maneira que não se deve colocar o direito de questionamento em grau superior a vida, é arriscado também conceber pedaços da liberdade para um agente político, pois sob falsos pretextos nobres de conter a epidemia, ditadores escalam degraus em seus objetivos autoritários.

Otávio Eloy de Oliveira - 1º ano Direito - Noturno

1) https://www.thepublicdiscourse.com/2010/03/1174/

2) https://www.thepublicdiscourse.com/2010/03/1184/



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