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domingo, 15 de março de 2020

Obsolescência científica: da soberania à responsabilidade


No filme “Ponto de Mutação”, de Bernt Capra, a personagem Sonia Hoffman – uma física pessimista quanto ao papel da ciência – afirma “A ciência já passou o pensamento mecanicista nesta proporção. Mas vocês políticos parecem ainda ter essa máquina dentro de suas cabeças”. Factualmente, à medida que consolida-se uma intersecção entre as esferas acadêmicas e políticas na contemporaneidade, constata-se o uso mecânico da ciência para benefício estadista, corrompendo sua responsabilidade social. Tal fato determina tantos as relações de poder existentes no que concerne à produção de conhecimento quanto a falta de atenção do meio acadêmico em relação à sociedade. Ademais, entende-se a função social lacunosa da ciência na pós-modernidade como essencial para a constatação dessa como instituição obsoleta.
Exposto o elencado, cabe destacar as relações entre a política e o conhecimento científico. Tendo em vista os efeitos da globalização e do avanço tecnológico no mundo moderno, é irrefutável a maneira com a qual os saberes científicos são utilizados para fins geopolíticos. Sobretudo no que tange ao meio bélico, a Ciência tem se provado uma importante ferramenta na imposição de nações, no contexto internacional, e de grupos dominantes, no cenário nacional. A exemplo dessa situação, tem-se desde os aparatos tecnológicos que aprimoram a economia, através das conjunturas comerciais e industriais, até as mídias digitais, que promovem a comunicação entre indivíduos distantes geograficamente e propiciam a velocidade da informação – poderosos mecanismos para a consolidação de classes políticas. Em um outro caso, no filme de Bernt Capra, Sonia menciona como as experiências científicas podem ser utilizadas para a destruição, utilizando como exemplo a Bomba de Hiroshima e Nagasaki. Por fim, obtém-se que, com o fomento à Ciência, essa abandona suas responsabilidades sociais e passa a arquitetar avanços e conhecimento direcionados ao interesse de soberanos.
Outrossim, é cabível a discussão sobre o retorno dos conhecimentos científicos para a sociedade como um todo. A falta de acessibilidade da ciência para a população é inegável e, em decorrência de tal circunstância, infere-se que a produção do saber está cada vez mais delimitada dentro das paredes físicas de um laboratório ou da Academia. Com isso, a falta de integração impede que a ciência tenha contado com a sabedoria popular e evolua progressivamente com ele. Também é englobada pela pauta a maneira com a qual as Ciências Humanas se ausentam, por muitas vezes, do meio social ainda que esse seja propriamente seu objeto de estudo, de tal forma que não somente as Ciências Exatas e Biológicas sejam necessariamente responsáveis por essa situação alastrada. Por fim, é indubitável que existem problemas relativos no tocante ao papel da ciência no mundo pós-moderno – o que acentua a discrepância entre a ciência determinada pelos pensadores do século 17 e o papel social que essa possui e deve assumir na atualidade.
            Portanto, é necessário repensar a ciência quantos aos moldes de como ela é fundamentada na hodiernidade. Enquanto o papel social dessa estiver ausente em todas as esferas que o competem, irá se presenciar uma produção obsoleta de conhecimentos - de tal maneira que as descobertas alimentarão um progresso tecnológico e informacional, mas não o avanço da civilização. Assim, a ciência ausenta-se de seus deveres e abastece as classes dominantes que a tratam como um meio e não como uma finalidade. Os saberes científicos tornam-se fragilizados pela dependência quanto as classes que o financiam e, progressivamente, passam a ser reféns da estrutura de poder sustentada por eles em um ciclo vicioso de ganância e imoderação.

Giovanna Spineli de Paiva – Noturno (1º ano)

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