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quinta-feira, 28 de março de 2019

O racismo e as percepções de Descartes e Bacon


O racismo é a principal consequência de séculos de exploração de africanos com o trabalho escravo. No Brasil, após a abolição da escravatura, os ex escravos e seus descendentes não receberam nenhum tipo de indenização ou auxílio por parte do governo e em relação a sociedade, continuaram a serem vistos como inferiores e submissos aos brancos. Por conta disso, as inúmeras mazelas que a população negra enfrentou durante o período de escravidão continuaram presentes. Atualmente, depois de mais de 120 anos de liberdade, os preconceitos e discriminações contra afrodescendentes ainda estão enraizados na sociedade, mesmo que de forma mais velada que antigamente.
A figura do negro é constantemente relacionada a situações nocivas, como ladrão, assassino e selvagem, do mesmo modo que expressões populares, costumeiras e supostamente inocentes carregam preconceito, como “a coisa tá preta” e “serviço de preto”. Esses tipos de pensamentos são tão recorrentes para a população em geral que parte deles nem são considerados racismo, mesmo sendo claramente racistas.
Devido a esses fatores, a população negra toma precauções a todo momento para evitar enfrentar preconceitos e violência. Estar sempre preparado para um enquadro policial ou saber a forma de agir se acusado de roubo em uma loja é algo cotidiano na vida de muitas pessoas negras. Levando em consideração que até os mecanismos do estado são corrompidos por atitudes discriminatórias, essas pessoas estão sempre a mercê de injustiças. As tirinhas de Alexandre Beck “Armandinho” apresentam situações em que se pode notar clara distinção de comportamento entre as duas crianças, pois o menino negro chamado Camilo toma uma decisão de prevenção ao evitar correr com seu colega próximo a um policial e, no cenário da bicicleta, mostra a precaução necessária para o simples ato de uma criança negra andar de bicicleta.

Esses falsos conceitos que prejudicam o julgamento das pessoas foram estudados por diversos pensadores, ressaltando René Descartes e Francis Bacon, famosos filósofos do século XVII que adotavam duas correntes filosóficas opostas: o racionalismo e o empirismo. Eles, portanto, acreditavam em diferentes formas de obtenção de conhecimento. Descartes, em sua obra “ O Discurso do Método”, propõe o método dedutivo, que contava apenas com a racionalidade e questionamentos, para acessar o conhecimento. Em contrapartida, o método de Bacon utilizava como base principal a experiência, ou seja, a observação de fenômenos, mas também conciliava a elaboração racional de hipóteses com a experimentação.
Mesmo com metodologias antagônicas, ambos os filósofos acreditavam na necessidade da superação de preconceitos e superstições por via do conhecimento. Com isso, é possível relacioná-los com as tirinhas de Alexandre Beck. Descartes e Bacon apresentam e defendem diferentes métodos para libertar-se das falsas noções pré estabelecidas.
Aplicando o método de bacon para a análise das tirinhas, é possível notar que o motivo de Camilo agir daquela forma é porque ele ou seus semelhantes já vivenciaram esses tipos de situações. Portanto, sua atitude foi baseada na experiência e na observação. Em relação ao comportamento do policial, seu julgamento está prejudicado por causa dos ídolos, que são falsas percepções baseadas nos costumes, hábitos, superstições e preconceitos. Para que o policial estabeleça uma postura correta é preciso que ele busque alcançar o conhecimento para afastar essas pré noções.
Ao analisar as situações de um ponto de vista cartesiano, conclui-se que o menino negro utilizou a sua capacidade de pensar para discernir qual seria a melhor escolha a se tomar no momento. Já a atitude do policial é uma consequência de sua falta de conhecimento e ao apego a preceitos incluídos em um senso comum sem qualquer tipo de embasamento científico adequado.
Por fim, nota-se que para os dois filósofos o modo de ação do policial é atrasada e superável através da busca pelo conhecimento, empírica para Bacon e racional para Descartes.

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