O racismo é a
principal consequência de séculos de exploração de africanos com
o trabalho escravo. No Brasil, após a abolição da escravatura, os
ex escravos e seus descendentes não receberam nenhum tipo de
indenização ou auxílio por parte do governo e em relação a
sociedade, continuaram a serem vistos como inferiores e submissos aos
brancos. Por conta disso, as inúmeras mazelas que a população
negra enfrentou durante o período de escravidão continuaram
presentes. Atualmente, depois de mais de 120 anos de liberdade, os
preconceitos e discriminações contra afrodescendentes ainda estão
enraizados na sociedade, mesmo que de forma mais velada que
antigamente.
A figura do negro é
constantemente relacionada a situações nocivas, como ladrão,
assassino e selvagem, do mesmo modo que expressões populares,
costumeiras e supostamente inocentes carregam preconceito, como “a
coisa tá preta” e “serviço de preto”. Esses tipos de
pensamentos são tão recorrentes para a população em geral que
parte deles nem são considerados racismo, mesmo sendo claramente
racistas.
Devido a esses
fatores, a população negra toma precauções a todo momento para
evitar enfrentar preconceitos e violência. Estar sempre preparado
para um enquadro policial ou saber a forma de agir se acusado de
roubo em uma loja é algo cotidiano na
vida de muitas pessoas negras. Levando em consideração que até os
mecanismos do estado são corrompidos por atitudes discriminatórias,
essas pessoas estão sempre a mercê de injustiças. As tirinhas de
Alexandre Beck “Armandinho” apresentam situações em que se pode
notar clara distinção de comportamento entre as duas crianças,
pois o menino negro chamado Camilo toma uma decisão de prevenção
ao evitar correr com seu colega próximo a um policial e, no cenário
da bicicleta, mostra a precaução necessária para o simples ato de
uma criança negra andar de bicicleta.
Esses falsos
conceitos que prejudicam o julgamento das pessoas foram estudados por
diversos pensadores, ressaltando René Descartes e Francis Bacon,
famosos filósofos do século XVII que adotavam duas correntes
filosóficas opostas: o racionalismo e o empirismo. Eles, portanto,
acreditavam em diferentes formas de obtenção de conhecimento.
Descartes, em sua obra “ O Discurso do Método”, propõe o método
dedutivo, que contava apenas com a racionalidade e questionamentos,
para acessar o conhecimento. Em contrapartida, o método de Bacon
utilizava como base principal a experiência, ou seja, a observação
de fenômenos, mas também conciliava a elaboração racional de
hipóteses com a experimentação.
Mesmo com
metodologias antagônicas, ambos os filósofos acreditavam na
necessidade da superação de preconceitos e superstições por via
do conhecimento. Com isso, é possível relacioná-los com as
tirinhas de Alexandre Beck. Descartes e Bacon apresentam e defendem
diferentes métodos para libertar-se das falsas noções pré
estabelecidas.
Aplicando o método
de bacon para a análise das tirinhas, é possível notar que o
motivo de Camilo agir daquela forma é porque ele ou seus semelhantes
já vivenciaram esses tipos de situações. Portanto, sua atitude foi
baseada na experiência e na observação. Em relação ao
comportamento do policial, seu julgamento está prejudicado por causa
dos ídolos, que são falsas percepções baseadas nos costumes,
hábitos, superstições e preconceitos. Para que o policial
estabeleça uma postura correta é preciso que ele busque alcançar o
conhecimento para afastar essas pré noções.
Ao analisar as
situações de um ponto de vista cartesiano, conclui-se que o menino
negro utilizou a sua capacidade de pensar para discernir qual seria a
melhor escolha a se tomar no momento. Já a atitude do policial é
uma consequência de sua falta de conhecimento e ao apego a preceitos
incluídos em um senso comum sem qualquer tipo de embasamento
científico adequado.
Por fim, nota-se que
para os dois filósofos o modo de ação do policial é atrasada e
superável através da busca pelo conhecimento, empírica para Bacon
e racional para Descartes.
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