Max Weber
confronta as concepções de Direito formal e de Direito material para indicar a
quem serve o Direito: ao grupo cuja razão se faz hegemônica em certo momento histórico.
O Direito
concebido abstratamente se apresenta como racional e universal na forma. Essa
concepção ideal se edifica a partir da previsibilidade e da sistematização do
Direito dito natural, costumeiro. A segurança, a manutenção da ordem
estabelecida e a solução de conflitos se dariam a partir de leis cuja essência
é inerte e universal.
Do plano
das ideias à realidade prática, o Direito padece da propalada racionalidade
universal. A operacionalização do Direito rompe com a razão e assume valores
éticos do Direito material. Da perspectiva universal restam apenas interesses
de grupos próximos ao poder dominante. O conflito se estabelece a partir da
diversidade de pleitos na sociedade moderna, mas a mutação do Direito se limita,
muitas das vezes, à miragem formal. De fato, essa dominância do particularizado
em relação ao universal equivale à prevalência do Direito material sobre o formal
no exercício da Justiça.
Vale
dizer que, no Direito, a forma comporta tudo; ela é ideológica, utópica, uma
ilusão. Enquanto a matéria é restrita; ela se molda aos anseios do poder dominante
na manutenção da ordem estabelecida e na promoção do mercado.
A esfera
do Direito dialoga com outras como cultura, educação, trabalho e religião, que também manifestam
seus valores nas leis. A identidade de gênero atribui a cada sexo seu papel social.
Apesar de algum avanço na igualdade material de direitos entre homens e
mulheres, a identificação de sexo de cada indivíduo ainda assinala,
exclusivamente, sua identidade de gênero. Acima desse preceito arraigado na
sociedade, há o direito fundamental à identidade, que deve ser tal como
percebida pelo próprio indivíduo.
A decisão
do Tribunal de Justiça de São Paulo – favorável ao pleito do indivíduo que
deseja submeter-se à cirurgia de mudança de sexo e à alteração no registro
civil – fortalece a perspectiva formal do Direito em uma sociedade cuja prática
jurídica é predominantemente material, conectada aos bons costumes. O mérito do caso representa ruptura da matéria apegada ao sexo biológico da pessoa e ascensão da
forma da universalidade do direito fundamental à identidade.
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