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segunda-feira, 16 de setembro de 2019

A inflação do poder jurídico: apaziguador de desigualdades ou um risco para a democracia?


            Sob a ótica de Garapon, a contemporaneidade é marcada por um rompimento de laços sociais que corroboram em uma virtude da indiferença – termo usado pelo autor para definir o modo que o ser abandona a coletividade e a empatia pelo próximo -, todos os indivíduos são vistos como concorrentes, sustentando a democracia liberal e a sua constante competição. Nessa perspectiva, a justiça torna-se um viés para amenizar o sofrimento e as demandas de determinados grupos que são constantemente atingidos e menosprezados. Desse modo, há um impasse entre a atuação da justiça em promover os direitos que tendem a ser omitidos pelo poder legislativo e o ativismo judicial, o qual incide questionamentos sobre sua legitimidade e seus limites.   
            A princípio, ao considerar a vivência populacional, é nítido que alguns grupos são atingidos e injustiçados, o que os leva a recorrer ao meio judicial para tentar suprir e apaziguar sua situação. Exemplo disso é o caso do grupo LGBTQ+, o qual discutiu sobre a proibição da união homoafetiva – ADI 4277 -, votada em 2011 pelo Supremo Tribunal Federal. Assim sendo, a circunstância é condizente com a explicitada por Garapon, de modo que os juízes tornam-se ministros da equidade, tutelando mais que arbitrando; pois os indivíduos veem no judiciário a forma de alcançar sua proteção. A situação se hiperboliza ainda mais quando o legislativo age de maneira negativa, não promovendo projetos de lei que garanta os direitos dessas pessoas. É inegável a importância de proteger e garantir a isonomia aos cidadãos, contudo incorre no risco de se submeter ao controle do judiciário e uma possível ditadura advinda deste – usurpando do poder legislativo normatizando condutas conforme lhe for conveniente.
            Não obstante, contrastado a essa circunstância, a autora Ingeborg Maus aborda a convergência entre o aumento de litigância dos movimentos sociais com as ações do judiciário ultrapassando sua competência; há uma crise de representatividade, de modo que os partidos não suprem as demandas e há uma sobrecarga no judiciário. Desse modo, pode-se oferecer demasiada autoridade a um único poder, desbalanceando a igualdade entre os poderes legislativo, executivo e judiciário, fazendo sobrepor este último e seu ativismo. Além disso, não há nenhuma garantia de que o judiciário irá arbitrar de maneira justa, principalmente no Brasil em que os ministros são indicados, dificultando a existência de uma representatividade e uma abordagem de temas complexos na agenda – e quando há, os votos são esquivos e fortalecem as desigualdades.
Portanto, a partir do exposto, nota-se que há dilema relativo à atuação judicial. Entretanto, impedir a aprovação de temáticas importantes, em um contexto em que o legislativo não oferece medidas e atrasa o direito dessa população, não é o ideal. Deve haver pesos e contrapesos que permitam obter uma atuação com menos vícios, para que seja possível equiparar as desigualdades e alcançar uma sociedade isonômica. Logo, supre as demandas judiciais, além de melhorar a consciência coletiva e a constante corrosão do caráter dos indivíduos, os quais poderão compreender que a aprovação de direitos para outrem não gera uma diminuição dos seus direitos – e que nem tudo deve ser ponderado na famigerada meritocracia liberal que hierarquiza os seres e os coloca em competição – por conseguinte, extingue a virtude da indiferença.


Bianca de Faria Cintra - Direito Noturno, 1º Ano.

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