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quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Silenciamento do Direito frente a questão do aborto


Reavivando a questão acerca da descriminalização do aborto, evidenciando que aqui se discute apenas as exceções, como em casos de: risco de vida para a mãe, anencefalia e gravidez decorrente de estupro, nota-se intensa polêmica e o crescente debate dentro da sociedade brasileira.  Mesmo sendo uma prática amplamente aceita nos países mais desenvolvidos, ainda é muito contestada e repudiada dentro dos estratos sociais brasileiros. O autor Pierre Bourdieu, em sua obra, aborda inúmeros conceitos pertinentes à luta que várias mulheres enfrentam no campo jurídico para fazer valer o direito de decidir o que fazer ou não sob seu próprio corpo.
É perceptível que a intensa racionalização somada a universalização do Direito dá total legalidade para que juízes utilizarem à lei a seu bem querer, sem considerar as peculiaridades que variam caso a caso. Justamente tal manipulação do aparato jurídico que faz o aborto estar no mesmo espectro de um assassinato, pois, como é esperado do senso comum, não se investiga além da superfície, sendo o discurso do magistrado o embasamento mais sólido a se reproduzir. Como declarar assassinato a interrupção do desenvolvimento de algo que até hoje não se tem o consenso de ser provido de vida? Como dar garantias legais a esse estágio inicial da gestação, considerando que ali existe vida humana sem o aval de outros campos mais especializados no assunto, como por exemplo, a medicina, a filosofia, a ética? 
Pelo contrário esses dois últimos argumentos são amplamente utilizados sob a perspectiva que os mescla com a religião, colocando a questão sob uma forma enviesada de análise e consequentemente, trazendo a misoginia para a discussão. A Ética é apontada quando as esferas jurídicas ressaltam que o aborto consiste em “acabar com uma vida que nem se constituiu” ou que “a vida existe desde a concepção porque até mesmo uma só célula é uma vida”. No entanto, não se discute questões Éticas quando o Direito é posto frente a frente com a imensa população de crianças em situação de rua, com cerca de 5,5 milhões de crianças que não tem a paternidade reconhecida, sob o sofrimento de uma mãe que passa pela Depressão Pós-Parto por ter sido obrigada a levar adiante uma gravidez indesejada ou até mesmo com o fato do aborto clandestino ser a quinta maior causa da mortalidade feminina. 
As ambiguidades apresentadas, não só expõe tamanha desigualdade nos julgamentos como faz lembrar que essa divergência é mais um, clássico, exemplo da segregação sexual e reforço do patriarcado na sociedade atual. Uma vez que se busca que a classe feminina continue sob domínio da classe masculina, com base no binarismo compulsório promovido pela sociedade. Desde o nascimento é pregado a mulher que o seu corpo não lhe pertence e com isso justifica-se o fato do aborto até hoje não ser aceito no Brasil. O direito ao aborto é algo que pertence a decisão da mulher sobre seu próprio corpo e o patriarcado não admite tal empoderamento. 

O Direito deveria servir para garantir as necessidades reais da população, e não servir aos interesses ditados pela classe dominante. O Direito deveria se integrar com outros campos, consultando outros  especialistas para embasar sua decisão e não apenas aplicar as leis já estabelecidas como universais por determinada elite. O Direito não deveria reproduzir determinada ordem social, estabelecendo-a como exemplar, ele precisa se esforçar para aplicar suas leis sobre as diversas perspectivas existentes, procurando alcançar até mesmo a mulher da periferia, semianalfabeta e com o mínimo acesso a informação, que não deve ser obrigada a assumir a responsabilidade de carregar, para o resto da vida, uma consequência que resultou de um acidente. 

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