Tentativa de mudança à sociedade civil incivil
Frente à polêmica que engloba a temática das políticas
afirmativas, sobretudo no que tange à questão das cotas, argumentos diversos
são usados – tanto para corroborá-la quanto para refutá-la. O dualismo composto
entre a alegação de que há tentativa de superação das desigualdades históricas e
que há racismo institucionalizado compõe esta problemática.
Ao longo do exposto nos acórdãos na ADPF 186, pode-se
perceber traços da dialética social que contrapõe regulação e emancipação,
conforme acentua Boaventura de Sousa Santos. A primeira, que há algum tempo se denotava no interesse burguês de manter a
classe trabalhadora excluída, por exemplo, nesse caso é marcada pelo interesse
de declarar inconstitucionalidade às cotas justamente como tentativa de manter
a população negra excluída de uma oportunidade mais ampla de ingresso à
universidade baseando-se em um discurso meritocrata.
É interessante ressaltar que, na perspectiva de Boaventura
de Sousa Santos, a política de cotas só se aplicaria para aquele grupo de
pessoas que possui o mínimo de inclusão no contrato social. Assumindo, por
exemplo, a visão da dinâmica do pós-contratualismo como processo de exclusão,
observa-se que estes próprios grupos se vêem excluídos do contrato social, sem qualquer
perspectiva de serem nele inseridos.
Ainda sob a ótica dos estudos de Boaventura de Sousa Santos,
é possível aplicar a este caso uma concepção de apartheid social. Neste panorama, criam-se “zonas civilizadas” – as
quais seriam ocupadas majoritariamente por brancos de classe média, possuidores
do acesso ao ensino superior sob um critério meritocrata – e “zonas onde
floresce a barbárie” – as quais seriam ocupadas por negros que não detêm acesso
à educação.
Desta forma, levando em consideração a decisão tomada pelo
STF – na qual a ação que tratava as cotas como inconstitucionais fora julgada
como improcedente -, pode-se incutir no Direito um mecanismo de mudança das
condições de existência de parcela da população da “sociedade civil incivil” –
como é tratado por Boaventura de Sousa Santos o grupo que não compartilha dos mesmos direitos da sociedade civil -, uma vez que estende a tal
parcela um rol de direitos – o de alavancar seu acesso ao ensino superior -, fazendo-o
adquirir, conseguintemente, uma forma contra-hegemônica,
no sentido de se posicionar a favor de lutas políticas emancipatórias no caso
tratado.
Caroline Verusca de Paula - 1ºDD
Caroline Verusca de Paula - 1ºDD
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