A abordagem complexa
de Weber sobre o direito natural e sua evolução diante da história, com
destaque para a divisão entre os períodos pré e pós-revolução burguesa, nos
ensina as transformações nas bases dos ordenamentos jurídicos, claro que
referentes à região ocidental do mundo, e nos seus caracteres ideológicos.
O autor conceitua direito natural como aquele que
“legitima o poder compromissório das promulgações autoritárias” vigentes, como
um conjunto de normas independentes de direito positivo, dotado de princípios
gerais, diversos em cada caso. O direito natural, do ponto de vista
sociológico, se mostra como princípios gerais que permeiam as regras
positivadas, formadores de “máximas jurídicas e da vida jurídica prática”.
[p.134]
Dá-se, assim, na concepção de Weber, e em uma resumida
explicação, a determinação do direito positivo pelo natural de duas formas:
legitimidade ligada às condições formais ou materiais.
Pode-se perceber que as normas em vigor nunca serão
totalmente naturais, pois constariam apenas de princípios gerais e abstratos.
Atendo-nos ao período moderno, o direito natural formal tem como elemento
substancial os “direitos de liberdade”, que recaem sobre a liberdade de
contrato neste período pós-revolução burguesa. O direito natural legitima as
ações contratuais e sociais dentro dessa realidade do Estado de Direito,
proporcionando a formalidade de suas acepções. Neste ponto, fica clara a
intencionalidade da classe favorecida, a burguesia, em instituir direitos
naturais que, acima do ordenamento positivo, pregam liberdades individuais e
“exercício pleno da propriedade”; o direito subjetivo, fruto indiretamente do
direito natural, nesse momento histórico da ampliação do mercado capitalista,
reside na “liberdade” de se efetivamente dispor de bens privados. A redução da
coação dos detentores do poder relaciona-se com os grupos de interesses,
possuidores de grande desenvoltura econômica e ainda responsáveis pela
imputação de valores jurídicos, ao longo de ações de ruptura, que firmaram os
propósitos capitalistas. O fortalecimento das “garantias formais, baseadas no
direito natural, do indivíduo e de sua esfera jurídica diante do poder político
dominante” foi um dos aspectos marcantes do “trabalho bem feito” da revolução
burguesa.
Daí em diante, as determinações do mercado definiam o
“justo” com base na concorrência. O direito natural vê-se obrigado a aceitar
razões materiais, baseadas no racionalismo prático utilitário. De acordo com
Weber, “o direito natural formal transforma-se em direito natural material a
partir do momento que a legitimidade de um direito adquirido não depende mais
de características formal-jurídicas, mas de características material-econômicas
relativas à forma de aquisição” [p.137] As teorias socialistas impuseram a
apropriação de bens de produção de produtos materiais como o caminho para o
estabelecimento da igualdade social e destruição das “injustiças da luta de
classes”. Essa vinculação moderna do direito natural material à classe interessada
em retirar os meios de produção do grupo econômico dominante, proporcionada
pelas afirmações dos teóricos do socialismo, auxiliou de forma decisiva na
formação de um Direito cada vez mais adequado às matérias econômicas. Há a
“debilitação do formalismo jurídico por interesses materiais”, uma
“racionalização e sistematização” que fortaleceu ainda mais a penetração dentro
da sociedade do poder emanado pelos capitalistas. O que a teoria socialista
pregava como “justiça material”, claramente envolvendo somente a classe
trabalhadora, é vista como “justiça burguesa”, já que os detentores do poder
econômico detiveram todos os demais poderes, assim como ditou Karl Marx.
Discutindo brevemente um assunto relacionado ao que já
foi exposto aqui, obviamente na realidade brasileira, podemos perceber que a
parcela da sociedade que, atualmente, disputa a citada “justiça material”,
pressionando as classes dominantes do âmbito político econômico, o faz não apenas
se utilizando dos dogmas de mercado que apreciam um racionalismo principalmente
dentro do Direito. Essas classes trazem reivindicações éticas baseadas em
aspectos culturais e de ressarcimento moral, além do econômico. Na opinião do
autor deste texto, a aplicação efetiva das normas de nosso país, principalmente
em relação aos profissionais do direito e seus interesses, está maculada com a
influência de grupos econômicos diversos detentores de grande atuação política
direta ou indireta.
Nenhum comentário:
Postar um comentário