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domingo, 26 de agosto de 2012

A consciência coletiva, a pena e a hipocrisia

"Ainda que exista uma grande hipocrisia a respeito da violência, todas as pessoas estão fascinadas por ela. Afinal, o homem é o assassino mais cruel que jamais pisou o planeta".Stanley Kubrick

    Ao discorrer sobre a funcionalidade da sociedade, Durkheim concluí que esta é mantida pelas relações interpessoais denominadas como solidariedade. Dentro do pensamento de Durkheim há dois tipos de solidariedade: a mecânica, presente nas sociedades ditas “primitivas"; e a orgânica, presente nas sociedades modernas. No entanto, após uma análise sobre o que caracteriza a solidariedade mecânica, percebe-se uma extrema semelhança dela com a nossa sociedade dita "moderna". 
    A principal característica da solidariedade mecânica é a presença de uma consciência coletiva, ou seja, todos os indivíduos que integram a sociedade possuem uma inclinação para seguirem um mesmo padrão de ideias sobre fatos e assuntos que atingem de forma perceptível a todos. Sendo assim, a consciência coletiva com os seus padrões de opinião sobre atitudes específicas acabam se configurando como a essência do direito nas “sociedades primitivas". O crime é aquela atitude que ofende a consciência coletiva. Partindo dessa definição é possível afirmar que a solidariedade mecânica continua mais presente do que nunca atualmente. 
     A ideia do que é crime e do que fere a integridade da sociedade não varia muito de um indivíduo para outro. Possuímos uma consciência coletiva daquilo que "fere" a moral da sociedade e é assim que aplicamos a pena para tais "crimes", e é inegável que a condenação das massas interfere nas sentenças oficiais. No entanto, essa influência da consciência coletiva na aplicação da norma penal acaba por condenar de maneira maior aquilo que afronta de forma mais perceptível as nossas convicções, abandonando a análise do verdadeiro mal causado, e é neste fato que reside a hipocrisia do ser humano ao aplicar punições. 
     Gostamos de vestir uma máscara de protetores da vida, e por isso o assassinato é um crime, porém, quando somos roubados ou algo do tipo, a nossa primeira reação é de, no mínimo, desejar a morte do sujeito que nos causou aquele mal. Alguns gostam de se dizer contra a pena de morte, mas quando o mal acontece com eles, os mesmos defensores da vida estão prontos para matar os "bandidos lazarentos" que roubaram o seu celular, por exemplo.
    No fim, essa consciência coletiva presente na sociedade atual alimenta ainda mais a hipocrisia presente em todos nós. Ainda sobre a solidariedade mecânica e sobre o seu sistema penal, Durkheim mostra que os delitos contra o Estado são repreendidos de forma mais enérgica, uma vez que quase sempre ele encarna crenças e práticas coletivas. Mas e os delitos cometidos pelo próprio Estado? Quem é que pune a instituição que é a expressão da consciência comum? No filme "Laranja Mecânica" (1971), Kubrick de maneira única nos faz pensar sobre os mecanismos de controle da sociedade e mostra o Estado que reprime a violência com mais violência. Alex, personagem principal, acaba sendo vítima do sistema que utiliza mecanismos que suprimem a sua liberdade e transformam o amante da violência em um sujeito indefeso. No entanto, o método do sistema para controlar todo o ímpeto violento de Alex não surte nenhum efeito permanente e seus traços violentos voltam, só que dessa vez ele possui a conivência do seu lado.  Relacionando Durkheim e o filme genial de Kubrick, percebemos que as penas nunca provocarão mudanças e não vão nos deixar mais seguros se continuarmos com a hipocrisia de querer usar a violência para condenar a violência. O indivíduo não irá deixar de cometer crimes se o próprio sistema em que ele está inserido também comete crimes em nome da ordem.

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