O que nos leva a interromper todas as nossas atividades e vestir verde e amarelo da cabeça aos pés em jogos da seleção brasileira de futebol nos tempos de copa do mundo? O que nos faz parar em frente à televisão, extremamente indignados, e ver por diversas vezes em várias versões os últimos passos do atirador de Realengo? Por qual motivo deixamos escorrer lágrimas pela face comovida ao nos deparamos com os inúmeros desatres naturais que enchem as páginas dos jornais diariamente? O que nos direciona a doar alimentos, roupas, medicamentos para aqueles, tão distantes e igualmente desconhecidos, que por catástrofes ou outras situações necessitam de ajuda? Só há uma explicação que pode proporcionar o entendimento acerca dessas indagações: somos movidos por paixões, como já dizia Aristóteles, observou Durkheim e estudou Freud com o nome de "pulsões". Tornamo-nos patriotas convictos, somos, sem ao menos concurso público, juízes e oferecemos um ombro amigo àqueles que jamais abraçamos porque damos voz às nossas paixões, aos nossos sentimentos. É por isso que "a ideia de que o assassinato possa ser tolerado nos indigna, mas aceitamos muito bem que o direito sucessório seja modificado, e muitos até concebem que ele possa ser suprimido", como aponta Durkheim.
Mas, fez-se necessário um instrumento capaz de coordenar tais paixões, a fim de que o caos não reine entre os homens. O direito, com suas normas e determinações, caminhou muito para além da solução de conflitos entre particulares. Como "coisa social" , proporcionou a vida em sociedade, regendo e conduzindo as paixões humanas, pautado, portanto, na utilização da razão. Durkheim exemplifica o papel "racionalizador" do direito ao citar a questão do divórcio: " o juiz que examina um pedido de divórcio não se preocupa em saber se essa separação é verdadeiramente desejável para os esposos, mas se as causas invocadas se enquadram numa das categorias previstas pela lei". Assim, submetemos ao direito nossas paixões, desejos e sentimentos, racionalizando-os, como pode ser visto no casamento em que, por ser um contrato, "os esposos não podem nem estabelecê-lo, nem rescindi-lo a seu bel-prazer".
Seria , pois, o direito fundamentado única e essencialmente na razão, sendo capaz de direcionar as paixões que nos movem possibilitando o convívio em sociedade? Estaria ele, para desempenhar tal função, liberto completamente das paixões? Mesmo preso aos códigos, às leis já estabelecidas e condutas definidas, o direito acompanha os passos da sociedade, mudando com ela e abraçando, assim, as novas situações geradas. É um instrumento que possui como alicerce a razão, mas que se deixa seduzir pelos homens que lhe dão vida, não se afastando das paixões.
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