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domingo, 19 de junho de 2011

O Antidogmatismo De Max Weber

''Nossa revista, como representante de uma disciplina empírica, deve - gostaríamos de insistir nisso de antemão - rejeitar em princípio este ponto de vista, pois é nossa opinião de que jamais pode ser tarefa de uma ciência empírica proporcionar normas e ideais obrigatórios, dos quais se possa derivar ' receitas' para a prática''.

A obra ''A Metodologia Das Ciências Sociais'', de Max Weber, particularmente na parte intitulada ''Die 'Objektivität' Sozialwissenschaftlicher Und Sozialpolitischer Erkenntnis''(traduzida como '' A 'Objetividade' Do Conhecimento Na Ciência Social E Na Ciência Política'') e publicada no ''Archiv Für Sozialwissenschaft Und Sozialpolitik'', de 1904, critica enfaticamente a metodologia dogmática para a compreensão sociológica.Começa discorrendo acerca da relação entre valor e a decisão da ação humana : ''Ela [ decisão ] é própria do homem da ação : ele pondera e escolhe, entre os valores em questão, aqueles que estão de acordo com sua própria consciência e sua cosmovisão pessoal''.Weber, assim, vincula a consciência e a cosmovisão de cada indivíduo com a atitude tomada por ele : ''Sem dúvida, a dignidade de uma 'personalidade' reside no fato de que, para ela, existem valores aos quais a sua própria vida diz respeito mesmo se estes - em casos bem particulares - residem exclusivamente dentro da esfera da própria individualidade, do 'viver plenamente' os interesses para os quais se exige a validade enquanto valores, constitui para ela, exatamente a idéia à qual ela se refere.Temos de admitir que 'cosmovisões' nunca podem ser o resultado de um avanço do conhecimento empírico, e que, portanto, os ideais supremos que nos movem com a máxima força possível, existem, em todas as épocas, na forma de uma luta com outros ideais que são, para outras pessoas, tão sagrados como o são para nós os nossos''.Para o autor, o cientista social, como ser humano que é, não está livre da influência de valores; além disso, o autor questiona a veracidade dos princípios universalmente aceitos : ''Por mais que, na ciência social, sejam necessárias explicações 'de princípios' sobre problemas práticos, isto é, a referência a juízos de valor que se introduzem de maneira não-refletida, com referência ao conteúdo das idéias, e por mais que a nossa revista se proponha dedicar-se de maneira particular a tais explicações, certamente não poderá ser sua tarefa - e, de maneira geral, de nenhuma ciência empírica - determinar um denominador comum prático para os nossos problemas na forma de idéias últimas e universalmente válidas; uma tal determinação não apenas seria praticamente impossível, como também não teria nenhum sentido''.Para Weber, o objeto sócio-econômico pode ser : especificamente econômico (''um fenômeno só conserva a sua qualidade de 'econômico' na estrita medida em que o nosso interesse está exclusivamente centrado no seu significado para a luta material pela existência''), economicamente condicionado (''Tanto os acontecimentos da vida cotidiana como os fenômenos 'históricos' da alta política, tanto os fenômenos coletivos ou de massa como as ações 'individuais' dos estadistas, ou as realizações literárias ou artísticas, sofrem a sua influência : são, portanto, economicamente 'condicionados' '') ou economicamente relevante (''Por outro lado, o conjunto de todos os fenômenos e condições de existência de uma cultura historicamente dada influi na configuração de existência de uma cultura historicamente dada, na configuração das necessidades materiais, no modo de satisfazê-las, na formação dos grupos de interesses materiais, na natureza dos seus meios de poder, e, por essa via, na natureza do curso do 'desenvolvimento econômico', tornando-se assim, 'economicamente relevantes' '').O autor defende ainda que a metodologia a ser empregada nas ciências sociais possua caráter universal : ''No que diz respeito ao nosso trabalho, queremos deixar bem claro o seguinte : uma revista de ciências sociais, no sentido em que nós a entendemos, deve, na medida em que pretende ser científica, ser um lugar onde se busca a verdade do modo que um chinês - para lançar mão do nosso exemplo novamente - deva reconhecer a validade de um certo ordenamento conceitual da realidade empírica''.Passado isso, Weber contesta fortemente o dogmatismo do materialismo histórico marxista na compreensão da realidade social, bem como sua aplicação exagerada e a ignorância de outros agentes e fatores sociais : ''Quanto à chamada 'concepção materialista da história', é preciso repelí-la com maior ênfase, enquanto 'concepção do mundo', ou quando encarada como denominador comum da explicação causal da realidade histórica - pois o cultivo de uma interpretação econômica da história é um dos fins essenciais da nossa revista.Isso exige uma explicação mais concreta.Hoje em dia, a chamada 'concepção materialista da história', segundo, por exemplo, o sentido genial e primitivo do Manifesto Comunista , talvez apenas subsista nas mentes de leigos ou diletantes.Entre esses, com efeito, encontra-se ainda muito difundido o sigular fenômeno de que a necessidade de explicação causal de um fenômeno histórico não fica satisfeita enquanto não se mostre (mesmo que só aparentemente) a intervenção de causas econômicas.Feito isto, eles passam a se contentar com as hipóteses mais frágeis e com as formulações mais genéricas, pois já foi satisfeita a sua necessidade dogmática, segundo a qual a 'forças' econômicas são as únicas causas 'autênticas', 'verdadeiras' e 'sempre determinantes em última instância' ''.Para Max Weber, a ação social pode ser classificada de quatro diferentes formas, a saber : ação racional com relação a um objeto (ocorre concepção do objeto e utilização dos meios para alcançá-lo), ação racional no que concerne a um valor (aceitação dos riscos inerentes à prática de uma ideologia), ação afetiva ou emocional (decorrente dos sentimentos do ator social) e ação tradicional (gerada pelas tradições, costumes e crenças do indivíduo).O autor passa a discutir acerca da incompatibilidade existente entre a verdade científica e os sistemas de de ''leis'' explicativas dos objetos : ''Tudo o que na realidade individual continue a resistir à seleção feita a partir desta regularidade, ou é considerado como um remanescente ainda não elaborado cientificamente (mas que, mediante aperfeiçoamentos contínuos, deverá ser integrado no sistema das 'leis'), ou é deixado de lado.Ou seja, é considerado 'casual' e cientificamente secundário precisamente porque se revela ininteligível em face das 'leis' e não se integra ao processo 'típico', de modo que se tornará objeto de uma 'curiosidade ociosa' ''.Weber, posteriormente, considera que ''O estabelacimento de tais 'leis' e 'fatores' (hipotéticos) apenas constituiria, para nós, a primeira das várias operações às quais o conhecimento a que aspiramos nos conduziria.A segunda operação, completamente nova e independente, apesar de se basear nessa tarefa preliminar, seria a análise e a exposição ordenada do agrupamento individual desses 'fatores' historicamente dados e da combinação concreta e significativa dele resultante.Mas acima de tudo consistiria em tornar inteligível a causa e a natureza deste significado.A terceira operação seria remontar o máximo possível ao passado e observar como se desenvolveram as diferentes características individuais dos agrupamentos de importância para o presente, e proporcionar uma explicação histórica a partir destas constelações anteriores, igualmente individuais.Por fim, uma quarta operação possível consistiria na avaliação das constelações possíveis no futuro.Onde quer que se trate de explicação causal de um fenômeno cultural - ou de uma 'individualidade histórica', expressão já utilizada relativamente à metodologia da nossa disciplina e agora habitual na lógica, como uma formulação mais precisa - , o conhecimento das leis da casualidade não poderá consistir o fim, mas apenas o meio da investigação.Ele apenas facilita a imputação causal que leva em consideração aqueles elementos nos acontecimentos que ficaram importantes causalmente para a singular evolução cultural.É apenas na medida em que presta este serviço que poderá ter valor para o conhecimento das conexões individuais.E, quanto mais 'gerais', isto é, abstratas são as leis, tanto menos contribuem para as necessidades da imputação causal dos fenômenos individuais e , indiretamente, para a compreesão da significação dos acontecimentos culturais.Para o conhecimento das condições concretas dos fenômenos históricos, as leis mais gerais são freqüentemente as menos valiosas, por serem as mais vazias de conteúdo.Isto porque, quanto mais vasto é o campo abrangido pela validade de um conceito genérico - isto é, quanto maior a sua extenção - tanto mais nos afasta da riqueza da realidade, posto que, para poder abranger o que existe de comum no maior número possível de fenômenos, forçosamente deve ser o mais abstrato e pobre de conteúdo.No campo das ciências da cultura, o conhecimento do geral nunca tem valor por si próprio.''

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