O ápice da viagem de Vasco da Gama, narrada em “Os Lusíadas” de Camões, configura-se na superação do Cabo das Tormentas, alegorizado pela derrota do mito e do Gigante Adamastor pelos portugueses. Tal qual os lusitanos nas Grandes Navegações, o progresso das civilizações evidenciou-se na égide do conhecimento, como mostra a base da teoria moderna baconiana e cartesiana. Entretanto, no hodierno auge do desenvolvimento tecnológico, tem-se a observância de um dualismo perigoso – ciência versus crenças – cercada de velhos “gigantes”.
O avanço científico convivendo com o retorno de misticismos exige uma análise do papel da ciência no mundo contemporâneo, um vez que quatrocentos anos atrás Francis Bacon já edificara métodos para estruturar o conhecimento experimentalmente em sua obra Novum Organum. Seu principal objetivo era evitar, assim, distorções da realidade e falsas percepções da mesma, a qual ele denominou de ídolos, mas que facilmente poderiam ser identificados como mais um dos Gigantes Adamastores de seu tempo.
A existência de gigantes e ídolos remasterizados, de início, é reflexo de uma sociedade a qual, mesmo envolta de tecnologia, ainda não reconheceu os devidos valores da ciência e por isso a condena a lá Inquisição em pleno século XXI, como mostram as tendências conservadoras do atual governo brasileiro. Em suas publicações, Bacon e Descartes constatam o poderio da sapiência racional e empírica: a libertação das crenças e a mudança de perspectivas humanas, o que explica o fato de grupos sociais cientificamente carentes estarem mais fadados a manipulação de líderes – os novos mitos – ou ideias, devido à incapacidade fazerem julgamentos morais críticos (contraste ao cogito ergo sum) já fundamentados nos métodos racionais desses pensadores do século XVII.
Ademais, o exemplo anterior destoa, antagonicamente, da filosofia de René Descartes – que tem como um dos pressupostos na busca pela verdade a não aceitação de algo como verdadeiro antes de claramente o conhecer como tal – haja vista, a onda de fakes news que marcaram o cenário das últimas eleições presidenciais e que, claramente, demonstram o retorno de antigos ídolos. Ele ainda afirma que a epistemologia da substância humana é o pensar, por isso a arkhè cartesiana “penso logo, existo”, pois ao pensar em duvidar era certo de que se existia, derrubando achismos e falsas noções sem evidências. Consequentemente, nota-se agora o desuso dessas premissas devido a quase ausência de questionamento das informações e a elevação das opiniões como critérios científicos pela maioria da população, fragilizando a evolução do pensamento.
Torna-se evidente, portanto, a constatação que a ciência se encontra em uma posição subjugada no mundo contemporâneo, apesar desta ser a principal responsável pelas conquistas humanas até o globalizado contexto inserido. Dessa maneira, é essencial o resgate de filosofias tais quais a de Bacon e Descartes, que elevam a razão e a experiência como guia de conhecimento através de seus processos descritos, a fim de evitar novos Cabos das Tormentas rodeados de Gigantes Adamastores a serem enfrentados na plenitude do meio técnico científico informacional.
Luana Lima Estevanatto – 1°ano - Direito Matutino
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