A
pergunta inicial é o quão conservadores nós somos. De quais princípios não
abrimos mão? O que gostaríamos de manter na sociedade? Por que desconfiar dos
“salvadores da pátria”? O que precisamos reformar para mantermos a coesão
necessária?
Com um judiciário cada
vez mais ativo, somado ao fato de estarmos inseridos numa atordoante crise de
representatividade e a “vontade” legiferante do nosso país, no ano de 2011,
duas ações diretas de inconstitucionalidade (ADI 4277 e ADPF 132) chegaram ao
STF, “dizendo” que a união homoafetiva, não seria igual a união heteronormativa
e, portanto, não tinham os mesmos direito, seus “denunciantes”: Procurador-Geral da República e o Governador
do Estado do Rio de Janeiro. Temos então, um caso de “judicialização”, de
acordo com Barroso: “significa que algumas questões de larga repercussão
política ou social estão sendo decididas por órgãos do Poder Judiciário, e não
pelas instâncias tradicionais: o Congresso Nacional e o Poder Executivo” ou
seja, há uma expansão das atividades do judiciário, tornando-se mais presente e
atuante em diversos casos. Algo que está em discussão sobre sua real
legitimidade e competências, mas, por ora, é importante que algum poder
trabalhe em prol da população, afinal, o nosso judiciário é um dos mais caros
do mundo. Apesar de não lidar com o cofre, como disse a
presidente Carmen Lucia, eles sabem muito bem se aproveitar dele. Dai ao
direito o que é do direito e dai a política o que é da política, são mundos
diferentes.
Mas o assunto desta
semana versa sobre a união homoafetiva, o casamento (ou união civil) é uma
solenidade geradora de direitos e deveres, dentre eles de transmissão de
patrimônio, direitos previdenciários e cuidado familiar. E alto lá, não disse
aqui nem qual modelo de família, afinal, temos famílias de muitas formas e
situações, até as “do eu sozinho”. Em julho de 2013 o primeiro-ministro britânico,
do Partido Conservador, disse
o seguinte sobre o casamento homossexual: "Eu não apoio o casamento gay
apesar de ser um conservador. Eu apoio o casamento gay porque eu sou um
conservador”, há vídeo.
O mesmo ministro (e seu gabinete) defendem até mesmo que possam homossexuais
possam casar-se na igreja. E nada mais justo e normal que
também os gays queiram casar-se, o filósofo britânico Michael Oakeshott, já
falava sobre uma “disposição conservadora” em todos nós: “[...] a disposição
conservadora nasce de um attachment e de uma disposição para usufruir aquilo
que nos é familiar. E esse attachment não resulta da convicção de que o que nos
é familiar é necessariamente "o melhor". Antes de mais, o nosso modo
de vida é o nosso, aquele em que nos sentimos confortáveis, e que gostamos de
usufruir, basicamente porque nos é familiar.” Edmund Burke, outro conservador
lendário da Inglaterra defendeu os homossexuais e os católicos de seu tempo da
perseguição e da punição por pena de morte. É compreensível que muitas pessoas
achem a ideologia conservadora “chata, boba e feia”, e por outro lado, as
outras ideologias “limpinhas, cheirosas e monopólio das virtudes”, a Revolução
Francesa deu-nos uma orientação de derrubar tudo é muito mais proveitoso do que
a reforma gradual e ponderada. O marxismo comprou a ideia e pronto, todo dia
temos que ter um “Messias” e iniciar uma revolução sangrenta. Mas não passa de um ledo engano. Roger Scruton
pode-nos dizer mais sobre a ideologia conservadora aqui,
mas isto é assunto para dias vindouros.
Nesta questão
levantada, é animadora a decisão do STF em favor da união civil homossexual,
ela é importante em diversos sentidos, não somente material e no campo do
direito, mas no teor afetivo e estruturante socialmente que isso acarreta.
Infelizmente, ainda temos casos tenebrosos de homofobia e falta de respeito as
liberdades individuais em nosso país, e deveras, temos um caminho longo a ser
percorrido, mas isso não será resolvido com “julgados” e um ar embaraçoso de
“juristocracia”, o judiciário deve ser acionado o estritamente necessário, pois
há, comprovadamente
uma judicialização extremada em nosso país, somos legiferantes por natureza,
nossos fóruns vivem abarrotados e processos
morosos, intermináveis, o STF tem julgado até mesmo caso de
roubo
de galinha, torna tudo ainda mais preocupante e a necessidade
de reformas ainda mais latente. O
Direito não é a personificação do belo, do bom e do justo, não há super-heróis,
as mudanças precisam ser mais profundas e honestas, e principalmente, com
legitimidade. A crise de representatividade que se abateu sobre o Brasil faz
que com joguemos nossas expectativas sobre os fóruns e tribunais, algo
perigoso. Temos de nos admoestar e procurar soluções dentro do ideais
democráticos e decididos enquanto povo, não enquanto homens togados.
Entretanto, após esses
“parênteses”, acredito que a decisão da suprema corte é um alivio, e válida, afinal,
como cita Barroso: “Ao aplicarem a Constituição e as leis,
estão concretizando decisões que foram tomadas pelo constituinte ou pelo
legislador, isto é, pelos representantes do povo” e tem fundamentos normativos,
como este, além do filosófico, em que pese: “o intérprete final da Constituição
é o Supremo Tribunal Federal”. A sentença proferida não contraria preceito
algum, pelo contrário, apenas garante direitos já expressos e que eram negados
(em 2011, haviam 60 mil homossexuais em união estável pelo Brasil), facilitando
o dia-a-dia nas comarcas pelo país e trazendo coerência ao debate, além de
minar, um pouco, os arroubos preconceituosos. Ademais, a Constituição garante
que todos somos iguais perante a lei, se julgasse o contrário, o STF estaria
deixando de lado preceitos fundantes da nossa CF/88 como: Art. 4°, IX; Art. 5°,
os princípios de dignidade da pessoa humana, e o mais importante, o Art. 19°,
em seu inciso III que veta ao Estado “criar distinções entre brasileiros ou
preferências entre si” e querer casar-se ou manter uma vida como todo outro
qualquer ser humano não é, nem de longe, uma afronta a democracia, ao Estado de
Direito e nem, para os mais castos, uma afronta aos bons costumes, pois
casar-se é, senão, uma afirmação deles.
“A menor minoria na Terra é
o indivíduo. Aqueles que negam os direitos individuais não podem se dizer
defensores das minorias.” ― Ayn Rand
Victor Hugo Xavier, 1° Direito, Noturno.
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