A
BRASILIDADE,
SUA MALANDRAGEM E SEU CAPITALISMO
O racionalismo weberiano é tido
como essência fundamental ao pleno desenvolvimento do capitalismo. Desenvolvimento,
esse, que só encontraria condições sólidas de florescimento em culturas
protestantes onde o apreço pela disciplina, o louvor ao trabalho e o culto à
poupança fariam parte da psique local. O Brasil, em corrente oposta,
desenvolveu seu próprio espírito de capitalismo refutando à racionalidade
weberiana e sua disciplina, rigor e frugalidade.O capitalismo brasileiro,
possui características próprias que representam uma antítese à totalidade da
teoria weberiana sobre o progresso econômico pautado em profundas raízes protestantes.
Se nos EUA, na Alemanha luterana
e na Inglaterra a disciplina do trabalhador, o respeito à hierarquia e a
formalidade de conduta profissional e pessoal marcaram a ascensão da riqueza
burguesa, no Brasil, ocorreu o contrário. Em uma cultura marcada pela
flexibilidade, desrespeito ao império da normatividade, por espontaneidade, o
jeitinho brasileiro traduziu o funcionamento da sociedade brasileira desde sempre.
O homem comum, ao contrário do idealizado em culturas anglo-saxônicas, foi representado
na forma do “malandro”. Enquanto, nos EUA e em outros países, a idolatria ao
mito do self-made man permeava todas
as esferas sociais, no Brasil, o malandro tornou-se símbolo nacional em um país
marcado pela síndrome de vira lata. Disseminou-se a ideia nos sambas de
Martinho da Vila, no pornô chanchada dos anos 70, na literatura de Jorge Amado,
Nelson Rodrigues; na brasilidade de Chico Buarque. O ideal do malandro
tornou-se, então, modelo social. Se o brasileiro não era rico, disciplinado e culto
como europeus e americanos ele teria outras qualidades; ele saberia fazer música,
criar uma família desfavorecida,seria um homem superior preparado para encarar
todos as dificuldades oferecidas por instabilidades políticas ,crises
econômicas, desigualdade social, preconceito racial, opressão policial. Na
figura de Bezerra da Silva, a malandragem atingiu o seu ápice, e nela, o mito do pobre trabalhador reflete a origem
do espírito do capitalismo à brasileira.O brasileiro, portanto, seria descrente
de seu país, mas crente em si e no sonho do país do futuro.
A malandragem retrada tanto por
Bezerra como por diversos artistas evidenciaram a vocação do país para as
indústrias criativas. Na música, no cinema, na teledramaturgia, na moda, no
design, na publicidade o país é símbolo de excelência. Através de um passado imprevisível
e quadros socioeconômicos voláteis, o brasileiro se tornou o mais adaptável dos
povos. E essa característica, a da fácil adaptação, da flexibilidade, foi
fielmente incorporada ao discurso do mito do malandro. Isso se deu de tal forma
que o brasileiro comum sentiu-se motivado a inovar, a ousar, a se arriscar, a empreender.
Por meio de anti-heróis como Bezerra da Silva que o morador de comunidade
carente, o trabalhador rural e a classe média, a última ainda que secretamente,
encontraram luz para sonhar com um futuro melhor. Se a máquina irá substituir a
função humana em praticamente toda cadeia industrial, ela ainda não será capaz
de superar a capacidade de criativa de da mente humana. O rigor, a disciplina,
a austeridade, o sacrifício da filosofia protestante sustentaram o modelo
industrial de capitalismo, mas para o modelo pós-industrial necesita-sse de
flexibilidade, criatividade, espontaneidade e diversidade, qualidades essas
presentes na alma de todo “malandro”, de todo brasileiro.
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