O positivismo, corrente filosófica do século XIX, surgiu no contexto da Revolução Industrial e do Iluminismo com a intenção de identificar os diversos problemas sociais presentes por meio de um conhecimento baseado em fatos e dados verificáveis, excluindo explicações metafísicas ou religiosas. Nesse cenário, o positivismo influenciou diversas áreas do saber, como a sociologia, a educação, o direito e, especialmente, o entendimento sobre o comportamento desviante, incluindo a criminalidade.
Para Comte, a humanidade evolui em três estágios: o teológico, o metafísico e o positivo, no qual a razão e a ciência substituem crenças sobrenaturais na explicação da realidade. A criminalidade, nesse último estágio, passa a ser compreendida não mais como um pecado ou uma falha moral, mas como consequência de fatores sociais ou biológicos, que podem ser analisados e tratados. Essa visão influenciou diretamente o surgimento da sociologia e da criminologia modernas, propondo que a organização social deve se basear na ordem, no progresso e na racionalidade.
Essa tentativa de controlar o comportamento desviante com base na ciência e na razão também é explorada de forma crítica no filme Laranja Mecânica, dirigido por Stanley Kubrick. Na trama, o jovem delinquente Alex é submetido a um tratamento experimental chamado “método Ludovico”, que visa reprimir seu impulso violento por meio de condicionamento psicológico. A proposta é reabilitá-lo com técnicas científicas, eliminando sua capacidade de escolha moral. Essa abordagem reflete uma visão positivista extrema, que enxerga a criminalidade como algo a ser corrigido tecnicamente, desconsiderando a subjetividade e a complexidade do indivíduo. Ao transformar o protagonista em alguém incapaz de exercer sua liberdade, o filme questiona até que ponto a ciência pode ser usada para moldar o comportamento humano sem violar princípios éticos fundamentais. A pergunta que emerge, então, é: estaríamos diante de uma ordem fora do mundo, artificial e desumana, ou de um mundo fora de ordem, onde o controle total se impõe como solução? Essa dualidade revela os limites e as contradições do uso da racionalidade para controlar o desvio social.
Portanto, embora o positivismo tenha contribuído para o entendimento racional da criminalidade, sua aplicação rígida pode levar a práticas desumanas e autoritárias. O filme Laranja Mecânica evidencia esse risco ao mostrar os efeitos de um controle social baseado exclusivamente na técnica. Assim, frente à tensão entre uma ordem imposta e a complexidade do real, é necessário equilibrar ciência e ética ao lidar com comportamentos desviantes, reconhecendo que nenhuma sociedade se sustenta apenas na lógica da dominação racional.
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