A arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 54
tratou do caráter de constitucionalidade ou não, do tratamento dado pelo Código
Penal, a conduta de interrupção da gravidez no caso específico da anencefalia.
Com um Acórdão favorável as liberdades sexuais e reprodutivas da mulher nesses
casos, é possível fazer uma análise dos fatos à luz do pensamento de Bourdieu e
“O poder simbólico” de que ele trata. Serão trabalhadas as dimensões do
ordenamento jurídico e as classificações dos operadores do direito para a
discussão.
Bourdieu se
posiciona de maneira contraria a ambos Instrumentalismo Marxista – na medida
que o direito não seria um mero instrumento de classe – e Formalismo de Kelsen –
sendo o direito passível de influência de pressões sociais, bem como se
configura a Judicialização, distinta do Ativismo Jurídico -. O direito existiria,
então, além do controle de classe e de sua forma puramente científica, sendo os
instrumentos do campo jurídico de Bourdieu passíveis de ativação pela
sociedade.
O fator do “Poder
Simbólico”, tratado por Bourdieu, se revela não apenas nos embates entre operadores
e doutrinadores na dinâmica de luta simbólica da aplicação do direito tratada
por Bourdieu, mas também na ativação do Judiciário no Julgamento da ADPF 54 em
prol da condição da mulher. Esse poder emana da própria condição feminina, na
medida que as mulheres são capazes de maior credibilidade no acionamento do
direito para a resolução do conflito tratado na ADPF específica, sendo
consideradas agentes da mobilização desse direito. Essa credibilidade feminina
advém principalmente dos desafios dos Operadores no processo de molde das
Doutrinas, da adequação do fato a norma, tratada na Teoria tridimensional do
direito de Miguel Reale. A condição do anencéfalo como nascituro com direitos
resguardados – artigo 2° do Código Civil de 2002 -, e o embate hermenêutico da
definição da morte como aspecto neurológico, abrem espaço para a atuação da
mulher como agente, na medida que o aborto de anencéfalos, como trata a ADPF e
seu Acórdão favorável a tal medida, resultam no interesse da mulher e seu bem
estar como direitos fundamentais, resguardados na Constituição Federal.
O limite dessa
hermenêutica dos Operadores é configurado pelo “Espaço dos Possíveis” de
Bourdieu, na medida que esse espaço se configura pelas relações de força do
campo do direito – disputas doutrinárias e hermenêuticas -, e a lógica interna
das disputas – que baliza todo o ordenamento na doutrina, jurisprudência e o
próprio direito -. O “Campo Jurídico” de Bourdieu se define nessa dupla
relação, sendo sempre constituído da lógica positiva da ciência – o racional, a
doutrina -, juntamente com a lógica normativa da moral – presente em certo
espaço, em certa época -. No caso específico da ADPF, Bourdieu se faz visível
nessa dimensão, na medida que o produto da análise da referida Arguição é
justamente a mudança da lógica normativa da moral pela aplicação da doutrina ao
caso concreto, feita pelos Operadores do direito.
Essa estrutura do
Campo Jurídico é excludente, na medida que a não adequação aos símbolos e
códigos de determinado campo irá culminar na impossibilidade de participação e
integração do mesmo. O fator de domínio, que está presente no direito e que,
embora não seja a única vertente – Instrumentalismo -, se configura pelas suas simbologias
e estruturas de distinção internas. A incorporação dessas estruturas pelos movimentos
sociais na luta por direitos ocorre justamente na judicialização, da qual a
ADPF faz parte. No direito, o “Habitus” dos movimentos de luta por direitos
devem sempre adquirir uma roupagem doutrinária, jurisprudencial e
Constitucional, se adequando ao Campo Jurídico de Bourdieu e tomando
legitimidade por meio da adequação formal da linguagem, “Neutralizando” medidas
com ímpeto social para proporcionar a “Universalidade” do direito, aspectos
trabalhados por Bourdieu.
Aluno: Gabriel Garro
Momesso Turma: XXXV Direito Diurno
Nenhum comentário:
Postar um comentário