As relações humanas são extremamente diversas e complexas,
em cada sociedade, em diferentes momentos, sobre diferentes olhares culturais,
fazer um recorte social e entende-lo nunca é uma tarefa fácil. E a ciência jurídica
não foge dessa lógica, por ser um campo que está em contato direito com as
relações humanas e seus desdobramentos, essa é uma área polémica e sensível, um
exemplo dessa situação é o aborto de anencéfalos.
De acordo com a decisão do STF de 2012, a respeito do
julgamento da Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental 54, o aborto no caso
comprovado de anencéfalos não configura uma contravenção penal. Essa decisão gerou
muitas controvérsias, os grupos religiosos e “provida” são veemente contra, já
as associações médicas e de defesa da emancipação feminina dizem que essa
decisão é a correta.
Fato é que o Direito não é algo
segregado da sociedade, essa é uma matéria simbiótica a sociedade, toda e qualquer
decisão jurídica gera consequências à população, às vezes essas decisões são simples
e não geram muito debate, já em outros casos há uma intensa resistência da
opinião pública. Como Bourdieu
explica o direito não deve ser entendido como uma ciência rígida, com leis pétreas
que não seja possível a interpretação pelos diversos campos do conhecimento, o
ordenamento jurídico deve ser analisado e aplicado com parcimônia para que
possa atender tanto a complexidade social, quanto para o próprio direito.
Outra questão relevante no que tange ao aborto de anencéfalos é o poder
simbólico que os diferentes grupos sociais carregam que Bourdieu também abordo
em seu trabalho. Cada grupo tem um viés e um peso nessa discussão, para os
grupos religiosos e provida toda vida é sagrada (mesmo no caso de anencéfalos,
onde os bebês não sobrevivem mais do que alguns dias após o parto), para os
grupos médicos e femininos a gestação do anencéfalo é um risco a saúde da mãe e
uma tortura psicológica, e para o judiciário fica o símbolo de guardião legal,
que deve medir os conflitos e chegar a uma resolução que respeite os
conhecimentos médicos, acerca deste assunto, e a moral da sociedade.
É evidente de que essa não é uma discussão simples, apresenta vários
lados, muitas ponderações e pouquíssimas respostas que agradem a maioria.
Entretanto a decisão do STF de permitir o aborto de anencéfalos é a mais
coerente, já que leva em conta o conhecimento médico que define a vida como a
capacidade de ter sinapses cerebrais, entende o risco de vida que a mãe sofre,
os problemas psicológicos que a mãe enfrenta, respeita o ordenamento jurídico a
cerca da vida digna, tanto da mãe, quanto do bebê, já que esse não pode ter uma
vida por mais de alguns dias e não desenvolve qualquer interação com o mundo.
Essa não é uma decisão fácil de ser tomada pelo direito nem pela mãe, mas
é a necessária para o progresso do ordenamento jurídico e da sociedade, é tratando
de temas assim delicados, com a devida atenção e compreensão das diversas
facetas morais, sociais, médicas, jurídicas, etc, que pode haver um
desenvolvimento.
Yannick Noah Ferreira Silverio – Turma XXXV(matutino)
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