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segunda-feira, 9 de novembro de 2015

O Direito e a possível emancipação social

“Temos o direito de ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito de ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza. Daí a necessidade de uma igualdade que reconheça as diferenças e de uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades.”
É com essa citação do autor, Boaventura de Sousa Santos, que inicio o post da semana. Se tratando de relacionar seu pensamento com a instituição de cotas raciais nas universidades públicas, apenas essa citação já sintetiza: as cotas são justas e legítimas, visto que o reconhecimento da diferença funciona como complemento da busca pela igualdade.
Com a chegada do Estado liberal, a emancipação social deixou de ser perspectiva oposta à regulação social e passou a ser seu duplo. Dessa forma, há duas estratégias para tal emancipação, de acordo com o autor. A parlamentar – em que há a expansão do alcance do contrato social, sem fratura da estrutura liberal – e a revolucionária – que assume a forma de confrontação ilegal com o Estado ou com a economia capitalista. As ações afirmativas são medidas legalistas, isto é, são o alargamento da cidadania política e social das classes subalternas, sem a fratura da estrutra liberal. Já as lutas sociais vão de encontro ao Estado e à economia capitalista. Contudo, as cotas não surgiram como uma generosidade da classe dominante, mas foram conquista do movimento de resistência negra, o que uniu a estratégia revolucionária e a parlamentar, classificadas em oposição por Boaventura.
Outra discussão feita pelo autor é sobre a instabilidade e fragilidade dos contratos, que são, quase sempre, objeto de relações privadas. Esse fator muito tem a ver com a mudança do caráter da militância. Hoje, nos deparamos com um ativismo individualista, onde há busca pela protagonização pela protagonização, sem visar a emancipação coletiva. Mais um fruto da pós modernidade.
O enfraquecimento dos movimentos já era um temor de Boaventura, que propôs o desenvolvimento de uma teoria que procurasse promover entre os movimentos e lutas uma compreensão mútua para que todos pudessem se beneficiar das experiências dos demais e com eles colaborar. Contudo, até que ponto isso é possível? Nesse espaço, mulheres seriam oprimidas pelos homens, homossexuais seriam oprimidos por heterossexuais, negros seriam oprimidos por brancos, pobres seriam oprimidos por ricos. Haveria silenciamento e apagamento. Há a necessidade de espaços exclusivos para auto organização e possível aproximação posterior com outros grupos.
Mas, voltando à questão do julgado, as cotas evidenciaram fascismos sociais já classificados pelo autor. Por exemplo, o fascismo do apartheid social ficou nítido na demarcação de espaço empreendida pelos alunos da Universidade Presbiteriana Mackenzie, onde mensagens de ódio foram escritas para os cotistas e alunos negros. O fascismo contratual é evidente quando observamos que, apesar da Universidade ser pública, os discentes, inclusive os cotistas, devem pagar o ticket do Restaurante Universitário e também inscrições para eventos e minicursos bancados pela iniciativa privada e necessários para a aprovação na matéria de Atividades Complementares. Por fim, o fascismo da insegurança está presente no fato que, novamente, a Universidade é pública, mas a alimentação, o transporte, as xérox são pagas. Os alunos cotistas não se sentem bem-vindos e pertencentes à Universidade.
Para concluir, respondo à questão de Boaventura. PODERÁ o Direito ser emancipatório? Bom, a luta pelos direitos, por intermédio do Direito, deve ser integrada à luta política, portanto, se não emancipatório, o Direito é, pelo menos, essencial na luta por direitos. Agora, o Direito É emancipatório? Eu acredito que, por si só, não. Mas os movimentos sociais o utilizam como ferramenta para alcançar a emancipação, e assim deve continuar.
A estabilidade dos mercados e dos investimentos só é possível à custa da instabilidade das expectativas das pessoas, ou seja, o capitalismo se assenta na manutenção das opressões de gênero, classe e raça. A conquista das cotas raciais foi uma afronta a essa estabilidade. Uma afronta ao Estado liberal. Uma afronta ao racismo e segregação institucionais. A conquista das cotas raciais foi uma emancipação pelo Direito. 

Gabriela Alves Fontenelle - 1o ano Direito - noturno

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