Em seu texto “Poderá o Direito ser Emancipatório?”
Boaventura de Souza Santos trata da dialética entre o direito como regulador
social e as lutas pela emancipação social, que anteriormente se configurava em
uma “rivalidade” onde se encontravam de lados opostos: de um lado as lutas
sociais revolucionárias com objetivo de emancipar grupos oprimidos e buscar
seus direitos, e do outro a regulação social impedindo, ou dificultando, tais
mudanças “cimentando”, de certa forma, a atuação e interpretação do direito
dentro dos limites do positivo. Contudo, gradualmente, emancipação e regulação
foram convergindo, e então as lutas pela inclusão de grupos sociais minoritários
e negligenciados dentro do contrato social passaram a ocorrer através da
regulação por meios legais, proporcionando e garantindo direitos a partir de um
reformismo gradual, como defendem os demoliberais e demo-socialistas, ao
contrário dos socialistas radicais que veem como única saída uma ruptura
revolucionária.
As Ações afirmativas - medidas tomadas pelo
Estado com o objetivo de eliminar, ou ao menos amenizar, as desigualdades
historicamente acumuladas e garantir uma maior igualdade de oportunidades,
compensando as perdas causadas pela discriminação sofrida por essas minorias –
são justamente uma forma de emancipação utilizando os meios legais para isso, e
tem-se como um dos exemplos de ação afirmativa a implantação do sistema de
cotas raciais nas universidades brasileiras. As cotas nada mais são do que uma
forma de garantir oportunidades aos negros de cursarem um ensino superior e alcançarem
objetivos profissionais e boas condições de vida assim como os grupos
privilegiados, no caso os brancos, possuem, sendo uma meio eficaz para a
concretização do princípio constitucional da igualdade, como defende Oscar
Vilhena no julgamento do STF a respeito das cotas na Universidade de Brasilia.
Após séculos de escravidão e uma bagagem histórica de
preconceitos e hierarquias de raças que se perpetuou mesmo após o seu fim, e
encontra-se enraizada na cultura popular até os dias de hoje apesar da máscara
do discurso de igualdade, os negros ainda são minoria nas universidades e
sofrem as consequências dessa herança no que diz respeito a qualidade de vida,
condição financeira, segurança nas ruas, etc. Por isso, então, é clara a
necessidade da intervenção do Estado afim de reparar os danos causados a esse
grupo, embora não seja claro para todos. Os conservadores, como trata
Boaventura, baseiam-se naquele direito limitado e inflexível para barrar as
conquistas sociais e impedir a inclusão dos excluídos ao contrato social, utilizando
como argumento clássicos discursos do senso comum conservador de que tal medida
vai contra o princípio de igualdade de oportunidades e da meritocracia, além de
criticar a efetividade desse sistema, como faz o partido dos Democratas, incitando
o chamado facismo social, como diz Boaventura, que não emana do Estado, mas sim
de pessoas da sociedade que internalizam e proclamam esse tipo de discurso.
Embora ainda existam muitos debates e divergências a
respeito desse assunto, ao se fazer uma análise profunda e crítica a respeito
de todo o contexto histórico social responsável pela situação discriminatória
vivenciada pelos negros, e não apenas uma análise superficial e ilusória, é
possível inferir indubitavelmente a necessidade e a obrigação da atuação do
Estado no que diz respeito a condição dos negros no Brasil, cumprindo sua
função de atuar positivamente no combate às desigualdades de qualquer natureza,
como diz a Constituição de 1988.
Letícia
Rodrigues Santana , 1º ano Direito- noturno
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