Total de visualizações de página (desde out/2009)

domingo, 24 de setembro de 2017

Self Made Man

    Em um museu, uma mulher observa uma escultura.
   Ruídos inconvenientes ao redor, advindos de murmúrios contemplando outras obras. Flashes de câmeras garantiam status no instagram e, se acompanhadas por uma legenda roubada, vendiam bem uma vida feliz de um intelectual de fachada. Cabeças baixas digitavam mensagens extasiadas no celular e passavam, obra após obra, selecionando a que daria mais likes. Dezenas de máquinas caminhavam pelo museu sem enxergar uma única obra, mecanizados por uma conduta valorativa de dominação e prevalência de vontades. Ruídos barulhentos inundavam o salão, mas entre a mulher solitária e a escultura era possível ouvir o som do silêncio.
    Seus olhos inquietos observavam a escultura e seus pensamentos se intensificavam ao passo que sua cabeça tombava para a direita. “Escultura idiota”. Os dedos corriam displicentemente pelo cabelo cacheado. “Um homem construindo a si mesmo, entalhado a pedra, em uma sociedade estúpida que se diz meritocrática. A realidade não corresponde a esse tipo ideal…”. “Preenchemos nosso tempo com trabalho, sempre disputando por recursos escassos. Poder, legitimidade, status… Não nos importamos com o jogo. Queremos ganhar”. “Somos escravos do dinheiro que tanto cobiçamos. Metrificamos nosso tempo por ele, não para gastá-lo mas para tê-lo. Não por um fim, mas por um meio. E nos iludimos em pensar que esforço e sucesso são diretamente proporcionais. Como se mérito, somente, de fato ditasse alguma coisa”. Interrompeu o movimento do dedo que enrolava um cacho, e deslocou uma porção de cabelo para de trás da orelha. Braços cruzados, o peso do corpo concentrado sobre uma das pernas. Postura imponente e olhos sedentos. “Damos um caráter divino ao dinheiro. Como se sucesso econômico significasse boa-venturança divina. Uma resposta de Deus, de que Ele está feliz com minhas ações”. Suspirou….“O que é sucesso?”.
    “Gastamos nossas vidas tentando ganhá-las”. As palavras do pai ecoaram em sua cabeça. “Produzimos sem sentido e consumimos sem necessidade. Vivemos em uma sociedade semiúrgica e pagamos os preços de seus significados”. “Jamais pague um preço alto de mais, minha pequena. Nunca vale a pena…”.

    A mulher rompeu o contato visual com a escultura, olhou o reflexo da sociedade ao redor e se dirigiu à saída. “Tarde demais, pai. Tarde demais…”.

Abner Santana de Oliveira. 1º Ano, Direito- Noturno.

Nenhum comentário:

Postar um comentário