Falar de cotas geralmente gera
discussões acaloradas entre as partes favoráveis e contrárias à medida paliativa,
principalmente quando um partido político entra com uma ação judicial contra o
sistema de ingresso de estudantes cotistas na Universidade de Brasília. Além de
ser um tema polêmico por síntese, o caso ganhou destaque por se tratar de mais
uma luta de interesses ideológicos entre partidos, que ultrapassou o debate
político, que visa o interesse nacional, e adentrou o campo dos interesses
individuais que visam apenas a disputa pelo poder.
Para melhor fomentar a discussão a
respeito da decisão judicial de não acatar o pedido do partido Democratas
(DEM), utilizo-me das ideias do professor Boaventura de Souza Santos, que
acredita que o Direito possa, sim, ser ferramenta de bem-estar social e não
somente social em sua forma normativa, que reconheça e reformule as diferenças
sociais, além de defender os pequenos grupos (minorias) dos ensejos egoístas
das classes hegemônicas que contém o controle do poder do Estado.
Dessa forma, em concordância com
Boaventura, acredito ser dever, sim, do Direito, garantir os direitos
fundamentais dos indivíduos que fazem parte do seu ordenamento jurídico, dessa
forma, é papel do Estado ser agente garantidor das normas constitucionais que
defendem os direitos intrínsecos ao ser humano. Logo, por ser um direito
fundamental, a educação deve ser provida pelo Estado, deve ter qualidade, além
de ser acessível à todas as pessoas. Assim, as cotas são fundamentais para
solucionar problemas históricos e estruturais graves, e devem ser entendidas
como uma garantia do direito à educação, afinal, sem essa medida
extraordinária, muitas pessoas continuaram com defasagem no ensino, tendo em
vista que a espera por uma mudança estrutural não obriga esses indivíduos a
ficarem sem a garantia de seu direito por determinado período de tempo, em que
esperam as transformações estruturais.
Fazendo um paralelo com outro
grande estudioso do Direito, Hegel, Boaventura se diferencia do alemão ao afirmar
que o Direito é instrumento social. Dessa forma, ele é objeto nas mãos de quem
detém o poder de ação, podendo contribuir para a opressão de grupos, e em mesmo
sentido, servir de apoio às minorias sociais, como forma de libertação do
controle exercido pelos atores do poder social, e como forma de garantia dos
direitos e anseios desses grupos que possuem poucos representantes no
ordenamento jurídico e até mesmo no Executivo e Legislativo.
É, também, perceptível outra
diferença com outro grande sociólogo alemão, que defendia essa
contra-hegemonização, Karl Marx. Para esse, a forma de mudança social viria
através da revolução, diferentemente de Souza Santos, que deixa claro que o
poder hegemônico vai existir, mas que a mudança vem através da adaptação das regras
aos interesses dos pequenos grupos, para que esses usem o Direito e não as
armas para lutar pela igualdade social e constitucional. Dessa forma, fica evidente que as cotas são uma medida defendida pela teoria de Boaventura, de utilizar o sistema vigente como forma de contribuir para acabar com as desigualdades sociais.
Estevan Carlos Magno - Ano 1
Direito Diurno
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