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domingo, 4 de maio de 2025

Escala 6x1 e automação do trabalho: contradição que destrói.

 Às 4h30 de mais um sábado, Seu Luiz acordava para ir ao trabalho. Com 55 anos, sua rotina consistia em acordar cedo durante 6 dias da semana, pegar o primeiro ônibus até a indústria carbonífera onde prestava serviços e, durante todo o resto do dia – e até parte da noite –, carregar sacos e mais sacos de materiais a granel. Assim, ele sacrificava um dos dias de seu final de semana em prol de seu trabalho, visto que não tinha outra opção – precisava prover uma vida minimamente digna a si, sua esposa e seus 3 filhos. 

Seu Luiz não era um homem saudável. As rugas em seu rosto já estavam mais do que visíveis, as marcas do tempo em seu corpo foram impulsionadas pelo árduo trabalho dependente de força e o psicológico já estava destruído pela falta de lazer e tempo com seus entes amados. A esposa, preocupada com a saúde do marido, já havia alertado que aquele trabalho era prejudicial e que talvez houvessem outras oportunidades mais leves, mas Seu Luiz batia o pé: para ele, era preciso valorizar a chance que Deus havia lhe dado naquele momento. Por isso, agora, ele cumpria mais um dos elementos de sua rotina cansativa, chegando em seu ambiente de trabalho. Entretanto, quando estava quase alcançando o portão de entrada, avistou seu amigo, Rubens, chorando desesperado; preocupado, foi perguntar o que havia acontecido.

— O que foi, meu amigo? 

— Fui demitido, Luiz. Eu não fiz nada de errado! Sempre me dediquei inteiramente a essa empresa…

– Calma, Rubens! Deve haver alguma explicação plausível por trás disso. — Seu Luiz disse, tentando confortar o amigo. — Eu posso tentar falar com o chefe, ele é meu amigo, confia em mim, e vai me contar o que realmente aconteceu. 

Assim, Seu Luiz entra na empresa, destinado a falar com o chefe do departamento em que trabalhava. No caminho, ele tromba com o homem que procurava, e eles têm uma breve conversa:

— Luiz, bom dia! Eu estava mesmo precisando falar com você. Me acompanhe até a minha sala, por favor. 

Ao entrarem na sala, os dois homens se sentaram e o chefe – um homem alto, de 32 anos – começou a falar: 

— Então, eu sei que essa não é uma conversa fácil, então preciso ser direto com você. Nossa empresa precisou realizar um corte de funcionários e, infelizmente, você está incluso. Antes de ir embora, passe no RH para finalizar a sua demissão. 

Seu Luiz ficou em estado de choque. Tinha ido até lá justamente para perguntar o porquê da demissão de Rubens e, agora, também estava sendo demitido. Um flashback de coisas passava em sua cabeça, do momento em que havia sido contratado – 30 anos atrás – até o momento em que já tinha sacrificado tudo o que tinha em nome do trabalho; os gastos com médicos e exames, as reclamações da esposa e a falta de convivência com os próprios filhos rondavam sua mente sem parar. Seu Luiz trabalhava arduamente de segunda à sábado, usava o domingo para dormir o máximo que podia, mal brincava com os filhos ou assistia TV com a esposa e, mesmo assim, ainda defendia seu trabalho com unhas e dentes. Era isso que ele merecia? Uma demissão tão fria, vinda de alguém que ele considerava um amigo, e sem nenhuma explicação? Era impossível explicar o que ele estava sentindo naquele momento, a dignidade de sua família estava em perigo. Dessa forma, Seu Luiz pegou suas coisas e, antes que pudesse sair da empresa, ouviu a conversa de dois funcionários jovens: 

— As máquinas já chegaram. Vão substituir os funcionários que foram demitidos, sabe?

— Aham. Acho que vai ser ótimo pra empresa ter esse toque de tecnologia. As máquinas vão trabalhar muito mais rápido do que um humano e o lucro da empresa vai aumentar muito. 

Seu Luiz parou de ouvir. Saiu da empresa para nunca mais voltar, triste de ter que dar a notícia para sua família.


Em conclusão, a história de Seu Luiz representa a realidade de milhões de trabalhadores que, mesmo dedicando a vida inteira ao trabalho sob regimes exaustivos como a escala 6x1, acabam sendo descartados sem consideração nenhuma. Sob a ótica de Karl Marx, esse cenário escancara a lógica da alienação e da exploração: o trabalhador não é dono do que produz, tampouco do seu próprio tempo ou corpo. A chegada das máquinas, longe de significar um avanço humano, serve às grandes empresas para maximizar lucros e reduzir custos, intensificando ainda mais a desumanização do trabalho. Nesse sentido, enquanto os meios de produção permanecerem concentrados nas mãos de poucos, a dignidade do trabalhador continuará sendo ignorada — e histórias como a de Seu Luiz seguirão se repetindo, silenciosamente, sob o peso frio das engrenagens do sistema.


Ana Carolina Tiozzo Mascarenhas, 1º ano de Direito (matutino). 


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