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sábado, 26 de março de 2016

O autoflagelo da humanidade

A obra de Fritjof Capra, Ponto de Mutação, nos introduz à teoria holística, que vê o mundo como um único sistema, no qual tudo está interligado, e a compara com o mecanicismo cartesiano, ainda a base da percepção do mundo das pessoas em geral. O filme mostra a conversa entre uma cientista, um político e um poeta, na qual a mulher desconstrói os conceitos ultrapassados deles, e à luz da física, da sociologia, da biologia, da economia, e de outras áreas do conhecimento, apresenta a visão sistêmica do mundo e os convence da fonte real dos problemas mundiais.
A compreensão mecanicista vê o mundo como se fosse uma máquina, surgiu com René Descartes, em seu pensamento metodológico, no século XVII, com a ascensão da burguesia e da modernidade, assim enxergava a solução dos problemas como peças defeituosas a serem trocadas, porém desconsiderava todas as outras conexões; ou seja, atua na consequência do fato e não em sua causa, o que mostra a limitação que tal visão possui, pois o mundo tem tantos problemas, que não podem ser revolvidos separadamente como se fossem peças. É feita uma analogia com a medicina atual que pesquisa a cura de doenças cardíacas, por exemplo, sendo que seria muito menos trabalhosa, dolorosa e onerosa a introdução de uma mudança de hábitos alimentares, agindo assim, na raiz da enfermidade; mas é sabido que a estrutura regente do comportamento das pessoas depende de fatores externos ao que concerne a impotência dos dominados e afetados pelas adversidades da sociedade, inviabilizando a transformação.
            As novas tecnologias surgem, então, a fim de solucionar somente o que atinge quem tem poder de compra para financiar pesquisas, há uma elitização do conhecimento, gerando maiores complicações, pois tais técnicas não se propuseram a saná-las de forma ampla, assim transferem-nas a outrem. Desta forma, além do conhecimento estar à disposição de poucos, os quais determinam o destino do mundo, uma vez que, de acordo com Francis Bacon, este tem o poder de dominação, é usado de forma antiética para atrocidades que envergonham a humanidade, resultando na destruição da própria natureza, objeto de estudo da ciência. O erro do mecanicismo foi que, corroborado pelas leis naturais de Newton, explicava os fenômenos da natureza no século XVII, destarte acreditava-se que os problemas estariam resolvidos, no entanto foram deslocados, pois não foram examinados holisticamente.
Chega-se a conclusão de que o mundo muda mais rápido do que a percepção das pessoas e que precisa-se de uma nova, mais abrangente, que dê mais firmeza e força na compreensão da realidade, com uma estrutura científica coesa e coerente: a teoria dos sistemas vivos. Sua fundamentação metafórica e prática é que, como os átomos e as partículas subatômicas, tudo e todos estão conectados por forças e que juntos formam uma teia, um sistema, que compõe todo o universo. Desta maneira, as coisas devem ser vistas como um todo, pensando nos princípios de organização da vida e de sua natureza interdependente.
            O individualismo do homem é tamanho que sua busca incessante pelo conhecimento causa sua própria deterioração, já que a natureza é finita para fornecer os bens que ele usa para nutrir o egocentrismo de seu poder de dominação. Ao passo que a humanidade caminha em direção ao fim, a natureza continuará se renovando, se organizando, se mantendo, se transcendendo, pois um sistema vivo depende do ambiente, mas este não é determinado por aquele. A natureza cria novas formas, a evolução é sobre criatividade, não sobre adaptação; e o ser humano se limita à co-evolução, pois evolui com o planeta, depende do ambiente, também parte do sistema. Portanto, ou o homem amplia seu campo de visão para melhorar a vida humana como um todo em busca de uma sociedade sustentável ou irá se autoflagelar patologicamente e inconscientemente; pois maioria dos entraves hodiernos, sejam sociais, econômicos ou ambientais, provém do nocivo ideal de crescimento excessivo.

Henrique Mazzon - Direito Noturno

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