Sinhá Vitória sabia que os meninos podiam conseguir uma vida
melhor, diferente daquela que sempre tivera. Ela sabia que existia algo que era
maior que a pobreza, que a seca e que a fome daquele sertão, sabia que só uma
podia romper com o círculo contínuo da vida: a palavra. A única que proporcionava capacidade de
conhecimento, de entendimento e discernimento, com ela seria igual seu Zé da
Bolandeira. Já Fabiano não mais seria enganado, não se submeteria ao guarda
amarelo nem ao patrão, porque não mais seria bicho. Com a palavra seria gente, pois
o conhecimento lhe faria ser.
Graciliano Ramos, ao propor em
sua obra “Vidas Secas” personagens como Fabiano, abre discussão sobre qual a
principal característica humana dos homens e afirma ser a palavra que, vagando
pelo contexto, significa o conhecimento e a capacidade de diferenciar o
verdadeiro do falso, perceber as certezas traiçoeiras e até de duvidá-las. E,
mesmo sendo publicada quase 300 anos depois, ela esbarra em um método que
revolucionou o pensamento do seu século ao colocar a racionalidade como meio
principal de se explicar o mundo, criticando o antigo método da observação e
crença na revelação dos mitos ou magia, denominado por “Discurso do Método” e
escrito por Descartes, a obra revela os complexos da razão.
Esta é
algo inerente ao homem, ou seja, independe do sábio e do filósofo e entendida
como bom senso ou capacidade de discernimento, além de ser o valor normativo do
mundo, como a aplicação do bom espírito e digna de ser acumulativa, pois o “conhecimento
é o pretexto para mais conhecimento”, como exposto pelo professor Agnaldo
Barbosa. Fabiano é animalizado pelo autor pelo fato deste não conseguir possuir
a razão ou o senso de discernimento, posto que, segundo Descartes, é a única
coisa que nos difere dos animais e nos torna homens, porque dominar a palavra e
deter conhecimento implica em pensar, e o pensamento é a característica do homem
que o faz existir.
O
método de procurar a razão de Descartes na obra de Graciliano expressa um
conceito fundamental: o poder que a razão teria de vencer as convicções
pessoais das personagens, por isso através da educação ela poderia acabar com a
cíclica da miséria e sugerir uma vida melhor e humanizada. No “Discurso do
Método” temos que “E eu sempre tive um enorme desejo de aprender a diferenciar
o verdadeiro do falso, para ver claramente minhas ações e caminhar com
segurança nesta vida”, dizendo que o discernimento, que é a razão, nos leva à
melhor escolha e que pra isso não é necessária uma cama de fita de couro, ”é
que, para ser, não necessita de lugar algum, nem depende de qualquer coisa
material” apenas daquilo cuja natureza já foi dada por Deus: o pensamento. Karla Gabriella dos Santos Santana,
aluna ingressante do curso de Direito Diurno - UNESP
Introdução à Sociologia - aula 2
Nenhum comentário:
Postar um comentário