Uma das maiores criações no estudo sociológico e antropológico no estudo da sociedade brasileira é a análise tendo em vista a preponderância do “Jeitinho brasileiro” presente em vários segmentos ao se observar as relações público-privadas no Brasil.
Em tempos de pandemia, esse discurso volta à tona por serem observadas diversas situações onde as regras rígidas impostas para a manutenção da saúde de todos são postas em suspensão em situações onde há abuso de autoridade ou simples violação impune de uma norma que deveria se aplicar a todos. A questão é: essa situação é realmente fruto de um chamado “jeitinho brasileiro”?
Construída sobre observações de autores como Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Roberto DaMatta, a noção do “jeitinho” pressupõe uma característica comum de todo brasileiro, derivado de uma continuidade cultural luso-brasileiro. Sob uma ótica weberiana, pode se inferir que esse “culturalismo racial” (pois projeta uma característica cultural que seria comum a todos os brasileiros) se trataria de um tipo ideal, uma situação de estudo que desconsidera variáveis e noções como a própria dinâmica da dominação entre classe e intraclasses no contexto brasileiro.
A ideia da dominação como exercício
do poder para Weber quebra o conceito de jeitinho brasileiro, por não se tratar
de uma característica cultural comum a todos, mas sim uma forma de imposição de
vontades pessoais sobre outras pessoas ou grupos de pessoas. Por isso que o “jeitinho”
aparece tão ligado a situações de suspensão do que se aplica a maioria para o
benefício pessoal do infrator. Todavia, é necessário ressaltar que essa
situação não é uma característica inerente de todo brasileiro, mas sim de quem
detém as formas de “legitimação” do seu poder e dominação, sendo ele brasileiro
ou não.
Tal como explica Jessé Souza em “A
elite do atraso”, essa legitimação ocorre quando o dominador detém o capital,
não somente em seu sentido econômico, mas também o capital cultural e o social
por exemplo, que justificam a dominação entre as diferentes classes sociais e
mesmo entre as pessoas da mesma classe social. Portanto, é impossível dizer que
existe um “jeitinho” inerente a toda a população brasileira, pois essa afirmação
desconsidera uma larga parcela de brasileiros “dominados” por não possuírem acesso
a nenhuma forma de capital.
Por fim, pode-se dizer que aqueles
que defendem a existência de um jeitinho brasileiro desconsideram a
multiplicidade de realidades que existem na sociedade brasileira, além de ter
uma visão preconceituosa de um povo por enxergar nele exclusivamente uma ótica
das relações de poder e dominação que estão presentes não apenas no Brasil, mas
sim em todas as sociedades humanas.
Fontes:
SOUZA,
Jessé. A elite do atraso. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2019.
WEBER,
Max. [Capítulo VII — § 7. As qualidades formais do direito revolucionariamente
criado. O direito natural e seus tipos, pp. 133-143]. Economia e Sociedade –
Fundamentos da Sociologia Compreensiva. Vol. 2. Brasília: Ed. da UnB:
Imprensa Oficial, 2004.
WEBER,
Max. “Os conceitos de poder e dominação” dominação”. In: Conceitos Básicos de
Sociologia. São Paulo: Centauro, 2002, p. 97-98.
Matheus Guimarães Ferrete - 1º Ano de Direito (Noturno)
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