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quinta-feira, 3 de setembro de 2020

Análise weberiana em um caso contemporâneo

Marx Weber, sociólogo alemão e considerado um dos autores mais influentes no campo de estudo da sociologia, pontuou que o papel da ciência sociológica é analisar as “ações sociais” dos indivíduos dentro do meio cultural a qual estão inseridos. Nesse contexto, a “ação social”, dentro da teoria weberiana, pode ser caracterizada como um comportamento humano, que está sempre atrelado a outros indivíduos, sendo que a escolha de uma determinada ação está ligada a valores culturais da pessoa. Weber tipifica tais ações em quatro; a “ação racional com relação a um valor”, que está pautada no valor, seja ele religioso, político ou ético, a “ação racional com relação a um objetivo”, que é a ação que pretende alcançar um fim específico, “a ação afetiva”, que é aquela a qual é motivada pelos sentimentos e por fim, a “ação tradicional” que é movida pelos costumes enraizados.

Tomando como exemplo o atual caso, ocorrido em agosto de 2020, da menina de 10 anos que foi estuprada pelo tio e engravidou, e fazendo um paralelo com a teoria weberiana, pode-se tentar compreender as ações dos cidadãos brasileiros perante o caso. A decisão judicial do Espírito Santo autorizou o aborto, o que já era o esperado pelo fato do aborto ser legal em casos de estupro pela constituição, entretanto o que se contatou, não foi uma reação empática por parte das pessoas em relação a menina que sofria os abusos, mas sim uma reação midiática de ódio e de repressão, não apenas pela decisão judicial do aborto como também perante a menina, pois dentro dessas reações sociais, muitas opiniões viam a vítima do estupro como uma assassina. Para Weber, a compreensão dos sentidos das ações sociais são a chave da sociologia, portanto, para entender o porquê dessa reação midiática é necessária uma análise afundo dos indivíduos brasileiros. Estima-se, segundo dados o IBGE, que 73,7% da população é católica e 10,4% é evangélica pentecostal/neopentecostal, esses são os dois maiores grupos religiosos brasileiros e abrangem a maior parte dos cidadãos do país. Dentro dessas religiões existem valores como a “sacralidade da vida”, a “prioridade da vida” e dentre outros que olham para a vida como uma propriedade de uma entidade e não dos seres humanos. Tendo em vista os dados, pode-se construir um “tipo ideal” de um religioso que não aceita o aborto pois dentro de seus valores morais, isso é inaceitável. Logo, é possível tipificar a reação social contrária ao aborto como uma “ação racional com relação a um valor” já que está pautada em valores morais de uma determinada crença. No entanto, é perceptível que dentre os inúmeros comentários nas redes sociais, existia um sentimento de ódio, por parte daqueles que enxergavam a menina como uma assassina por ter abortado um feto fruto de um estupro, em vista disso, esses comentários estão ligados a uma “ação social afetiva”, já que existia uma motivação emocional de ódio, qual a crença de seus valores morais e o sentimentalismo se sobrepôs a uma racionalidade, momento esse que os cidadãos deixaram de lado o impacto social de um estupro e passaram apenas a enxergar o que o aborto simbolizava dentro de suas religiões, agindo com uma carga de sentimento muito grande.

Ainda sobre o viés dos indivíduos que rechaçaram o aborto, pode-se constatar uma tentativa de exercício do poder, isso porque para Weber, o  poder é a possibilidade dos indivíduos imporem suas vontades sobre outras pessoas, sendo que essa relação de poder implica em uma dominação, onde o grupo/individuo que exerce o poder, detém o “comando de um conteúdo especifico, obedecido por um determinado grupo de pessoas”. Logo, ao as pessoas tentarem impor sua posição contrária ao aborto para a menina de 10 anos que havia sido vítima de um estupro, demostra uma tentativa de dominação pautada nos valores religiosos individuais dos cidadãos.

Portanto, é evidente que as ações sociais expostas na teoria de Weber estão correlacionadas nos casos da contemporaneidade. No caso da menina vítima de um abuso, pode-se constatar que as ações de grande parte dos brasileiros não visavam o impacto social do estupro, e nem as consequências que isso causou na vida da menina, configurando em uma ação racional com relação a um valor, pautado em condutas religiosas, além de uma ação emocional estimulada pelo ódio, sendo que essas ações levaram a uma tentativa de exercício do poder, não apenas pelos comentários nas redes sociais, como também pelos protestos e as tentativas de invasão que ocorram no hospital onde a menina passaria pelo procedimento do aborto. Cabe a sociedade civil, se questionar, quais são as consequências sociais dessas ações pautadas nos valores e nas emoções, se essas ações realmente conduzem o país ao bem estar coletivo ou se apenas estão suprindo desejos religiosos individuais e tendo uma posição egoísta perante os outros seres humanos.

Referencias: 

http://www.seminariojmc.br/index.php/2018/01/17/3-razoes-para-o-cristao-ser-absolutamente-contrario-ao-aborto/ 

https://g1.globo.com/pe/pernambuco/noticia/2020/08/17/menina-de-10-anos-estuprada-pelo-tio-no-es-tem-gravidez-interrompida.ghtml 

https://censo2010.ibge.gov.br/apps/atlas/pdf/Pag_203_Religi%C3%A3o_Evang_miss%C3%A3o_Evang_pentecostal_Evang_nao%20determinada_Diversidade%20cultural.pdf 

https://g1.globo.com/pe/pernambuco/noticia/2020/08/19/menina-de-10-anos-que-engravidou-apos-estupro-deixa-hospital-em-pernambuco.ghtml


Maria Clara Ramos Okasaki-1ºano Direito-Diurno 

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