O
século XXI está imbuído de contradições que se manifestam nos
âmbitos científico, informacional e racional. O desenvolvimento da
metodologia científica moderna, visando libertar a humanidade de
suas amarras, propiciou – colateralmente – a formatação da
racionalidade, os novos grilhões das civilizações que abarcam a
era industrial hodierna.
Essa
sistematização do próprio pensar, aliado a positivação dos
Estados e da própria economia, gerou, consigo, uma realidade que
orbita em torno do pragmatismo. Nesse ínterim, a população, de
modo geral, é condicionada a supervalorizar questões que se
prontifiquem de modo imediatista, seja na esfera emocional ou
informacional. A partir disso, os indivíduos se inserem numa bolha
interpretativa da realidade, participando de um processo contínuo de
autoafirmação de suas próprias crenças, ideologias e verdades,
sem a reflexão do contraditório. Esse processo provocou a criação
de um fenômeno denominado “Cognição Preguiçosa”, proposto por
Daniel Kahneman, em que os processos mentais negligenciam toda e
qualquer fonte de estudo que necessite do esforço dos processos reflexivos e
críticos.
Isto
posto, a manutenção do pensamento reacionário é iminente e
inevitável, visto que o seio familiar é a célula primordial de
sociabilização do indivíduo, sendo responsável pela propagação
de valores que, aliados a Cognição Preguiçosa, tornam-se
inquestionáveis. Assim, mantém-se uma radicalização perante
movimentos que reivindicam a promoção de medidas sociais,
progressistas, ao mesmo passo que se incita o discurso de ódio,
aflorando o preconceito já existente. Com base nesses fatores,
constata-se que a atual conjuntura política é extremamente propícia
para a ascensão de movimentos fascistas e neofascistas. Embora
divergentes em alguns quesitos – fruto de um diferente contexto
histórico, a sua atuação contra minorias políticas e movimentos
progressistas e a exacerbação da violência, ainda são fatores
presentes no neofascismo.
Destarte,
ressalta-se a contradição da era moderna, em que, mesmo com o
turbilhão informacional presente em todos os campos de estudo,
torna-se extremamente difícil promover a conscientização
populacional em relação às variadas pautas, pois as inovações e
pesquisas que se contrapõem aos conceitos já enraizados
socialmente são refutados – mesmo sem fundamentação, em virtude
da baixa credibilidade atribuída popularmente às fontes
científicas. Ademais, as descobertas tecnológicas frequentemente
mantêm-se restritas a um seleto quadrante da humanidade, seja em
virtude do fator econômico, seja pela escassez de sua disseminação.
A
partir dessa perspectiva, evidencia-se a importância do filme “Ponto
de Mutação” e do tema abordado. O título, por si só, representa
– simbolicamente – a imensurável necessidade da dialética na
convivência humana, que posteriormente se manifesta na figura dos 3
personagens, sendo eles a materialização empírica da Hipótese,
Antítese e Síntese. Nisto, a obra aborda a “crise de percepção”
presente na sociedade, em que a praticidade excessiva promove uma
forma de mecanicismo social, onde a vida se torna descartável,
desumanizada e presa aos moldes da modernidade. A ciência não mais
é produzida sob o intuito de promover a dignidade humana e manter a
salubridade ambiental, passando a atender a interesses de cunho
mercadológico e sendo implementada como utensílio de repressão e
subjugação. Outrossim, a formatação da racionalidade esvaziou a
relevância do ensino dos valores éticos e morais. Por fim, o longa
enfatiza a essencialidade da reformulação do próprio pensamento
crítico humano, com a finalidade de reverter o quadro de
insustentabilidade, desumanidade e pragmatismo instaurado.
Caio
Laprano – Direito Noturno 1º Ano
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